quinta-feira, 3 de novembro de 2011

PERFIL: NAPOLEÃO VALADARES

Por Paccelli José Maracci Zahler

A Revista Cerrado Cultura (RCC) entrevistou o advogado,poeta, romancista, contista, cronista,Napoleão Valadares (NV), um dos pioneiros da literatura brasiliense, autor de mais de uma dezena de livros e com ativa participação na Associação Nacional de Escritores - ANE. Ele nos concedeu a entrevista por correio eletrônico. Nesta oportunidade, queremos expressar o nosso agradecimento pela gentileza de deixar-nos trazer aos nossos leitores um pouco do seu PERFIL.

 
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RCC - Fale-nos da influência do senhor Louro Caçote e do velho Silvério na sua formação literária.

NV – Louro Caçote e o velho Silvério, contadores de histórias do sertão, chegavam às fazendas e, à noite, ficavam rodeados de meninos ansiosos por ouvi-los. Ainda hoje tenho na memória algumas histórias que eles contavam, cheias de intrigas, heróis e vilões. Isso, naturalmente, vem a nos ajudar, quando trabalhamos com ficção. Depois, acabei fazendo do velho Silvério personagem do conto “Caboclo-d’Água”, do livro Campos Gerais.

RCC - O Ginásio São João, Januária, MG, teve um papel fundamental na sua vocação literária. Como foi a sua passagem por lá?

NV – No Ginásio São João tivemos dois professores, Geraldo Sérvulo de Araújo e Evandro Moreira, que muito nos ajudaram, incentivando-nos a ler e nos orientando no caminho da literatura. Tínhamos uma pequena biblioteca e ganhávamos um ponto em qualquer disciplina com a leitura e o relatório de um livro. Esse começo de leitura foi a faísca que acendeu minha vocação literária. Minha passagem pelo Ginásio São João foi uma das melhores coisas que aconteceram em minha juventude.

RCC - Acadêmico de Direito da Universidade de Brasília, o senhor fundou, junto com alguns colegas, o periódico CORREIO DO VALE, que circulou de maio de 1971 a dezembro de 1972, nas cidades de Arinos e Buritis, MG. Era um periódico voltado para a Literatura? Por quais razões deixou de circular?

NV – O Correio do Vale tinha também literatura, mas tinha outras coisas. Visava principalmente a levar à população as informações de que ela necessitava, mas publicava crônicas, poemas, artigos, biografias. Deixou de circular em dezembro de 1972, porque os pequenos jornais se mantêm a duras penas, geralmente com o sacrifício dos idealistas que os dirigem. E chega-se a um ponto em que isso não é mais possível.

RCC - Sua cidade natal, Arinos, MG, fica às margens do rio Urucuia. Tempos depois, radicado em Brasília, DF, o senhor fundou a Associação dos Urucuianos em Brasília, tendo editado o JORNAL DO URUCUIA de 1984 a 1986. O objetivo da Associação foi reunir os conterrâneos ou os escritores das cidades situadas às margens do rio Urucuia? A Associação ainda existe?

NV – O objetivo da Associação dos Urucuianos em Brasília, que não mais existe, era promover encontros periódicos dos seus associados, visando a proporcionar-lhes integração entre si e divulgar assuntos e temas que dizem respeito ao vale do Urucuia, bem como colaborar com os órgãos competentes nos assuntos de peculiar interesse da região.

RCC - Na língua tupi-guarani, “urucuia” significa “rio de águas vermelhas”. O senhor escreveu um romance homônimo, premiado no Concurso Petrobrás de Literatura-1988 e publicado pela Editora Thesaurus, em 1990. Gostaríamos que o senhor tecesse comentários a respeito.

NV – Nasci à beira do Urucuia. Cresci vendo o rio com suas enchentes e, no tempo da seca, com sua cor verde, encantadora para mim. Não sei por que, o Urucuia exala uma simpatia contagiante, que se encontra nos comentários de quantos o conhecem. Guimarães Rosa fala dele em todas as suas obras. Em Grande Sertão: Veredas, entre várias outras frases cheias de carinho, ele diz: “Rio meu de amor é o Urucuia.” Quando tive a ideia de escrever um romance que tinha como cenário aquele região, veio-me à cabeça o título Urucuia. E ficou.

RCC - O senhor foi presidente da Associação Nacional de Escritores – ANE nas gestões 1987-1989; 1993-1995; 2005-2007, fazendo parte, atualmente, do Conselho Administrativo e Fiscal. O senhor poderia fazer um balanço da literatura do DF da década de 1980 até agora?

NV – A literatura do DF tem crescido. Pena que tenham falecido grandes escritores, como Almeida Fischer, Cyro dos Anjos, José Hélder de Souza, Alphonsus de Guimaraens Filho, José Geraldo Pires de Mello Joanyr de Oliveira, Afonso Felix de Sousa, Fernando Mendes Vianna, Esmerino Magalhães Júnior, José Godoy Garcia e outros. O passamento de cada escritor é um pedaço da arte que se vai. Mas os outros vão tocando. E têm surgido escritores novos com muito talento.

RCC - Como anda o mercado editorial em Brasília, DF?

NV – Nada bem. O mercado editorial tem que melhorar, todos sabem disso. Percebe-se que, nos últimos tempos, tem havido grandes mudanças em tudo. E nesse setor, naturalmente, as mudanças também deverão aparecer.

RCC - Os escritores de Brasília têm conquistado espaço para expor e divulgar suas obras ou continuam realizando seu trabalho de forma abnegada na esperança de obterem um reconhecimento no futuro? Qual a sua opinião a respeito?

NV – Espaço se conquista palmo a palmo e, às vezes, milímetro a milímetro. Conquista-se, mas muito pequeno. O trabalho na área da cultura é duro. Trabalho de forma abnegada, sim. Vamos ver o que diz o futuro.

RCC - O senhor tem se dedicado à atualização do Dicionário de Escritores de Brasília, iniciado em 1994. Como tem sido esse trabalho, os critérios usados para a pesquisa dos verbetes e a receptividade da comunidade acadêmica e do público leitor?

NV – Como você diz, a primeira edição do Dicionário de Escritores de Brasília se seu em 1994. A segunda, em 2003. Estou preparando a terceira. O critério usado para inclusão dos autores é o de ser este publicado em livro. A receptividade tem sido excelente. Via de regra, os escritores sentem-se satisfeitos ao ter seus nomes numa obra de consulta como esta.

RCC - Como tem sido possível conciliar as atividades de poeta, romancista, contista, cronista, com o trabalho no judiciário?

NV – Parece-me que não devemos esperar que fiquemos desocupados para podermos trabalhar com literatura. Quem esperar não vai escrever nunca. Os carreiros do sertão costumam dizer que carro pesado é que canta. Então, o ideal é tocar tudo junto. Comigo foi assim. Tem dado certo.

RCC - Que conselhos o senhor daria a um jovem escritor?

NV – O conselho é leitura. Ler bons autores é o melhor início de caminho para quem pretende enveredar para a literatura.

Um comentário:

  1. Muito valiosa a entrevista com o escritor Napoleão Valadares. O escritor veio trazer importante subsídio à literatura. Conheço a trajetória do escritor Napoleão Valadares desde os saudosos tempos do Ginásio São João de Januária, na margem esquerda do Velho Chico, em Minas Gerais. Naquele tempo, o jovem estudante já revelava

    vocação e sensibilidade pelas letras, sendo na atualidade uma das maiores revelações em todos os gêneros da literatura. Destaca-se como um estudioso incansável e profundo conhecedor da nossa língua. Grande abraço a todos.

    Onofre Ferreira do Prado, de Belo Horizonte

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