terça-feira, 3 de dezembro de 2013

PAIXÃO

Por Pedro Du Bois (Itapema, SC)

a paixão devora olhos e corações
de épocas e sentidos com que
passamos horas e dias frios
para chegarmos a esse tempo
e encontrarmos o vazio
de não havermos encontrado
a pronúncia exata das palavras
na maneira certa de dizer
estamos aqui e a paixão
permanece em nossos olhos
embaçados em lágrimas
de reconhecimento
como naquelas horas
e como serão em futuros
tempos de mãos entrelaçadas

chegamos sem esquecer e sobrecarregamos
a memória e as lembranças com as imagens
nas músicas em altos sons
       e perguntas presas
    em gargantas curtas
   de desejos e secura

a nossa história recortada em quadros
passados lentamente entre as lentes
dos óculos que usamos e nos servimos
para enxergamos o que não vimos cedo

estávamos cegos em blindagens jovens
e tínhamos a certeza de que as incertezas
seriam dos caminhos as trilhas e as armadilhas
que não nos pegariam na passagem

essa paixão extravasa a hora
fôssemos pessoas espiando
o lado de fora de cada um
meros espantalhos em hastes
de empregos e desesperanças
de que tudo termine logo após
o instante em que os corpos
se desencontrem

somos mais que paixões ardentes
dos dentes cravados das serpentes

ávidos pelo fim da história.

CHÁ

Por Pedro Du Bois (Itapema, SC)

Bebo em goles apequenados.
Na boca o calor
                  da água perfumada.

                  O gole prolonga
                  a indefinição do instante

         no perfume retirado
         do gosto amargo

         em gesto de regresso.

BRINCANDO AO SOL

Por Humberto Pinho da Silva (Vila Nova de Gaia, Portugal)

Domingo. Tarde de Verão. Anos sessenta.

Na ampla varanda, virada para a cidadela, a menina de pele morena, brinca.
Descalça, perna descoberta, num leve cicio, tagarela baixinho com o boneco Bonifácio
Ao redor, espalhado no chão de marmorite, há fragmentos de antigos brinquedos, roupinhas de variegadas cores, e folhas de papel de jornal, que lhe servem de tapete.
A luz quente do sol da tarde, patina-lhe a pele bronzeada, cor de centeio, e arranca brilhos e rebrilhos doirados, dos delicados e macios cabelos castanhos.
Seus olhos escuros, lampejam de contentamento. Balançam, dançam, sem cessar: ora se cravam no desengonçado boneco; ora se fixam, enternecidos e ridentes, nos meus.
Paira no tépido ar, doce perfume rescendente, que vem da cozinha. É a mana, que tem a massa do bolo da merenda, no forno.
Ao longe, muito ao longe, andorinhas acrobáticas riscam arabescos no céu azul - ferrete; e passarinho, todo cinza, de peito manchado de amarelo, que descansa na arvorezinha do quintal, canta, a espaços, chilreios tão harmoniosos, que dir-se-ia que são para alegrar este quadro de sublime beleza.
Recostado no largo varandim de ferro, olho inebriado, em fascínio e amor, a menina de pele morena.
Seus olhos meigos riem-se e saltam de alegria, e dos delicados lábios vermelhos, vermelhos como cerejas, soltam-se inteligíveis palavras, tão suaves, num murmúrio tão doce, que mal quebram o silêncio desta serena tarde de domingo.
Se tivesse poder, poder mágico, a visão encantadora, permaneceria para sempre, parada no tempo.
Mas a amorosa aguarela, de tons quentes, cheia de sol e poesia, não passa, infelizmente, de saudosa recordação

***
Debruçado no parapeito da janela de meu quarto, sentindo a luz reconfortante do sol de Inverno, bafejar - me o rosto, recordo o passado, que se esfuma, deixando na memória, pálidas lembranças de felizes momentos.
Esse quadro, ocorrido num passado longínquo, vive dentro de mim: vejo, nitidamente vejo, de alma enlevada: a menina, na flor da infância, na idade da inocência, brincando descuidadamente, na sacada de sua casa.
Esta luz clara que acaricia-me a face; este sol refulgente e acolhedor, é o mesmo que iluminou o quadro amoroso, o momento sublime, que vivi: de menina, na flor da idade, brincando ao sol, na sacada de sua casa.
No crepúsculo da vida, na quietude do quarto, em época natalícia, recordo, a menina que brincava ao sol, numa tarde de domingo.
Menina que esperava-me no portão de sua casa, e corria, enlaçando os frágeis bracitos, ao redor de meu pescoço.
Onde estarão, agora, os lábios rubros, que se franziam em botão, para cobrirem-me de carinhosos beijos insalivados?
E as mãos macias, cor de areia, minúsculas e aveludadas, que se colavam às minhas, para correrem casas de sua casa?
E a menina, que brincava, inundada de sol, numa tarde de domingo, na varanda de sua casa?
Decerto á casada. Cercada de filhos. Uma santa e sisuda mamã.
A tez, já não deve ser macia, como pétalas de rosas, nem, os lábios rubros como cerejas, nem, os cabelos se doiram ao receberem luminoso raio de sol.
Mas no carpo disforme - pelos anos e maternidade, - vive, dormindo e sonhando, a menina de outrora, que brincava na sacada encharcada de sol.
Ao envelhecer, rodeada de netinhos travessos, há-de, por certo, recordar com saudade, esse e outras cenas da infância feliz.
Compreenderá, então – se ler este recordo, – meu doce recordar.

Aguça, o rodar dos anos, as lembranças, e deixam-nos sensíveis ao tempo que já não é…ao passado que passou.

O BARBANTE QUE NOS UNE A DEUS

Por Humberto Pinho da Silva (Vila Nova de Gaia, Portugal)

Em pleno Inverno, em serena manhã, de cerrado nevoeiro, guri, de tez bronzeada, boca larga, olhos negros como azeviche, caminhava, descalço ao longo do extenso areal. Preso à mão direita havia fino e sólido barbante de nylon, quase transparente.
Corria, vindo do Sul, leve e fresca brisa, tão suave, tão delicada, que mal lhe acariciava o jovem rosto moreno.
A espaços, o garotinho, puxava o fio, sacudindo, energicamente, a mão, imprimindo rápidos e fortes puxões, ao barbante, que vibrava, distendendo-se.
Pacatamente, sentado em banquinho de madeira, coberto a esmalte azul celeste, homem, esquelético, seco, entrado em anos, passeava a vista: ora para a cano de pesca, ora para o gurizinho.
Indiferente ao incisivo olhar do pescador, o petiz soltava sonoras risadas, que sumiam-se na densa serração, diluindo-se no sussurrante som embalador do oceano.
Atónito, surpreso com o que observava, interroga-o, intrigado:
-O que está você a fazer?! Puxando o que não se vê?!
O rapazinho, volta-se para o pescador. Fica, por momentos, pensativo. Depois, entortando ligeiramente a cabeça, diz:
- É certo que não se vê, mas eu sei que escondido no nevoeiro, está a estrela, que responde, com leve puxão, ao meu comando. - Respondeu espevitadamente a criança.
Esta curiosa história, contada por Billy Grahm, ilustra, perfeitamente a relação que o cristão deve ter para com Deus.
Como a pipa (papagaio) do caboclo, também não descortinamos o Senhor…mas sentimo-Lo, do mesmo jeito, como o gury sentia a estrela.
Ao longo das vicissitudes da vida, quem for crente - os agnósticos só têm acasos, - sente-se, muitas vezes, a Mão protetora de Deus.
Quantos problemas insolúveis, não se resolveram, a contento, por intervenção do Poderoso?
Deus conhece as nossas necessidades, antes de Lhe pedirem auxilio.
Ele sempre entrega o fio de Ariadna, para conseguirmos sair do tenebroso labirinto em que insensatamente nos metem.
O “fio” que nos une a Deus, chama-se: oração.

Como o rapazinho, que se divertia brincando com o papagaio, numa manhã de intenso nevoeiro, também nós, sabemos, mesmo sem O ver, que lá longe, em parte incerta, no Céu sem fim, está Aquele que tudo pode e tudo sabe, pronto a dar-nos o “fio” que une a nossa consciência a Ele.

AMIGO DE VERDADE

Por Paccelli José Maracci Zahler

Está sempre do teu lado
No mais difíceis momentos
Divide o fardo pesado
Alivia teus sofrimentos
Alegrias também divide
Ao longo da caminhada
Quando parte, deixa saudade
Ao rumar por outra estrada

DESENCONTRO

Por Paccelli José Maracci Zahler

Tua presença aquece minha alma
Como os primeiros raios de sol,
Após longa noite de inverno.

Meu coração bate diferente
E volta a ser adolescente
Como se o tempo pudesse voltar.

Em minha mente, fervilham versos
Que descrevem meus sentimentos,
Que só podem ser compartilhados
Quando nossos caminhos se encontram.

Nossos caminhos são outros,
O suficiente pra deixar saudade
Num longo e terno abraço.

Porém, são breves encontros
E uma lágrima discreta
Guardada com propriedade.

O BOM CORRUPTO

Por Paccelli José Maracci Zahler

O bom corrupto
Num gesto abrupto
Apropria-se da verba alheia,
Do erário público,
Da pensão das viúvas
E dos aposentados,
Mantendo-se elegante,
Um verdadeiro dândi,
Com o mesmo ar impoluto
Do homem probo e respeitado.

DÚVIDAS

Por Paccelli José Maracci Zahler

Espinhos
Que abalam o espírito,
Desestruturam a alma,
Balançam o coração
Em hora imprópria.

Terrível situação
No momento da decisão!