Vários escritores, vinham
constantemente dizendo, a meu pai, que descesse à Capital. Argumentavam que só
quem colaborasse na imprensa de Lisboa, é que era verdadeiramente conhecido e
apreciado.
Embora não concordando, meu pai,
resolveu tentar criar secção, com seu nome, em diário lisboeta.
A tarefa não era fácil, para
quem não estava familiarizado com políticos e não se encontrava filiado em
partidos e movimentos cívicos.
Lembrou-se então de ir pedir auxilio
a velho amigo de infância, político respeitado, e de grande prestígio, com quem
sempre manteve laços fraternos de amizade.
E uma bela tarde de domingo
bateu ao ferrolho de sua residência.
Este atendeu-o de braços abertos e em grande
festa. Após os habituais abraços, meu pai, entrou ao que vinha, ou seja:
apresentá-lo ou recomendá-lo a diretor ou administrador de matutino lisboeta,
para propor-lhe a criação de coluna sob sua responsabilidade.
Para isso levava currículo e
crónicas, que semanalmente publicava num matutino portuense.
Após escutar atentamente tudo
que meu pai lhe contava, e de passar os olhos pelos artigos, que já conhecia,
até era leitor assíduo, segundo disse, declarou desanimadamente:
- Sabes, Mário, eu até conheço
quem pode interessar a colaboração e provavelmente remuneraria generosamente,
mas tu escreves no semanário X, e és conhecido pelas tuas ideias religiosas e
moralistas, e isso estraga tudo. Deixa o semanário, e escreve artigos a
insinuar deslizes do governo. Não é preciso desancar! E eu levo-os ao
conhecimento dele. Até posso, se escreveres com porquinho de pimenta, e grão de
sal, dar-te carta de recomendação a diretor de periódico de Barcelona. Como
sabes, a imprensa espanhola paga mais que os míseros cem ou cento e cinquenta…
Nessa noite, na mesa de jantar,
com a família reunida, meu pai, após relatar o encontro com o velho companheiro
de folguedo, rematou com tristeza e desalento:
- “Se tenho que abdicar dos
meus princípios e valores, que professo, prefiro continuar a ser jornalista da
província, e andar de cabeça erguida.
Meu pai ainda era daquele velho
tempos em que havia homens de vergonha na cara.
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