sábado, 1 de julho de 2023

ENTREVISTA: PRÍNCIPE DOM ALEXANDRE DA SILVA CAMÊLO RURIKOVICH CARVALHO

 


Por Paccelli José Maracci Zahler (Brasília, DF)

    É com imensa honra que entrevistamos, neste mês de Julho de 2023, Sua Alteza Real e Imperial Príncipe Dom Alexandre da Silva Camêlo Rurikovich Carvalho, Chefe da Augustíssima e Soberana Casa Real e Imperial dos Godos de Oriente, e Presidente da Federação Brasileira dos Acadêmicos das Ciências, Letras e Artes - FEBACLA.
    A entrevista foi concedida por meio eletrônico e, em nome da Revista Cerrado Cultural, agradecemos a boa vontade em nos atender.

ENTREVISTA COM PRÍNCIPE DOM ALEXANDRE DA SILVA CAMÊLO RURIKOVICH CARVALHO   Chefe da Augustíssima e Soberana Casa Real e Imperial dos Godos de Oriente

 

O que é a Casa Real e Imperial dos Godos de Oriente?

A Augustíssima e Soberana Casa Real e Imperial dos Godos de Oriente, denominada Casa da Gothia, é uma dinastia histórica memorial em exílio que visa EXCLUSIVAMENTE à preservação memorial e as tradições dos povos godos, visigodos e ostrogodos, destina-se a resgatar e preservar os retalhos históricos perdidos no tempo. GOTHIA é um nome dado a vários lugares onde os godos viveram durante suas migrações, incorporado hoje a República da Suécia.

2.Como foi o processo de restauração da Augustíssima e Soberana Casa Real e Imperial dos Godos de Oriente?

A Augustíssima e Soberana Casa Real e Imperial dos Godos de Oriente obteve a restauração de seus registros históricos em 27 de Julho de 2012, através dos estudos históricos e genealógicos emitidos pelo Dr. Otávio Duarte Santos, Licenciado em História pela Fundação de Ensino Superior de Olinda FUNESO/PE, Historiador com ênfase em história antiga e medieval, sacerdote da Igreja Católica Apóstolica Romana, sendo restaurada publicamente conforme a tradição das monarquias em 29 de Julho de 2014, pelo Clero da Santa Igreja Católica Apostólica da Redenção, sendo reconhecida em 28 de Setembro de 2014 pelo Patriarcado Ecumênico da Santa Ortodoxia Cristã Latina, sendo amplamente reconhecida por renomados historiadores e genealogistas, Bulas Patriarcais e Apostólicas de fé inviolável e confirmada pelos Direitos Internacionais da Convenção de New York da qual 142 Nações são signatárias. A Restauração Histórica do Reino da Gothia, visa recuperar e perpetuar para a história mundial a existência de um estado perdido nas brumas do tempo.

3. Na atual fase da história, quem é o chefe oficial é jurídico da Augustíssima e Soberana Casa Real e Imperial dos Godos de Oriente?

A Augustíssima e Soberana Casa Real e Imperial dos Godos de Oriente tem como chefe oficial e jurídico Sua Alteza Real e Imperial Príncipe Dom Alexandre da Silva Camêlo Rurikovich Carvalho, com o nome dinástico de Dominus Herodotus Alexandros Iº de Leão, tendo em sua Linhagem Varonil a ilustre Família CAMÊLO, do Sangue Real e Imperial dos Reis de Leão, dos Reis Godos e dos Reis de Dardânia. 

4.Qual é a importância dos títulos de nobreza outorgados pela Augustíssima e Soberana Casa Real e Imperial dos Godos de Oriente?

Em um país republicano, os títulos de nobreza não acrescentam nenhum privilégio legal. É uma distinção de tratamentos honoríficos e simbólicos, são bens imateriais e históricos, que visam galardoar pessoas que se destacarem em seu meio social, exemplificando méritos e virtudes incomuns.

De acordo com a legislação recente, Títulos Estrangeiros podem ser considerados como “Herança Imaterial Estrangeira” em harmonia com a Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 e ter seu cunho meramente Honorífico reconhecido culturalmente e como Patrimônio tendo a sua sucessão “Júris Sanguinis” regulada e protegida pela Lei Internacional e protegida também de acordo com o Código Civil Brasileiro de 2002.

5. Quais são as principais atribuições da Augustíssima e Soberana Casa Real e Imperial dos Godos de Oriente perante a sociedade?

A Augustíssima e Soberana Casa Real e Imperial dos Godos de Oriente é uma instituição ÚNICA e EXCLUSIVAMENTE destinada às causas da filantropia, preservação histórica, cultural e de memória genealógica, e de família.

6. Quais são os desafios que a Augustíssima e Soberana Casa Real e Imperial dos Godos de Oriente enfrenta atualmente?

Mantém viva a memória e as tradições dos povos godos, visigodos e ostrogodos, bem como os estudos das histórias antigas e medievais.

7. Quais as qualificações necessárias para ser outorgado e investido com um título de nobreza da Augustíssima e Soberana Casa Real e Imperial dos Godos de Oriente?

Pessoas que professem os princípios ideológicos e morais observados pela Casa Real e Imperial que possuam qualificações evidentes e necessárias de cultura, honorabilidade e serviços. NÃO estar respondendo a nenhum processo criminal; ter bom testemunho; e, boa convivência familiar e social.

8.Qual é a posição da Augustíssima e Soberana Casa Real e Imperial dos Godos de Oriente sobre a política partidária?

A Augustíssima e Soberana Casa Real e Imperial dos Godos de Oriente não visa ou vislumbra ter participações em governos, não possui quaisquer vínculos com partidos políticos, seja qual for a sua linha Ideológica, filosófica, partidária ou de Militância. É uma instituição apolítica, neutra e afastada de todas e quaisquer questões relacionadas às disputas partidárias ou qualquer outro movimento Político-Partidário-Ideológico de qualquer natureza, INCLUSIVE os movimentos Pró-Monarquistas ou Contra Monarquistas.

9.Qual é a forma utilizada pela Augustíssima e Soberana Casa Real e Imperial dos Godos de Oriente para custear suas atividades culturais e nobiliárquicas?

A Augustíssima e Soberana Casa Real e Imperial dos Godos de Oriente, pelos seus constituintes históricos, humanos e ideológicos, sendo uma sociedade de natureza Histórica, Dinástica, Cultural e Cívica, voltada para o aperfeiçoamento e defesa dos valores permanentes das civilizações, custeia suas atividades mediante doações e rendas de origens diversas, lícitas e legais, bem como chancelarias advindas de adesões de honrarias, comendas, medalhas diplomas de honra, troféus etc.

10.Como a Augustíssima e Soberana Casa Real e Imperial dos Godos de Oriente se relaciona com outras casas reais europeias?

Uma relação amistosa, considerando que o reconhecimento da dignidade inerente a nobreza universal e de seus direitos iguais e inalienáveis é o fundamento da liberdade, da justiça e da paz universal.

11.Qual é a posição da Augustíssima e Soberana Casa Real e Imperial dos Godos de Oriente em relação à religião?

A Augustíssima e Soberana Casa Real e Imperial dos Godos de Oriente é uma instituição laica. Isso significa que não há uma religião oficial e que manter-se imparcial no tocante às religiões.

12.Qual é a posição da Augustíssima e Soberana Casa Real e Imperial dos Godos de Oriente em relação à política internacional?

O Governo memorial e histórico da Augustíssima e Soberana Casa Real e Imperial dos Godos de Oriente, respeita as leis internacionais, as nações, uma pátria livre e soberana, o governo estabelecido e as suas instituições.

13.Como a Augustíssima e Soberana Casa Real e Imperial dos Godos de Oriente se envolve na promoção da educação e da pesquisa?

Através de parcerias com institutos culturais, centro de pesquisas, federações, academias, bibliotecas, museus em especial com a Federação Brasileira dos Acadêmicos das Ciências, Letras e Artes – FEBACLA e Centro Sarmathiano de Altos Estudos Filosóficos e Históricos.

14.Qual é a mensagem que a Augustíssima e Soberana Casa Real e Imperial dos Godos de Oriente gostaria de transmitir ao mundo?

Uma mensagem de paz, fé e esperança. Os seres humanos precisam se ajudar, por isso é tão importante que todos consigam olhar seus semelhantes com carinho, afeto, respeito e alteridade. Que todos os seres humanos passem a se respeitar cada vez mais, cada um de nós precisa começar a incluir na rotina atitudes que levem esse respeito. Pessoas boas fazem um mundo bom, com caridade, paz e compaixão. Pessoas ruins exaltam a inveja, o poder de destruição e vinganças. Façam o bem por ser o certo, não para receber algo.

15.Quais são os planos futuros da Augustíssima e Soberana Casa Real e Imperial dos Godos de Oriente?

Continuam sua missão de incentivo e a reverência aos valores morais, e à vivência da fraternidade universal e da propagação da Paz; A cooperação com entidades culturais e comunidades afins, no plano nacional e internacional, promover estudos históricos e a valorização da memória dos nossos antepassados.  

 


FOI LÁ NA VENDA DO SEU LIDIRICO

Por Leandro Bertoldo Silva (Padre Paraíso, MG)


“Foi lá na venda do Seu Lidirico…
tem de tudo e cada coisa que tem eu explico…”

 

Foi lá na Venda do Seu Lidirico que eu conheci em 2018 uma das lendas, agora não viva pelos lados de cá, mas pelos lados de lá, da nossa história: Lidirico José de Almeida, o Seu Lidirico. Atleticano, nascido em Novo Cruzeiro (hã?!), no ano de 1927, chegou na cidade de Araçuaí, no Norte de Minas Gerais, em meados da década de 40 e, como ele mesmo me disse, se voltou a sua cidade de cinco a seis vezes ao longo de todos esses anos foi muito. Desde então, ele mantinha um dos pontos comerciais mais tradicionais do lugar: a Venda do Seu Lidirico, “que tem de tudo e cada coisa que tem eu explico”… E como explicava…

Sentado em uma cadeira simples de bar ao lado da neta atrás do balcão, Seu Lidirico chegou a levantar quando nos viu – eu, minha esposa, minha filha, minha sogra e meu sogro Gelson Pinheiro, outra lenda viva da nossa história que merece capítulo especial.

Tínhamos ido de Padre Paraíso a Araçuaí para conhecermos dois lugares muito comentados: uma “flor e cultura”, que não floresce apenas flores e transpira cultura, como tudo naquela cidade, e… a Venda do Seu Lidirico.

A floricultura era o primeiro destino. Por isso, Seu Lidirico sentou-se pacientemente como se soubesse que o melhor sempre fica por último, afinal o apressado come cru, como diz o bom mineiro. Acenei para ele como quem falasse “estou indo aí” e podia ver as histórias e causos se ajeitando em sua cabeça para serem contados, como se já não tivessem sido centenas de vezes…

A conversa de mineiro de que um lugar fica bem pertinho um do outro, “bem ali”, esticando o beiço, nesse caso era verdade. Era só atravessar a rua. Quem vai em um tem que ir no outro. E Seu Lidirico estava lá nos esperando certo da nossa visita.

Nunca havia conhecido uma celebridade de verdade, porque as falsas se acham; as verdadeiras acham as pessoas, no carinho das mãos que recebem, no afeto do aperto que sentimos na verdade do coração como uma ponte que liga pessoas. Foi assim, nesse bem-querer, que fomos recebidos por Seu Lidirico e sua esposa, Dona Iaiá, chamada por sua neta a pedido dele.

Não sabíamos para quem olhar. Os casos se misturavam e se completavam sempre com precisão de datas e uma memória invejável de quem a própria história pedia licença. O início da venda, as primeiras casas da rua, os únicos dez carros da cidade, se muito, quando chegaram, a data do casamento (1948), o número de filhos – quinze no total – e os mais de 30 netos somando, ao todo, 98 pessoas vivas, excetuando uma nora que morreu intoxicada na fazenda – “só morreu essa nora nesses anos todos”, explicava Seu Lidirico, eram algumas das muitas histórias que se sucediam.

Esses e outros causos, até a partida do Atlético contra o São Paulo na noite anterior vencida pelo time mineiro com gol contra, eram contados, comentados e explicados enquanto apresentava as famosas cachaças produzidas por um dos filhos na região que, claro, provamos, eu e meu sogro, e levamos dois litros, enquanto Dona Iaiá dividia a conversa entre o engarrafar outros dois litros de cloro para a venda e as fotos tiradas sempre atrás do balcão, como se aquela amizade nascente já fosse antiga.

Fico feliz em encontrar pessoas assim em que a simplicidade é verdadeira e que a história também se faz espontânea na hora, sabendo que está sendo escrita e conhecida não apenas nas páginas dos livros, mas ali, ao vivo, porque se tem um lugar que tem história para contar é mesmo lá na Venda do Seu Lidirico.

Para que possam conhecer mais do que tem na Venda do Seu Lidirico, passa lá, é bem ali… Pertin, pertin, um tirin de bala de bodoque, no Norte de Minas Gerais, em Araçuaí, no Vale do Jequitinhonha. Mas se não der para ir, se avexe não, como dizem por lá, ouça abaixo a música, pois até música feita por Miltinho Edilberto e Xangai, apresentada no programa Sr. Brasil, do Rolando Boldrim (outra lenda), Seu Lidirico tem, afinal, é a venda do Seu Lidirico, “que tem de tudo e cada coisa que tem eu explico…”. E ele também! E como explicava…

Existem histórias que é preciso contar e recontar. Essa já esteve por aqui, logo quando eu conheci o Seu Lidirico em 2018. Mas republico em homenagem a essa lenda que nos deixou em 17 de junho de 2023 e que eu tive o prazer de conhecer e prosear.

Vai com Deus, Seu Lidirico!


(Publicado na página https://arvoredasletras.com.br/2023/06/18/foi-la-na-venda-do-seu-lidirico-2/) 

LIDIRICO - Miltinho Edilberto

"QUE GENIAL!...QUE TALENTO!"

Por Humberto Pinho da Silva (Porto, Portugal)

  

A velha e revelha história do: " Rei Vai Nu", está sempre atual. Foi recontada genialmente por Ramalho, e por outros conhecidos escritores:

Um dia apareceu ao Rei, não sei se era do Oriente ou Ocidente, alfaiate espertalhão, que tinha um tecido precioso. Tão especial, que só os inteligentes podiam ver.

O Rei e os cortesãos não queriam passar por ineptos, e não se cansavam, copiosamente, louvar a fazenda.

Sua Majestade mandou-lhe, então, confecionar vestidura, para deslumbrar a plebe.

Mas certa vez, quando o monarca andava a passear, um rapazinho inocente, vendo o rei em trajos menores, clamou: "O Rei vai Nu!..."

Por encanto, como S. Paulo, em Damasco, caíram as escamas dos olhos, que não deixavam o rei ver a verdade, por estupidez ou vaidade.

Envergonhado, recolheu-se ao palácio e vestiu-se dignamente.

Francisco Rodrigues Lobo, na " Corte na Aldeia", conta caso semelhante:

Foi contactado El-rei D. João III por importante mercador, que lhe disse – que na sua loja tinha tecido precioso, e que lho daria de graça, se lhe desse a honra de o aceitar.

El-rei recebeu o presente e mandou fazer vestimenta. Logo que apareceu em publico, todos correram ao estabelecimento do mercador, em busca de igual fazenda.

O referido pano era um mono, e não havia quem o comprasse.

Quantas vezes não se vê senhores carregados de condecorações ou de elevado grau académico, pasmados diante mamarracho, com a boca e. "Oh!" – " Que maravilha!...Que talento!...Que genial!..."

No íntimo todos sabem que nada vale, mas não têm a coragem de o afirmar, em publico, para não passarem por néscios, perante os "entendidos".

Assim acontece na Literatura, e em tudo. Ninguém quer ser o garotinho que bradou: " O Rei Vai Nu!..."

E não o diz, porque a coletividade pensaria, com soberba: "Como é estúpido!...Ignorante!...Néscio!..."

CALEIDOSCÓPIO

 Por Dias Campos (São Paulo, SP)

                                                                                                                                             

            Outro dia, quando tomava um cappuccino com um primo, o desastrado deixou cair a trufa que acompanhava o cafezinho. E, como é notório, se for respeitada a regra dos três segundos – uns admitem até cinco –, pode-se catar do chão a iguaria e consumi-la sem receio de contaminação. Nestes casos, é comum justificarem esse comportamento com a famosa frase “O que não mata engorda”.

É claro que ele não deixou de unir este provérbio àquela norma... E se deliciou com o chocolate.

Se ele contraiu alguma infecção, confesso que não soube. No entanto, sua atitude me fez lembrar de Machado de Assis: “O que não mata engorda, dizem os velhos; mas supondo mesmo que emagreça... Opportet magricellas esse, com perdão de quem me ouve.” (Balas de estalo & crítica).

Usei dessa introdução, amigo leitor, para adiantar um dos meus hobbies preferidos – encontrar na obra daquele Imortal muitos dos ditados que ainda hoje usamos.

Com efeito, devemos às crônicas (sobretudo), aos contos e aos romances do Bruxo do Cosme Velho, além da originalidade, da criatividade e do invejável cunho português, o mérito de perpetuarem inúmeros ditos populares!

E como sei que essa afirmação aguçou a sua curiosidade, repartirei com você mais algumas das minhas descobertas, o que, com certeza, só aumentará o apreço que temos pelo maior escritor brasileiro.

Para começar, trago duas pérolas contidas em A semana II.

A primeira nasceu nas terras do Tio Sam, cruzou o equador, e veio criar raízes entre os nossos capitalistas: “Creio que é por economia de tempo, e tempo é dinheiro, dizem os americanos.”

A segunda foi inspiração de um bardo. E graças à sua genialidade, ela transpôs os contornos da ribalta e ganhou o mundo inteiro: “Portanto, não admira que a dinamite continue encoberta. Há mais cousas entre o céu e a terra do que sonha a nossa vã filosofia. É velho este pensamento de Hamlet; mas nem por velho perde.”

Ato contínuo, faço esta pergunta: Se alguém desejasse passar o réveillon em Paris, mas só tivesse dinheiro para descer à Baixada, qual seria a decisão mais acertada? Pois vem daquele literato a solução: “Terêncio ou Corneille, tudo vem dar neste velho adágio, que diz que quem não tem cão, caça com gato.” (Balas de estalo & crítica).

De outra parte, se um livreiro tivesse a felicidade de encontrar um exemplar muito raro, que todos julgavam perdido, e quisesse enfatizar para um rico colecionador que não se tinha enganado, talvez usasse mão desta conhecida fórmula: “Ressurgiu. Eu o vi (não o li), vi-o com estes olhos que a terra há de comer;...” (História de quinze dias).

            E quem não se lembra da entrevista ao primeiro emprego? É claro que a aparência conta muito. Então, imagina um rapaz muito feio, mas que possui um coração nobre, caminhando, pé ante pé, em direção à sala de reuniões. Já pensou se o entrevistador não fosse pessoa honesta, equilibrada, desprovida de preconceitos? Bem, pressupondo seja, o candidato poderia ficar tranquilo, pois, como escreveu o mestre: “...; é ainda mais doce que sua mãe, posto que seja feio de cara; mas quem vê cara, não vê corações.” (A semana I);

            Mudando para o submundo, pensa em dois criminosos que, depois de meses de planejamento, conseguem furtar um quadro valiosíssimo. Ocorre que um deles, o mais cobiçoso, imaginou que se fugisse com o artefato, não precisaria dividir o dinheiro da venda com o seu comparsa, e, por consequência, gozaria sozinho do proveito do crime. É certo que se essa rasteira se tornasse pública, este parágrafo cairia como uma luva: “Ezequiel notou que este adágio popular – ladrão que furta a ladrão tem cem anos de perdão, – estava incrustado na consciência do Neves, e parecia até inventado por ele.” (Escritos avulsos I).

Por fim, quem já não se sentiu a pior das criaturas por passar o Dia dos Namorados sem a sua alma gêmea? Pois o que menos gostaríamos de ouvir nesta data seria a nossa avozinha proferindo esta consolação: “Não há bota velha que não encontre um pé cambaio.” (Crítica & variedades).

Eu poderia transcrever uma enormidade de máximas que venho sublinhando nos textos do meu querido e eterno Professor... Afinal, os exemplos que citei representam uma ínfima fração das riquezas espalhadas pelo seu universo literário.

E como é vasto este tesouro!... Uns apreciam os colares da crítica social; outros, os anéis da ironia; outros, ainda, os brincos do humor.

O meu garimpar é, portanto, só mais uma das múltiplas e prazerosas formas por que podemos contemplar as joias machadianas.

Mas se bem sei que o meu passatempo é empolgante, e que, se continuasse a exibir os meus achados isto muito o agradaria, sei também, leitor amigo, que o nosso bate-papo ultrapassaria bastante os limites impostos para esta crônica.

Sendo assim, peço licença para adiar a revelação de outras tantas preciosidades, mas prometo retomá-la tão logo me seja possível.

Até lá, fiquemos com este gostinho de quero mais, que é o que permanece depois de lermos o nosso sempre Machado.

CASCA GROSSA E A AVENTURA DA VIDA

Valéria Gurgel (Nova Lima, MG)


Era uma vez uma semente conhecida por CASCA GROSSA.

Não pense que ela era mal educada. Ela só tinha uma grande resistência às mudanças.  Não aceitava fácil seu processo natural de germinação das espécies.

E não sendo maleável assistia em seu canto todas as demais sementes eclodirem na terra;

Crescer, florescer, frutificar, transcender.

Casca grossa foi advertida várias vezes por um antigo agricultor de uma tribo africana.

- Você precisa romper a sua CASCA GROSSA para seguir a senda evolutiva e lançar-se na aventura da vida! - sempre a aconselhava o homem sábio da terra.

- Não posso, tenho medo de sofrer. Se me transformo em árvore frutífera receberei inúmeras pedradas.

- Mas seguirá dando frutos, alimentando o mundo! Foi para isso que você veio, para servir!

- Se crescer e me tornar uma árvore frondosa, corro o risco de ser invejada, desejada, cortada e encerrar minha excêntrica existência como um mero móvel, qualquer objeto de decoração dentro da casa de algum mortal, ou queimada até tornar-me um bloco de carvão inútil.

- Então, é por egoísmo de servir à humanidade que você prefere ser essa semente CASCA GROSSA para sempre? E não cumprir a sua missão na qual lhe foi destinada?

- Viver é perigoso demais! Não vou me aventurar! Seguirei quieta aqui, segura dentro desse baú.

Por muito tempo aquela semente rebelde seguiu ali, parecia morta. Uma morta viva.

Um dia um garoto viu o baú abandonado, o lavou e o levou consigo.  A semente foi lançada à terra. Resistiu por dez anos até que sua casca dura enfim se rompeu.

Ela se transformou em um magnífico Baobá. Considerada na África a árvore milenar que vive mais de dois mil anos. Seu tronco chega a medir mais de dez metros de diâmetro. Suas folhas, flores, frutos e sementes são comestíveis e de valor medicinal.

E foi assim que a semente CASCA Grossa se aventurou a viver. E entendeu a grandeza de ceder ao Magnífico Processo Natural do Ciclo da Vida. Ficou assim conhecida como o “Pai das Sementes”!

A SABEDORIA DO DESAPEGO

Valéria Gurgel (Nova Lima, MG)


Certa vez um sábio caminhava em silêncio por uma praia deserta junto a um de seus jovens discípulos, quando ele lhe perguntou:

- Mestre ensina-me a arte do desapego? Em minha humilde opinião é a mais preciosa de todas as artes!

- Você já construiu um castelo de areia?

- Não, Mestre! Para que o faria?

 São feitos de meras ilusões!

- Construa, cuide, aproveite, desapegue-se!  Orientou o Mestre, seriamente. Jamais altere essa ordem.

O jovem sentou-se na areia e começou a engenhar uma suntuosa arquitetura de areia. Aquelas horas que se sucederam, nas quais ele se dedicou àquele grande feito, não teve pensamentos paralelos, viveu e desfrutou daquele momento, não teve olhos para outra coisa. Estava no momento presente. Ele construiu, cuidou, aproveitou..., mas a maré subiu, as ondas se agitaram e o castelo se desmanchou.

Frustrado, mesmo já prevendo o que logicamente aconteceria, ele se recolheu ao descanso ali nas proximidades onde estavam em um retiro com demais colegas.

No outro dia, novamente caminhando com seu Mestre, o jovem relatou o ocorrido no dia anterior, na praia e o Mestre outra vez lhe recomendou:

- Vá e construa um castelo de areia! Construa, cuide, aproveite, desapegue!

E o jovem discípulo bastante desanimado obedeceu e construiu outro castelo de areia, ainda maior e mais belo que o anterior.  Ele construiu, cuidou, aproveitou e veio a maré e o levou!

Assim se sucedeu na praia por quarenta dias em que passou em companhia de seu Mestre, construindo castelos de areia. Construía, cuidava, aproveitava e se decepcionava quando as ondas vinham e os levavam sem dó, nem piedade.

Pela quadragésima vez o Mestre o recomendou:

- Construa um castelo de areia!

Dessa vez, o jovem construiu, cuidou, aproveitou e se foi, sem olhar para trás! Já não estava preocupado quando as ondas viessem para destruí-lo e o tomasse dele.

O Mestre o chamou e disse:

- Agora sim, você entendeu!

TARDE DEMAIS!

Por Liécifran Borges Martins (Cariacica, ES)


Tarde demais para

vir atrás de mim.

Meu amor por você,

deixou de existir.

 

Tarde é para falar,

que me ama,

Pois não estou mais

presente aqui.

 

Tarde demais para

se declarar para mim.

Em segundos veio outro,

é meu amor como eu merecia.

 

Tarde demais para

vir me encontrar.

Cansei de te esperar

e fui para o Paraná.

 

Tarde demais!

Você fez tarde,

Chegou tarde,

E se foi logo, meu amor!

 

Biografia:

Liécifran Borges Martins é uma compositora, escritora, poetisa e parodista, brasileira. Nascida em Vitória, no Espírito Santo. Começou a escrever poemas entre seus 14(quatorze) para 15 (quinze) anos de idade.  Técnica em Química pelo Instituto Federal do Espírito Santo (IFES).

SILÊNCIO DOS AMORES

Por Izemar Fernandes Batista (Brasília, DF)

 

Do tempo, inquietas lembranças esvoaçam

sobre mim e, solenemente, uns vultos passam.

Sombras exaustas, débeis, espectros sem cor,

procissão de vidas que sonhavam o amor.

 

Trêmula, as sombras achego ao meu abraço.

Confusa, os espectros eu beijo. Destraço

o tempo... Sua tenra luz tremeluzente

converteu os meus sonhos em ventura ausente.

 

Amor, Felicidade e Dor, os três, vencidos.

todos acalentados, mas, de vez, perdidos

nas pungentes lembranças do exaurido encanto.

 

E leves, tristes, evolam-se num arquejo,

deixando o meu abraço, esquecendo meu beijo,

mas, levando as fúnebres notas do meu canto.

 

A VOLTA

Por Izemar Fernandes Batista (Brasília, DF)

 

Volta-se de um amor

como um fogo de artifício:

apagado, vencido.

 

Volta-se de um amor

como uma cachoeira:

derramada, jogada, lá embaixo.

 

Volta-se de um amor

como um barco depois da procela:

dilacerado, roto.

 

Volta-se de um amor

como passarinho que perdeu o ninho:

desesperado, aflito.

 

Volta-se de um amor

como uma flor no ocaso do dia:

pendida, despetalada.

 

Volta- se de um amor

como um menino surrado:

choroso, desiludido.

 

Volta-se de um amor

como um palhaço despedido do circo:

destronado, traído.

 

Volta-se de um amor

como um rio que seca:

trincado, vazio.

 

Volta-se de um amor

como um náufrago:

cansado,

arquejando,             

sozinho,

na praia.

 

Volta-se de um amor,

assim. 

ALMA NUA

Por Izemar Fernandes Batista (Brasília, DF)

 

Eu,

nua, na Lua.

Livre,

leve,

louca de luz.

Eu,

nua, na Lua

cheia,

clara,

cândida de luz.

Eu,

nua, na Lua.

Pálida,

plácida,

plena de luz.

Eu,

nua, na Lua,

num céu sem cortinas.

 

MULHERES DA RESISTÊNCIA: A GERAÇÃO DE MULHERES FORTES

Por Clarisse da Costa (Biguaçu, SC)

 

A mulher não quer algo pela metade até mesmo porque ela sempre está por inteiro. Essa ideia de que a mulher aceita qualquer coisa porque é um ser frágil e carente é uma visão equivocada da sociedade sobre o seu lado feminino. A verdade é que a sociedade desde os primórdios da humanidade tenta moldar a mulher à sua maneira, o que acha necessário e correto. Mas a cada tentativa se depara com a mulher independente e feminista. Aquela mulher bem decidida. Aí surge o medo das mulheres dominarem o mundo, porque para o bem de todos a mulher submissa e sem conhecimento é melhor para uma convivência social e política. 

Certa vez, numa oficina de poesia dada por mim a convite, eu falei que a mulher com conhecimento é mulher com asas para voar longe, o que é condizente com a realidade atual dessa mulher livre. Então qualquer coisa que a mulher faça será alvo de críticas do homem e de toda sociedade. Quando eu falo sociedade eu coloco também nessa bagagem a mulher, porque algumas mulheres não conseguem lidar com o posicionamento e liberdade de outras mulheres. Tem uma lógica nisso, analisando todo o contexto histórico feminino vemos que a mulher foi educada a ser dependente não independente.

O livro Mulheres da Resistência mostra que nós mulheres temos inúmeros desafios diários e que com toda ousadia e residência podemos vencer.

Quando eu recebi o convite para essa empreitada não imaginava o tamanho do impacto que essa obra fosse causar. Primeiro que trabalhar no coletivo é sempre complicado, surgem muitas divergências. Segundo que a jornada literária é uma estrada cheia de desafios.

O início não é nada fácil, é preciso muita determinação e uma boa mentalidade para aguentar todos os percalços que possam ocorrer.

Então o correto a se fazer é desacelerar e buscar entender que a pressa não te faz chegar a lugar algum. É preciso ter calma. Este caminho é um processo lento. Foi com calma que eu consegui colocar em prática essa obra, mas claro não foi um processo solitário e a obra não surgiu do nada. Vou explicar melhor.

Como menciono no prefácio do livro, Mulheres da Resistência, "parece que ser mulher é estar condenada nesse mundo ilusório do faz de conta, sendo que a realidade é outra e bem cruel".  O "era uma vez" é uma ideia de manter a mulher sob o controle, não tem nada lúdico se formos analisarmos a fundo. Mas o que eu quero dizer com isso? Que não somos mais aquela mulher submissa, toda romântica e sonhando com o seu príncipe encantado. Viramos o jogo e invertemos o papel da história.

A história da mulher é outra, mudamos o nosso rumo, temos os nossos objetivos e agimos por nós mesmos. A verdade é que subimos degraus na vida e quebramos o nosso silêncio. Essa antologia traz isso, mulheres fortes rompendo barreiras, que nasce da necessidade de trazer questões, seja em versos, contos, prosas, recorrentes no dia a dia da mulher. Numa sociedade autoritária e extremamente machista foi de suma importância ter organizado a antologia Mulheres da Resistência. A antologia vem evidenciar agravantes constantes na vida da mulher, a luta diária contra a violência, os abusos psicológicos e tantas outras crueldades de maneira que possa ajudar outras mulheres, fazendo com que vejam que não cabe mais isso em vossas vidas.

O livro lançado pela Editora Contos Livres tem as seguintes autoras, Clarisse da Costa, Cláudia Ricardo, Vanice Ricardo, Raquel Conti, Srta Cabernet, Elisa Carvalho, Neuza Marsicano, Rubiane Guerra, Leyde Dayanna, Janaína Couvo, Rosangela Reis, Mára, Cassilmara Rocha, Eliana Massola, Lucinha Amaral, Soraia André, Graziela Barduco, Ada Xavier e Lecy Cardoso.

Quando me referi no início dessa matéria que, "a mulher não quer algo pela metade" eu quis dizer que a mulher do Século XXI não aceita mais migalhas, ela quer o que é seu por direito. As autoras presentes nesse livro são o próprio exemplo.

E como foi trabalhar com elas? - Você deve estar se perguntando. Posso te responder com uma só palavra, desafiante. Claro, uma experiência única para quem sempre teve como tema recorrente na sua escrita a mulher. Mas o melhor mesmo é ver o seu bom trabalho sendo reconhecido por todas. O interessante é que algumas participavam pela primeira vez de uma antologia.

Mára Núbia chegou a nos dizer:  ̶ Foi a primeira antologia que participei e gostei muito’’. Como já disse, vou mais pro conto que pra crônica. Achei interessante, tantos textos sobre um mesmo tema. Vários olhares. Tive medo de não corresponder, de não ver a mensagem compreendida, mas este é o risco. Valeu. Abraços a todas as almas escribas.

 

Para adquirir o livro Mulheres da Resistência, você pode entrar em contato com a Editora Contos Livres através do e-mail: contato@editoracontoslivres.com.br ou no site https://www.editoracontoslivres.com.br. Ela também pode ser encontrada no Instagram @editoracontoslivres.

Para falar comigo, escritora, designer e organizadora da antologia você pode entrar em contato através do Instagram @clarisse_da_costa; do Facebook Clarisse Costa e do e-mail: clarissedacosta81@gmail.com

Clarisse da Costa é poetisa, contista, cronista e designer gráfico em Biguaçu, Santa Catarina.

SETE DIAS!

Por Fabiane Braga Lima (Rio Claro, SP)


O tempo estava nublado, mas eu precisava ir ao médico. Praticamente São Paulo sempre está nublado ou garoando. E eu não consegui arrumar um táxi. Então, pedi à vizinha que me levasse até a clínica. O doutor Lucas, como de costume, estava atrasado. Sentei-me e esperei ser chamada. O meu médico chegou três horas atrasado.

— Eva! — Felizmente a recepcionista me chamou.

            Levantei-me e entrei no consultório e lá estava o meu médico, o doutor Lucas. Ele me olhou com pesar e senti algo estranho no ar.

— Hoje não é uma consulta de rotina, apenas lhe entregarei o diagnóstico, do último exame que a senhora fez. — Disse o médico de forma comedida.   

— Posso abrir, aqui? — Perguntei com medo.

— Fique à vontade! — Respondeu tenso o médico.

Li trêmula o diagnóstico nas minhas mãos, e eu não acreditei, eu estava com câncer no intestino. O médico me confortou e disse que estava no estágio um. O doutor Lucas me encaminhou para fazer o tratamento que seria longo, lento e doloroso, então realizei várias quimioterapias. Sentia-me confiante.

Os meses se passaram e lá estava eu de novo, na frente do doutor Lucas. Eu com os resultados dos exames, eu nervosa e trêmula, não consegui abrir os resultados dos exames. Eu devolvi os exames de volta para o meu médico, esperando que ele abrisse o envelope e lesse o que ele já sabia.

— Nem uma melhora? — Perguntei já intuindo o que eu já sabia.

— Infelizmente, não senhora Eva, o câncer se apostrofou, sinto muito.

— Existe outro procedimento? — Perguntei ao médico sem muitas esperanças. Eu não tinha um fio de cabelo no corpo, estava cansada e com o corpo cheio de remédios para aliviar as dores intermináveis.

          — A senhora tem sete dias no máximo, aproveite a vida, faça tudo que sempre teve vontade. — Disse o médico serenamente.  

Eu estava muito debilitada, eu não podia me locomover muito bem. Reuni todas as forças que eu ainda tinha, peguei meu seguro de vida, resolvi aproveitar os setes dias. Fui arrumar as malas, fui procurar Ezequiel, ele estava me esperando na frente da casa dele.

— Como foi? Anda diz?  — Perguntou Ezequiel para lá de curioso com o óbvio.

— Por favor, mantenha a calma. Tenho sete dias. O câncer se espalhou Ezequiel! — De pronto falei sem rodeios.

Desesperado, ele desmaiou, logo pensei quem era, mesmo o lado mais frágil da relação. Eu queria gritar alto, mas não gritei, era o fim de uma relação dúbia e estranha. Não era o melhor jeito de acabar uma relação, eu bem sei, mas chega de fraquezas para o pouco tempo que tenho.  Agora, mais um problema brotou na minha cabeça, algo bem prático a bem da verdade. Eu precisava chamar um táxi, quero viajar, durante o pouco tempo que ainda me restava, somente sete dias. Deixei Ezequiel desmaiado e aproveitei o resto de meus dias. Resolvi ir a Búzios. Cruel? Talvez, pois não era tempo para ser leve e justa. Então lá estava ele, por fim a vida me era favorável, um táxi que estava vago, a poucos metros. Então não pensei duas vezes, levantei e o motorista me avistou e parou. Depois de uma breve discussão com o profissional do volante, entrei no carro de aluguel e parti. Eu queria ver o mar, por quê? Eu não sei dizer.   

       Ao chegar no meu destino e que lugar lindo, o hotel era cinco estrelas, para minha sorte era baixa temporada e o local estava quase deserto. Nunca imaginei conhecer tanto luxo, sempre fui uma simples secretária. Só me lembro de estar diante da recepção do hotel, sem saber o que eu estava fazendo direito. E eu esquálida foi até o outro lado da rua, entrei na loja e comprei um biquíni. Eu queria me embainhar, adentrar no oceano e partir rumo à praia.  

        Sabe, eu nunca me senti tão feliz. Joguei a toalha na areia e me deitei perto dos rapazes, e logo se dispersaram. Logo notei, um deles dizendo: — Aquela estranha, estou enojado, vamos embora. — Como não percebi, era a minha classe social estampada na minha, pensei, sem pensar na minha condição física. 

         Havia somente poucos dias para aproveitar, esnobei e Ezequiel, que estava desempregado, pensei que o nosso amor era recíproco. Coberta de remorsos voltei para o hotel e arrumei as malas e voltei para casa, se fosse morrer eu queria morrer em casa.

            A viagem de volta não foi fácil, mil coisas passaram na minha cabeça, como seria a minha volta? Como eu seria recebida? E lá estava ele me esperando com os olhos rasos d’água. Ao descer do táxi Ezequiel me abraçou chorando como uma criança, então estava o lado frágil da relação de novo.

       — Eva meu amor, o médico precisa dizer algo importante. — Disse Ezequiel soluçando e continuou — Foi até a clínica. Entramos no consultório, e o Doutor disse-me: — Tenho uma boa notícia!

        — Pois me diga! — Falei friamente.

        — O diagnóstico não era seu, foi um erro da recepcionista, está curada, espero que possa perdoá-la. — Ponderou Ezequiel, olhando os meus olhos em chamas  

          — Perdoá-la, eu quero matá-la, me fez gastar o dinheiro por nada! — Falei no meu desespero.  

Estávamos prestes a comprar um apartamento. Agora tenho que inventar uma desculpa para Ezequiel.

Chegando em casa, sentei-me e pensei rápido em meio à confusão mental que eu estava.

— O tratamento foi caro, tive que gastar o dinheiro que a gente guardou...

— Esqueça isto Eva meu amor, arrumei um emprego, o salário é bom! — Falou Ezequiel eufórico.

— Fico feliz! — Falei desanimada

— Vamos nos casar Eva, eu quero casar contigo. Mas com uma condição, daqui a sete dias você arrumará outro emprego, sei de tudo querida. — Disse Ezequiel sério, ele sabia que eu era infeliz no meu emprego.  

— Ezequiel. — Falou colocando a mão no rosto dele.

— Eva meu amor! Sempre estive ao seu lado, lembra-se?

           — Desculpa-me?  Perguntei emocionada para Ezequiel.  

— Sete dias! Falou Ezequiel, olhando fundo em meus olhos.

         Ele sempre soube de tudo, me conhecia a mim mais que eu mesma. Mentiras, tem consequências. Devemos valorizar tudo o que for recíproco.

 

Texto de Fabiane Braga Lima, poetisa, contista e novelista em Rio Claro, São Paulo.

Contato: debragafabiane1@gmail.com 

OPINIÃO: O PROTAGONISMO DA MULHER PRETA INCOMODA

Por Clarisse da Costa (Biguaçu, SC)

 

Estamos em pleno Século XXI, com muitos avanços tecnológicos, o conhecimento na palma da mão, muitas aberturas para debates em comitês e podcasts e mesmo assim a mente humana parece não evoluir. Parece que ter consciência é algo para poucos. Digo isso porque é recorrente o preconceito que a sociedade insiste em dizer que não existe. A mulher preta é a prova disso, apagada do seu protagonismo.

Por quê? Porque a mulher preta expõe toda problemática que a sociedade brasileira tenta esconder e ver quem sempre foi para eles inferior subir cada degrau da vida com toda ousadia é como um tapa na cara de todos.

E ela alçando voos bem altos incomoda muita gente. Ou a mulher preta é a empregada ou a mulher preta é a puta. Mas a mulher contrariando a todos ocupa o seu espaço de destaque.

Por essa conquista e tantas outras que buscam de todas as formas apagar a existência da mulher preta e não o bastante, roubam a sua identidade. Quando chamam uma mulher preta de morena fazem com que ela tenha o tempo todo se posicionar "eu sou preta", sendo que o mais importante é quem ela é, também as suas conquistas individuais e coletivas.

Clarisse da Costa é poetisa, cronista e designer gráfico em Biguaçu, Santa Catarina.

Contato: clarissedacosta81@gmail.com

MULHERES FORTES, MULHERES DA RESISTÊNCIA

Por Clarisse da Costa (Biguaçu, SC)

 

Como menciono no prefácio do livro, Mulheres da Resistência: "parece que ser mulher é estar condenada nesse mundo ilusório do faz de conta, sendo que a realidade é outra e bem cruel".

O "era uma vez" é uma ideia de manter a mulher sobre o controle, não tem nada lúdico se formos analisarmos a fundo. Mas o que eu quero dizer com isso? Que não somos mais aquela mulher submissa, toda romântica e sonhando com o seu príncipe encantado. Viramos o jogo e invertemos o papel da história.

A história da mulher é outra, mudamos o nosso rumo, temos os nossos objetivos e agimos por nós mesmos. A verdade é que subimos degraus na vida e quebramos o nosso silêncio.

Essa antologia traz isso, mulheres fortes rompendo barreiras, que nasce da necessidade de trazer questões, seja em versos, contos, prosas, recorrentes no dia a dia da mulher. Numa sociedade autoritária e extremamente machista foi de suma importância ter organizado a antologia Mulheres da Resistência.

A antologia vem evidenciar agravantes constantes na vida da mulher, a luta diária contra a violência, os abusos psicológicos e tantas outras crueldades de maneira que possa ajudar outras mulheres, fazendo com que vejam que não cabe mais isso em vossas vidas.

 

Clarisse da Costa é poetisa, cronista e designer gráfico em Biguaçu, Santa Catarina.

Contato: clarissedacosta81@gmail.com

FLOR DO MATO (DOS NOSSOS DIAS FELIZES)

Por Fabiane Braga Lima (Rio Claro, SP)

 

Tomás se levantou da cama, usando apenas de andador para se locomover, eu não quis ajudá-lo. Notei que havia emagrecido uns 60 quilos pelo menos, ele estava se esforçando, logo, logo, poderia realizar a cirurgia bariátrica.  Impaciente, pois não queria esperar pela consulta agendada para os próximos dias, e liguei para o médico de Tomás, eu queria saber do diagnóstico. Fui para o escritório de Tomás e tranquei a porta, disquei o número da clínica que atendia Tomás, eu aí me dei conta que tinha memorizado o número da clínica. A recepcionista sonolenta me passou para o consultório de médico de Tomás, ela fez isso depois de muita insistência minha.  

— Dona Valentina Tomás teve uma melhora sim! — Respondeu o médico a minha pergunta e ponderou — Eu não posso passar as informações pelo telefone.  

— Tomás se esforçou e um guerreiro! — Falei tentando abrir caminho para agendar a cirurgia.  

— Eu vou ter que falar com o marido da senhora o mais rápido possível.

Não posso dizer que é cem por cento de certeza, pois depende também do humor do paciente. Mas creio que na próxima semana elaboraremos a cirurgia bariátrica.

       Fomos consultar o médico no dia seguinte. E tudo correu bem, o humor de Tomás estava muito excelente. O médico nos passou o estado de Tomás, os riscos da cirurgia e pós-operatório. Peguei na mão de Tomás e ele me olhou com firmeza, assentiu com a cabeça e consentimos com a cirurgia. Parecia um sonho bom, assinamos os formulários sem resignar e a cirurgia foi agendada. Ao voltarmos para casa fui ter com nosso enfermeiro, ele fadigado, se aliviou, pois construímos uma boa relação.

        Estávamos extremamente felizes, naquele dia, então resolvemos dispensar o enfermeiro, e passar o dia inteiro com Tomás. Liguei para os nossos filhos, quem sabe, poderiam se alegrar. Infelizmente, não foi o caso!

     Mas a vida me felicitou, ao lado do meu amor. No dia seguinte acordamos bem cedo, pela primeira vez em meses nos sentamos à mesa e tomamos o nosso café da manhã juntos. Eram torradas e um café forte, logo, com cautela Tomás se levantou e pegou o andador para se exercitar, o meu marido se sentia bem melhor. Este era meu Tomás, valente.

      Olhei pela janela, o jardineiro estava com mudas de plantas em um saco. Resolvi ir até lá.

       — Parece que vai plantar novamente! Eu disse esperançosa  

      — Sim, dessa vez o jardim da senhora ficará mais belo, a geada está acabando.

       Calei-me! Afinal, ele era o jardineiro e bem mais qualificado que eu. Preciso ver a flor do mato. Pequenina, mas valente, viva e saudável.

        — Adorando a flor do mato, senhora Valentina? — Disse feliz Isaac.   

        — Sim, Isaac! — Respondi efusiva.  

        — Dona Valentina, essa flor é valente, nasce e cresce, até em esgoto! — Falou espontaneamente o jardineiro.  

        — Preciso ir! — Disse me despedindo de Isaac. Eu tenho pavor de lidar com flores, preciso ser mais audaciosa com ele.


Texto de Fabiane Braga Lima, poetisa, contista e novelista em Rio Claro, São Paulo.

Contato: debragafabiane1@gmail.com