Por Fabiane Braga Lima (Rio Claro, SP)
O
tempo estava nublado, mas eu precisava ir ao médico. Praticamente São Paulo
sempre está nublado ou garoando. E eu não consegui arrumar um táxi. Então, pedi
à vizinha que me levasse até a clínica. O doutor Lucas, como de costume, estava
atrasado. Sentei-me e esperei ser chamada. O meu médico chegou três horas
atrasado.
—
Eva! — Felizmente a recepcionista me chamou.
Levantei-me e entrei no consultório e lá estava o meu médico, o doutor Lucas.
Ele me olhou com pesar e senti algo estranho no ar.
—
Hoje não é uma consulta de rotina, apenas lhe entregarei o diagnóstico, do
último exame que a senhora fez. — Disse o médico de forma comedida.
—
Posso abrir, aqui? — Perguntei com medo.
—
Fique à vontade! — Respondeu tenso o médico.
Li
trêmula o diagnóstico nas minhas mãos, e eu não acreditei, eu estava com câncer
no intestino. O médico me confortou e disse que estava no estágio um. O doutor
Lucas me encaminhou para fazer o tratamento que seria longo, lento e doloroso,
então realizei várias quimioterapias. Sentia-me confiante.
Os
meses se passaram e lá estava eu de novo, na frente do doutor Lucas. Eu com os
resultados dos exames, eu nervosa e trêmula, não consegui abrir os resultados
dos exames. Eu devolvi os exames de volta para o meu médico, esperando que ele
abrisse o envelope e lesse o que ele já sabia.
—
Nem uma melhora? — Perguntei já intuindo o que eu já sabia.
—
Infelizmente, não senhora Eva, o câncer se apostrofou, sinto muito.
—
Existe outro procedimento? — Perguntei ao médico sem muitas esperanças. Eu não
tinha um fio de cabelo no corpo, estava cansada e com o corpo cheio de remédios
para aliviar as dores intermináveis.
— A senhora tem sete dias no máximo, aproveite a vida, faça tudo que sempre
teve vontade. — Disse o médico serenamente.
Eu
estava muito debilitada, eu não podia me locomover muito bem. Reuni todas as
forças que eu ainda tinha, peguei meu seguro de vida, resolvi aproveitar os
setes dias. Fui arrumar as malas, fui procurar Ezequiel, ele estava me
esperando na frente da casa dele.
—
Como foi? Anda diz? — Perguntou Ezequiel para lá de curioso com o óbvio.
—
Por favor, mantenha a calma. Tenho sete dias. O câncer se espalhou Ezequiel! —
De pronto falei sem rodeios.
Desesperado,
ele desmaiou, logo pensei quem era, mesmo o lado mais frágil da relação.
Eu queria gritar alto, mas não gritei, era o fim de uma relação dúbia e
estranha. Não era o melhor jeito de acabar uma relação, eu bem sei, mas chega
de fraquezas para o pouco tempo que tenho. Agora, mais um problema brotou
na minha cabeça, algo bem prático a bem da verdade. Eu precisava chamar um
táxi, quero viajar, durante o pouco tempo que ainda me restava, somente sete
dias. Deixei Ezequiel desmaiado e aproveitei o resto de meus dias. Resolvi ir a
Búzios. Cruel? Talvez, pois não era tempo para ser leve e justa. Então lá
estava ele, por fim a vida me era favorável, um táxi que estava vago, a poucos
metros. Então não pensei duas vezes, levantei e o motorista me avistou e parou.
Depois de uma breve discussão com o profissional do volante, entrei no carro de
aluguel e parti. Eu queria ver o mar, por quê? Eu não sei dizer.
Ao chegar no meu destino e que lugar lindo, o hotel era cinco estrelas, para
minha sorte era baixa temporada e o local estava quase deserto. Nunca imaginei
conhecer tanto luxo, sempre fui uma simples secretária. Só me lembro de estar
diante da recepção do hotel, sem saber o que eu estava fazendo direito. E eu
esquálida foi até o outro lado da rua, entrei na loja e comprei um biquíni. Eu
queria me embainhar, adentrar no oceano e partir rumo à praia.
Sabe, eu nunca me senti tão feliz. Joguei a toalha na areia e me
deitei perto dos rapazes, e logo se dispersaram. Logo notei, um deles dizendo:
— Aquela estranha, estou enojado, vamos embora. — Como não percebi, era a minha
classe social estampada na minha, pensei, sem pensar na minha condição
física.
Havia somente poucos dias para aproveitar, esnobei e Ezequiel, que estava
desempregado, pensei que o nosso amor era recíproco. Coberta de remorsos voltei
para o hotel e arrumei as malas e voltei para casa, se fosse morrer eu queria
morrer em casa.
A viagem de volta não foi fácil, mil coisas passaram na minha cabeça, como
seria a minha volta? Como eu seria recebida? E lá estava ele me esperando com
os olhos rasos d’água. Ao descer do táxi Ezequiel me abraçou chorando como uma
criança, então estava o lado frágil da relação de novo.
— Eva meu amor, o médico precisa dizer algo importante. — Disse Ezequiel
soluçando e continuou — Foi até a clínica. Entramos no consultório, e o Doutor
disse-me: — Tenho uma boa notícia!
— Pois me diga! — Falei friamente.
— O diagnóstico não era seu, foi um erro da recepcionista, está curada, espero
que possa perdoá-la. — Ponderou Ezequiel, olhando os meus olhos em chamas
— Perdoá-la, eu quero matá-la, me fez gastar o dinheiro por nada! — Falei no
meu desespero.
Estávamos
prestes a comprar um apartamento. Agora tenho que inventar uma desculpa para
Ezequiel.
Chegando
em casa, sentei-me e pensei rápido em meio à confusão mental que eu estava.
—
O tratamento foi caro, tive que gastar o dinheiro que a gente guardou...
—
Esqueça isto Eva meu amor, arrumei um emprego, o salário é bom! — Falou
Ezequiel eufórico.
—
Fico feliz! — Falei desanimada
—
Vamos nos casar Eva, eu quero casar contigo. Mas com uma condição, daqui a sete
dias você arrumará outro emprego, sei de tudo querida. — Disse Ezequiel
sério, ele sabia que eu era infeliz no meu emprego.
—
Ezequiel. — Falou colocando a mão no rosto dele.
—
Eva meu amor! Sempre estive ao seu lado, lembra-se?
— Desculpa-me? Perguntei emocionada para Ezequiel.
—
Sete dias! Falou Ezequiel, olhando fundo em meus olhos.
Ele sempre soube de tudo, me conhecia a mim mais que eu mesma. Mentiras, tem
consequências. Devemos valorizar tudo o que for recíproco.
Texto
de Fabiane Braga Lima, poetisa, contista e novelista em Rio Claro, São Paulo.
Contato:
debragafabiane1@gmail.com
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