sábado, 1 de setembro de 2018

ESFINGE (2018)

Por Paccelli José Maracci Zahler (Brasília, DF)


GULODICE (POEMA DADA)



Por Paccelli José Maracci Zahler (Brasília, DF)

harmoniosa e doce sou eu...
que é uma gulodice
contra uma doce dama melíflua?
de novo e mais, mata-me outra vez.

o que fazem do doce os grolados
e uma doce uma rebuçada,
a adoçar para aliviar nada?
o que fazem do doce os gelados?

mas me digas que de novo sentiste,
doce ou salgado, alegre ou triste,
se algo salgado existir,
que mais me canso, de tanto ouvir?

nesta mistura salgada e doce,
no que valho menos, mais mereço.

TEMPOS


Por Pedro Du Bois (Balneário Camboriú, SC)

A boca seca
sobre a hora
da ansiedade

longe o assobio:
             alguém passa
             com medo

na tinta fresca
              fresta
         por onde
    vejo o futuro

precioso líquido
na regeneração
do corpo

vento. 

TIMES


By Pedro Du Bois (Balneário Camboriú, SC)

(Marina Du Bois, English version)

The dry mouth
on the anxiety
hour

away the whistle:
               someone passes by
               in fear

in fresh paint
             crack
     from where
I see the future

precious liquid
in body
regeneration

wind.

MEMÓRIA

Por Pedro Du Bois (Balneário Camboriú, SC)



A memória incorpora

o tempo: torna

leve o presente



pesado

no que repetimos

como erro



no que aprendemos errado



a memória é descanso e algoz

de que não podemos fugir

ou trocar as histórias

passadas por nossos avós



nela nos prendemos ao fantasiar

as cores que não tiveram

no futuro que não teremos.

MEMORY



By Pedro Du Bois (Balenário Camboriú, SC)

(Marina Du Bois, English version)



Memory incorporates

time: makes

the present light



heavy

in what we repeat

as error



in what we learn wrong



memory is rest and tormentor

from which we can not escape

or change the stories

passed by our grandparents



we cling to it by fantasizing

the colors they didn’t have.

Faz um pacto comigo

Por Samuel da Costa (Itajaí, SC)
Para negra Valquíria

Ficamos nós dois mudos!
Calados!
Inertes!
Absortos!
Depois da hora derradeira.
Bem depois do amor...
Quando as primeiras impressões,
Dissiparem-se por completo.
E não sobrar mais nada...
De nós dois!
  E tu ter me esquecido,
 Completamente!
***
Hei! Olvidado amor...
 Não chore assim!
Faz um pacto de sangue comigo.
De não nos amarmos mais!
Quando o carrasco vier nos buscar.
Quando o destino nos afastar.
 Para todo o sempre!
***
Faz um pacto de silêncio comigo!
Silenciamos!
O nosso amor clandestino.
Para que os deuses e deusas.
Tenham piedade de nós.
***
Hei! Luz da minha vida...
Não sonhe mais comigo.
Em horas impróprias...
Não digas furtivamente!
 Para mais ninguém...
Que ainda me amas.
Não digas para os outros...
 Que ainda sonhas comigo!
Em horas extremas.
***
Fui eu que deixei...
As cinzas das horas...
Levar o meu platônico amor!
Por ti.
Minha divina Luna!
E o olhar da Medusa...
Sepultou o meu profano amor
Por ti…
Para todo o sempre.
Minha Beltia imortal...


Saí sem pensar em nada

Por Vivaldo Terres (Itajaí, SC)

Saí de casa sem pensar em nada.
Mas o impossível aconteceu!
Ao passar na esquina,
Por acaso encontrei a mulher;
Que me esqueceu.
***
Sorriu para mim com um sorriso triste...
Daqueles que não escondem a dor;
***
Extraída de um coração partido.
Demonstrando mágoas.
E cicatrizes...
Causadas por um novo amor.
***
E ao me reconhecer.
Chamou meu nome;
E em minutos contou sua vida.
De seus olhos azuis lágrimas rolaram;
Demonstrando sinal de arrependida.
***
E pedindo perdão disse-me assim:
- Depois que te deixei foi que compreendi!
Que sempre te amei.
E daquele dia em diante, só vegetei...
E não mais vivi.

Minh'alma implora


Por Vivaldo Terres (Itajaí, SC)

É o teu amor que minh'alma implora,
Não sei por que isto acontece.
Tantas outras almejam o meu carinho,
Mas infelizmente é por ti que ela padece!
***
Quantas noites solitário e triste,
Lembrando ao amanhecer o que passou.
E outras almas felizes e sorridentes
Relembrando os belos momentos
Da noite interior
***
Por que só tu que me fazes sofrer?
Estou preso a ti sem que percebas,
Sou teu escravo no mundo em que vivo.
Por favor, minh'alma te apaixona,
Por uma daquelas que tanto me almejam.


CARTA DE DOMITILA PARA KATTY


Por Urda Alice Klueger (Enseada de Brito, SC)

Oi, Katty, prazer! A gente ainda não se conhece e então me apresento: sou Domitila Chungara, a gatinha que a Urda criou depois que veio morar aqui em Enseada de Brito. Não sei muito bem o começo da minha história, e então vou repetir o que a Urda sempre conta: em janeiro de 2017 eu tinha sido jogada fora na Cachoeira, que é um lugar do qual nem me lembro, e o Chapéu, que é um morador daqui, me achou e me trouxe para cá, e eu estava na entrada da Servidão Basilissa, perdidinha da silva, quando a Urda me levou para a casa dela. Ela já tinha outros dois cachorros e uma gata, então, e um cachorrão enorme, chamado Atahualpa, ficou tão tomado de amores por mim que queria por toda a lei me cheirar e me amar, mas com aquele focinhão dele, ia mais era me esmagar. O único lugar que parecia seguro para mim era a banheira do quarto, e lá eu fiquei a primeira semana, com uma casinha de papelão e uma cama quentinha, tomando leite em pires e lambendo molho de espagueti. Algumas vezes por dia a Urda deixava aquele cachorrão ir me ver, e ele latia atroando os ares, querendo ao menos me lamber, mas era uma questão de segurança que ele ficasse para lá da borda da banheira.
              Um dia, eu já podia subir na tal borda e depois conquistei o mundo, e todo a gente dizia coisas assim: “Oh, quem é essa coisinha de nariz cor de rosa e com uma lua na ponta do rabo?” – mas isto faz um tempo enorme, e eu era mesmo uma coisica de nada, que se enfiava debaixo das cobertas para escapar do ar condicionado daquele longínquo verão, mamava no braço ou na orelha ou no nariz de qualquer um, pois decerto deixara de mamar antes da hora e dormia abraçadinha com o cachorrinho Zorrilho, que então era quatro vezes maior do que eu.
              A gata da casa era uma esnobe que nunca gostou de mim – quem gostava eram os cachorros, e até hoje são eles os meus amigos preferidos e até hoje a gata da casa não vai com a minha cara.
              Pesei-me hoje: agora sou uma gatona de cinco quilos e meio, com longas pernas boas para pular e subir até no pinheiro do seu Carlos Japonês, e não há cachorro no mundo que seja tão rápido quanto eu. Desde pequena que ando atrás dos cachorros e conheço a praia toda, e todas as árvores, e todos os esconderijos... meu, Katty, mas não era isso que eu ia contar. Ia contar é que hoje estive na cidade de Palhoça, e mesmo não tendo visto muitas coisas, o que eu senti de cheiros! Na verdade, o que vi foi apenas a clínica veterinária onde fora tomar vacina e as pessoas que lá trabalham e a tia que dá pics, mas foi uma aventura! Quando eu ouvia pessoas falando de ônibus lotados, nunca pudera imaginar do que se tratava, mas hoje viajei dentro de um. Na verdade, era o carro da Urda, e nos bancos da frente iam ela e nossa amiga Maria Antônia com Atahualpa no colo – eu sou doida pela Maria Antônia; às vezes saio de casa em algum horário como três da madrugada e vou bater lá na casa dela e ela abre a janela e eu durmo lá com ela até de manhã, e ela me chama de amorzinho, veja só que querida que é.
         Hoje, no entanto, eu viajei na parte de trás do carro com mais dois cachorros, sendo que a Tereza Batista tem 25 quilos e eu estava presa numa casa de gato de pano, bem macia e segura, mas era tanta gente dentro daquele “ônibus” que quase fiquei esmagada quando a mochila da Urda caiu sobre mim. Fiz cada MINHAU que a Maria Antônia correu a me acudir. Acabou tudo bem, mas quando chegamos em casa estávamos todos exaustos. Fui dormir no sofazinho azul, e logo Tereza Batista foi também, assim meio em cima de mim, mas eu nem me dei conta dos 25 quilos dela, e passamos horas, ali, como mortas! Andar em ônibus lotado não é fácil!
         Era isto que queria contar, que pela primeira vez viajei para longe e fui numa cidade de verdade – estava tão emocionada que nem senti o pics! A Urda achou que já era tempo de eu ficar sua amiga e lhe contar as novidades.
         Quando a gente se encontrar de verdade eu irei subir no seu colo. Por enquanto, deixo um minhau bem legal, daqueles que faço quando luto de batalha com Tereza Batista. Tomara que você também me chame de amorzinho!
              Grande carinho,

              Domitila Chungara Klueger
              Gata

 Sertão de Enseada de Brito em 16 de agosto de 2018.




CARTA DE MANUELITA PARA KATTY


Por Urda Alice Klueger (Enseada de Brito, SC)

Oi, Katty, penso que você vai se lembrar de mim. Sou aquela gatinha caçadora e gritadora que a Urda pegou para criar nos tempos de Blumenau, aquela do livro “Nossa família aumentou”. Lembrou, né? Então sabe que um dia a Urda me guardou dentro de uma caixa para gatos, me colocou no carro, e com o Atahualpa e uma mala veio embora para este lugar chamado Enseada de Brito. Fomos morar numa velha casa onde não havia quase nada dentro, e ficamos lá acampando alguns dias, para que eu me acostumasse ao novo ambiente. E então chegou a mudança e foi uma coisa trágica: jamais poderia imaginar tal confusa invasão na vida de uma gatinha delicada como eu! Por sorte, descobri um lugar por onde passar que me levava ao forro da casa, e depois, diversas outras passagens, lá em cima, que permitiam que eu circulasse na mata dos fundos e nos quintais de alguns vizinhos, e lá passei um ano e oito meses. Só descia para a casa quando me sentia muito segura – na verdade, só gostava da Dona Julita, a senhoria da casa, que sempre aparecia para uma visitinha, e de uma outra moça muito querida, que me chamava de Manu, e que eu permitia até que me pegasse no colo. A Urda punha minha comidinha numa prateleira bem alta e às vezes até chorava porque eu não queria mais nada com ela, mas para que é que ela me trouxe para este novo lugar? E ainda por cima, um mês depois, trouxe para casa um cachorrinho faminto, o Zorrilho – tá, era fácil para mim me entender com mais um cachorro – afinal, antes de vir para cá convivera com o Atahualpa e o Cusco e nunca me importei quando eles quase se esgoelavam de tanto latir para mim. Não bastando o cachorrinho, sabe o que ela fez no outro mês? Arranjou mais uma gatinha, uma filhotinha de nada que se chamou Domitila, e aquilo foi a gota d´água para azedar a minha vida. Mais tarde veio a Tereza Batista, uma cachorrona que sempre quis me cheirar e que eu nunca deixei – daí Tereza Batista ficou foi amiga de Domitila e até hoje pensa que eu sou um bicho muito estranho, já que nunca me cheirou, e quando me vê ou me pressente deixa sair do peito um ronco que parece o de um vulcão.
              Bem triste foi a minha vida naquela casa velha com esse bicharedo, sem contar os insetos e outros bichos que viviam no forro da casa e na mata circundante e no calorão do verão e no frio do inverno naquele espaço inacessível aos outros. É bem verdade que a Domitila e outros gatos da vizinhança andaram por lá, mas saiu todo o mundo apanhando.
              Daí, faz pouquinho tempo, a Urda comprou uma outra casa e fez tudo o que pode para me amansar de novo. Ganhei uma casa de gato bem macia, que é uma toca protegida e escura, uma porção de agrados, e tive que ficar presa com Domitila uma semana inteira no quarto de visitas com um cheirinho ligado à tomada, que era para que a gente não brigasse: acho que aquilo era algo como uma maconha para gato. E depois nos mudamos para a casa nova, e aqui não tem nenhuma abertura para eu passar para o forro. A Urda cuidou dos detalhes, separou um pomar para gatos e outro para cachorros, mandou fazer uma escadinha de gato para que a gente pudesse entrar pela janela do quarto dela, fez um ambiente com a minha toca e comidinhas no closed, e havia que se acostumar. Mesmo assim relutei um bocado, voltei diversas vezes para a casa velha, passando por dentro da mata por caminhos que só eu sei, muito diferente de Domitila, que passa pela praia e surra os cachorros que aparecem. Sou uma gata muito fina para essas baixarias.
              Na outra casa agora não tem mais nada, e como a Urda sempre ia me buscar de volta, acabei me acostumando com a nova vida. É bem legal dormir, de novo, na cama que já foi minha, principalmente neste frio que está fazendo, e me encostar na Urda para me esquentar. É verdade que do outro lado a Domitila também se encosta, mas com o maior respeito, senão eu faço “Fiiizzz” para ela e ela se manda. Atahualpa também não gosta muito de Domitila – ele sempre foi o meu cachorro, faltava agora que mudasse de lado. Dormimos os quatro juntos, já que os outros cachorros dormem no escritório, e começou uma nova fase na minha vida nesta casa cheia de sol e vento, com suas tantas janelas e com um pomar de gatos que na verdade é meu. Domitila é uma cachorrista; passa o dia com os cachorros e sei que de manhã dorme sobre a mesa da sala de jantar, porque bate sol bem ali, o que faz com que a Urda corra a trocar a toalha da mesa a cada vez que chega uma visita.
              Pois é, Katty, só queria dar umas notícias e dizer que a vida voltou a ficar boa. Preocupo-me um pouco porque Atahualpa está ficando bastante velho, mas ele ainda corre, galopa e atravessa os ribeirões que saem na praia até nadando, o que me faz pensar que teremos ainda muito tempo para sermos felizes. Então deixo um “mio” bem delicado para você e fico aguardando sua visita.
              Grande carinho,

              Manuelita Saens Klueger
              Gata
             
Sertão da Enseada de Brito, 02 de agosto de 2018.