domingo, 1 de abril de 2012

MACHADO DE ASSIS NO MINISTÉRIO DA AGRICULTURA

Por Paccelli José Maracci Zahler 

INTRODUÇÃO 

Até 1861, o Brasil possuía seis ministérios. Daí em diante, enquanto durou a monarquia,os ministérios passaram a ser sete e o mais importante deles era o Ministério da Agricultura, Comércio e Obras Públicas, como era chamado na época. 
Ao Ministério da Agricultura, Comércio e Obras Públicas estavam subordinadas as Escolas Práticas de Agricultura, os engenhos centrais de produção de açúcar, o serviço de combate às endemias agrícolas, a distribuição de plantas e sementes, o regime das minas, o Museu Nacional, o Serviço de Iluminação Pública da Corte, o Jardim da Praça da Aclamação, o Jardim do Passeio Público, o Jardim Botânico, os trabalhos de publicação da FLORA BRASILIENSIS, os padrões do sistema métrico decimal, a representação do Brasil em exposições internacionais, os Institutos de Agricultura, colonias agrícolas e agroíndustriais, o serviço de caça e pesca, o registro das sociedades anônimas, o serviço de extinção de incêndios, a fiscalização da empresa concessionária do serviço de esgotos da Corte (The Rio de Janeiro City Improvements), as obras públicas da capital do Império, a siderurgia, as estradas de rodagem, o serviço de catequese dos índios, o controle das terras da nação, os bondes, a navegação, os serviços de abastecimento de água e as obras gerais das Províncias (estradas de ferro, açudagem, dragagem, cabos submarinos, canais, correios e telégrafos, controle da situação dos escravos). Posteriormente, tais atividades foram distribuídas por vários outros ministérios, como o de Viação e Obras Públicas, Agricultura, Trabalho, Indústria e Comércio, Educação e Cultura, Interior, Justiça e Prefeitura do Distrito Federal; e, com o passar do tempo, por mais outros ministérios à medida que os governos foram mudando. 
Pois, foi a esse importante ministério que Machado de Assis dedicou 35 dos seus 41 anos como servidor público, os quais abrangeram o Império (1867 a 1889) e a República (1889 a 1908). 

MACHADO DE ASSIS NO SERVIÇO PÚBLICO 

Joaquim Maria Machado de Assis, uma das maiores expressões da literatura brasileira, legou-nos uma obra rica em contos, poesia, romances e crônicas até hoje estudadas e traduzidas para outros idiomas. Uma pergunta,porém, vem à mente ao se pensar se teria vivido Machado de Assis unicamente da literatura em um país onde a ela nunca foi dada tanta importância. É óbvio que não, principalmente para quem nasceu pobre, mulato, gago, feio e epiléptico. 
Basta lembrar as palavras de MATOS (1939), "no Brasil, o artista não tem função econômica no meio social e literatura não é trabalho conversível em dinheiro". Hoje ainda é assim e os escritores sabem muito bem disso. 
Até os 33 anos, Machado de Assis não encontrou estabilidade funcional e financeira. Durante todo esse tempo teve várias ocupações, todas ligadas ao jornalismo e às letras. 
Com 16 anos de idade, começou a trabalhar na livraria de Francisco de Paula Brito, também fundador do jornal A MARMOTA, em cujas colunas apareciam versos escritos pelos poetas da época e no qual, em 21/06/1855, Machado de Assis publicou seus primeiros versos. 
Em 1856, entrou como aprendiz de tipógrafo na Imprensa Nacional, tendo como diretor o romancista Manoel Antonio de Almeida, autor de "Memórias de um Sargento de Milícias". Por ser muito jovem e inexperiente, com freqüência sofria repreensões do chefe porque se descuidava do serviço para "ler pelos cantos". 
Dois anos depois, era tipógrafo da Imprensa Nacional, revisor de provas da livraria de Paula Brito e do jornal CORREIO MERCANTIL. 
Aos 21 anos, entrou para a redação do DIÁRIO DO RIO DE JANEIRO, de propriedade de Quintino Bocaiúva, afastando-se em 1867, quando foi nomeado Diretor de Publicação do DIÁRIO OFICIAL. 
Em 1868, aos 29 anos, era reconhecido como jornalista, poeta e escritor teatral e três anos depois, com a criação do Conservatório Dramático, sob a presidência de José de Alencar, Machado de Assis foi nomeado um de seus membros, porém, em cargo honorífico. 
Em abril de 1872, foi designado amanuense (escrevente) da Comissão do Dicionário Tecnológico da Marinha, com gratificação de 50 mil réis mensais. No ano seguinte, mais precisamente em 31 de dezembro, com a reforma da Secretaria da Agricultura, foi nomeado Primeiro Oficial, com vencimentos de 4 milhões de réis anuais, tendo deixado o lugar que ocupava no DIÁRIO OFICIAL, em 06/01/1874, para não acumular cargos. 
Por Decreto da Princesa Isabel, de 07/12/1876, foi promovido a Chefe de Seção, com vencimentos de 5 milhões e 400 mil réis anuais. Para se ter uma idéia , os desembargadores do Império recebiam 6 milhões de réis anuais. 
Em 1878, deixou todas as suas colaborações na imprensa pois fazia parte da Comissão de Reforma da Legislação das Terras, cujos trabalhos terminaram com a publicação de um volume intitulado "Terras, compilação para estudo da Secretaria da Agricultura", inteiramente redigido por ele em 1886. 
Não agüentando o excesso de trabalho, adoeceu. O então Ministro Rodrigo Augusto da Silva permitiu que se tratasse sem licença. Como não apresentou melhoras, foi obrigado a pedir licença de três meses para tratamento de saúde. Foi então em companhia da esposa, D. Carolina Augusta Xavier de Novais, convalescer em Nova Friburgo. Passou a apresentar problemas de visão, prejudicando o estudo e o trabalho. 
Dois anos depois, foi convidado pelo Ministro da Agricultura, Buarque de Macedo, para exercer o cargo de Oficial de Gabinete. 
Pouco tempo depois, o Ministro Buarque de Macedo faleceu em Minas Gerais, sendo substituído pelo Ministro dos Negócios Estrangeiros, Pedro Luiz, que acumulou as duas pastas. 
O Ministro Pedro Luiz era amigo de Machado desde a juventude e companheiro de jornalismo e, não só conservou-lhe as funções de gabinete, como a amizade. Era comum trabalharem em casa e jantarem juntos. 
Em janeiro de 1882, com licença médica de três meses, foi para Nova Friburgo para "restaurar as forças perdidas no trabalho extraordinário que realizara entre 1880 e 1881", segundo Joaquim Nabuco. O mesmo aconteceu em 1887. 
Um ano antes, o Imperador o faz Vogal do Conservatório Dramático, do qual fora membro desde a fundação em 1871. Em 1888, foi agraciado pela Princesa Isabel com o oficialato da Ordem da Rosa. 
Aos 50 anos de idade, em março de 1889, atingiu o último degrau de sua carreira de funcionário público quando foi nomeado Diretor da Diretoria Geral de Comércio com um soldo anual de 8 contos de réis. 
Em 1893, com a reforma que transformou a antiga Secretaria da Agricultura em Secretaria da Indústria, Viação e Obras Públicas, passou a Diretor Geral da Viação. 
A Academia Brasileira de Letras foi fundada em 1896 e Machado de Assis foi aclamado seu primeiro Presidente. 
As Diretorias Gerais de Viação e Obras Públicas foram reunidas em uma só em novembro de 1897 e o governo, considerando que o lugar deveria ser ocupado por um técnico, resolveu colocar em disponibilidade o Diretor Geral Machado de Assis, com os vencimentos que lhe competiam e que eram, desde 1891, de 9 contos anuais, assim tendo se conservado até a sua morte. 
O Decreto saiu no dia do Ano Novo de 1898, firmado por Prudente de Morais e pelo Ministro de Viação, Sebastião de Lacerda. Caetano César era o nome indicado para substituir Machado de Assis. 
Os companheiros de trabalho atestavam não só o seu rigor no cumprimento do dever como sua capacidade administrativa. Um Diretor Geral, podendo dispor de técnicos com quem se aconselhar, precisaria sobretudo ser um administrador. 
A explicação mais aceita para sua saída foi sua incompatibilidade com o Ministro, devido ao excesso de zelo de sua parte, pois era muito aferrado às leis, intransigente em sua execução, tornando-se um funcionário incômodo. 
A medida feriu seus sentimentos pois desejava continuar trabalhando. Entretanto, não chegou a ficar inativo um ano. Em 16 de novembro de 1898, Severino Vieira, que substituíra Sebastião de Lacerda na pasta da Viação, o nomeou Secretário, vindo a servir com o Ministro Interino Epitácio Pessoa e com Alfredo Maia. 
Na opinião de Epitácio Pessoa, "um grande escritor e um péssimo Secretário". 
Nesse período, talvez por desgosto, parou de escrever semanalmente na GAZETA DE NOTÍCIAS, aparecendo algumas vezes nas suas colunas, em 1900, substituindo Olavo Bilac, ou publicando raramente algum conto ou notícia literária. 
Suas últimas páginas na REVISTA BRASILEIRA, datam de 1898. Depois disso, limitou-se a escrever um conto anual no ALMANAQUE BRASILEIRO JAMIER. Talvez o abalo sofrido por ter sido posto em disponibilidade do Serviço Público tivesse diminuído suas forças, ou as funções de Secretário e as de Presidente da Academia Brasileira de Letras, ocupassem todo o tempo disponível. 
Em 1902, sob a presidência de Rodrigues Alves, sendo Ministro da Viação Lauro Muller, Machado de Assis foi nomeado novamente Diretor Geral de Contabilidade do Ministério da Viação, em ato datado de 18 de novembro, cargo que ocupou até morrer. 
Já não era mais o mesmo. Sentia que envelhecia e que chegara o momento de ir se retirando. "Precisamos deixar lugar aos moços", não cansava de repetir, perguntando se já não estaria se tornando fastidioso. 
Além das funções de Diretor Geral de Contabilidade, foi nomeado para a Comissão Fiscal e Administrativa das Obras do Cais do Porto. 
Nos últimos dias de setembro de 1908, havia dois meses que não comparecia ao Ministério devido a problemas de saúde. Sofria de câncer na língua, não podendo alimentar-se direito.Em 21 de junho do mesmo ano, completara 69 anos. 
Às 3h45min, da madrugada de 29/09/1908, na casa onde passara quase um terço de sua vida, expirou. 

CONSIDERAÇÕES FINAIS 

Quando ingressou no Ministério da Agricultura, Machado de Assis já era escritor e jornalista de prestígio. Durante seus 35 anos de bons serviços, testemunhos da época o consideram um exemplo de zelo, assiduidade e competência. 
Apesar de não haver deixado o jornalismo, nunca sacrificou a função pública, apesar de sua saúde frágil que o obrigava a entrar de licença médica por longos períodos. 


Agradecimentos 

O autor deseja agradecer ao CENAGRI/MA, nas pessoas das bibliotecárias Lilian, Narda e Mônica, que não mediram esforços no levantamento bibliográfico básico para a elaboração do presente trabalho. 

Bibliografia 

IMPRENSA NACIONAL. Machado de Assis, Servidor Público. Brasília, 1995. 
62 p. 

MAGALHÃES JUNIOR, R. Machado de Assis, funcionário público (no 
Império e na República). Ministério da Viação e Obras, Serviço de 
Documentação, Rio de Janeiro, 1958. 130 p. 

MATOS, M. Machado de Assis: o homem e a obra. Companhia Editora 
Nacional, São Paulo, 1939. 454 p. 

MIGUEL-PEREIRA, L. Machado de Assis (estudo crítico e biográfico). 
Companhia Editora Nacional, São Paulo, 1939. 342 p. 

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