(Escrito em
1997)
Faz pouco
mais de um ano que, numa mostra de cinema, revi “Férias no Sul”, filme feito em
Blumenau na década de sessenta, e que na época causou um frenesi na cidade.
Vivíamos,
naquele tempo do passado, sob a égide do cinema – a televisão demoraria muito,
ainda, para chegar por aqui – na verdade, as pessoas só acabaram comprando
televisão para a Copa do mundo de 70. Assim, nos anos sessenta, o divertimento
preferido de quase todo o mundo era ir ao cinema, ao cinema que nos trazia
Brigite Bardot e o capitão Custer matando índios, além de farwest
famosos, como “Django e o Dólar Furado”, e o agente 007, e por aí afora. Ir ao
cinema era o máximo, era ir à mais maravilhosa das fábricas de fantasias –
imaginem o que foi saber-se que aqui, na nossa provinciana Blumenau, iria ser
rodado um filme de verdade, um filme que seria visto por todo o Brasil!
O primeiro frissson
foi das pessoas que queriam aparecer no filme: todos queriam, e não sei como é
que os diretores do mesmo fizeram para chegar à seleção dos que poderiam ou não
ir para a tela. Vendo o filme, agora, diverti-me um monte vendo a antiga
juventude blumenauense, hoje transformada em gente sisuda e responsável, a
fazer “pontas” no filme, compenetradíssima no seu papel de alguns minutos. Até
o nosso austero ex-prefeito Victor Fernando Sasse, que naqueles idos deveria
andar pelos vinte anos, aparece em longa cena, dançando num baile do Tabajara,
o nosso clube mais tradicional.
Bem, depois
do frisson das filmagens, houve o frisson de ver o filme, este
muito maior, pois colocava o filme ao alcance de todos os mortais, e ninguém
perderia, por nada no mundo, de ver aquele filme que se passava na nossa
cidade, embora a opinião geral fosse de ele denegrira a imagem de Blumenau.
Malhou-se o pau em “Férias no Sul” como nunca se tinha malhado o pau em filme
nenhum, em Blumenau, nem mesmo naqueles em que Brigite Bardot aparecia nua.
Lembro-me como “Férias no Sul” foi
apresentado em Blumenau no Cine Blumenau, em sessão contínua para dar vazão aos
quase oitenta mil blumenauenses que não perderiam de vê-lo por nada, só para
depois poder falar mal. A coisa funcionava assim: abriam-se as portas do nosso
maior cinema, esperava-se entrar a multidão que o encheria, fechavam-se as
portas e rodava-se o filme – quando acabava, as pessoas saíam e a operação se
repetia – isso por dias seguidos, sessão após sessão, sem nunca acabar a longa
fila de espera que, lembro-me muito bem, ia do Cine Blumenau até onde hoje é o
Banco do Brasil, uma fila de quase uns quinhentos metros. O pessoal que
esperava na fila ainda não tinha visto o filme, claro – mas falava mal dele com
toda a veemência, como se cada um fosse o diretor responsável. E o que é que
exasperava tanto os ânimos dos blumenauenses de antanho, que tornava o filme
tão terrível, que fazia com que ninguém quisesse perdê-lo?
Revi
o filme faz ano e pouco, e morro de rir ao me lembrar. O famoso Davi Cardoso,
aquele mesmo das pornochanchadas, mas que nesse tempo ainda filmava de roupa,
vive uma cena de amor com uma moça da nossa cidade. A cena é num baile dum
clube de Caça e Tiro, onde os dois se paqueram dançando, e depois dão o fora. A
cena seguinte é deles voltando ao salão, a nossa linda moça loira sugerindo que
teve suas roupas descompostas, e, oh! o frenesi dos frenesis: nossa atriz de um
dia arruma o ombro da sua roupa, e, supra-sumo da sem-vergonhice para a época,
deixa ver a alça do seu sutiã!
Gente,
todo o pau que se quebrou em cima do filme foi por causa dessa cena fugaz, e de
uma moça acertando a roupa e deixando entrever a alça de um sutiã! O escândalo
foi tão grande que essa moça, que trabalhava numa loja de calçados, teve que ir
embora da cidade.
O
filme, mesmo, é de uma grande ingenuidade. A tal alça do sutiã deu todo o toque
picante para aquele momento de gloria de Blumenau, o de aparecer nas telas dos
cinemas de todo o Brasil. Até hoje, nas rodas de pessoas de mais idade que eu,
ouço falar do filme “Férias no Sul” como algo que envergonhou nossa cidade. As
pessoas de hoje deveriam rever o filme, para poderem rir de seus velhos
preconceitos. Quase não dá para imaginar que Blumenau, um dia, já foi assim!
Blumenau, 23 de junho de 1997.
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