(Para Luiz Inácio Lula da Silva)
Aqui a Primavera já vai
adiantada; já passamos Finados com suas tantas braçadas de flores e o meu
entorno é como um poema romântico, tantas são as cores, os pios, os
encantamentos dos morros próximos e do mar ali na frente. Escrevo na varanda, e
fora dela há dois arbustos que eu imaginara parentes de uma planta que um dia
conhecera com o nome de orelha d’ onça, e que deixei crescer porque queria
saber de tudo o que havia neste terreno com a casinha vinda pela metade do ano
como um presente de Natal. Aqueles arbustos cresceram e cresceram e passei a
apostar na sua sombra para o verão, já esquecida das orelhas d’ onça, quando
eles me fizeram essa surpresa que nunca acabo de curtir: seu florescimento em
cachos profundamente azuis (ou roxos?), cachos de tantas flores que pesam e
encurvam os caules grossos e fortes e que espantam pela sua quantidade e
coloração magnífica, dessas coisas que são bem do trópico, e eles me lembram
dos meus anseios de criança de muita leitura de um dia ir viver nos trópicos, sem ter a consciência de que já
estava neles, e que todos os abacaxis e canas de açúcar que rodeavam aquele meu
começo de vida já eram produtos tropicais. Parentes, sim, das humildes orelhas
d’ onça que conheci como habitantes de humildes brejos, esses arbustos aqui
dominam a paisagem e a minha imaginação de primavera, e vivo de máquina
fotográfica na mão, captando detalhes da goiabeira florescendo e das flores e
frutos da pitangueira, quando não saio rua afora, a fotografar os amarelos, os
azuis e brancos que estão por tudo, notadamente no pasto de vacas aqui bem
perto, onde os cachorros gostam de correr e que, vez ou outra, é parte tomado
pela maré cheia. Ah! E a maré, assim na Primavera, fazendo seu ciclo por conta
da lua, subindo e descendo duas vezes a cada dia, e a lua a cruzar seu caminho
pelo céu, a cada dia um pouco diferente, às vezes mais gorda, às vezes só um
risquinho de luz, e tudo é tão intenso, tão vibrante que fica difícil entender
como a gente suporta tanta beleza neste lugar único, e então eu penso nele,
impedido de ver que lá fora todas essas coisas estão acontecendo.
Sei que estás naquela cela estreita cuidando do meu
futuro e do futuro de todos nós, meu querido Presidente, mas me dói muito estes
mais de sete meses que estás lá, e sei, também, da tua fortaleza de inocente
que te impede de esmorecer quando parece que todo o mundo está ruindo... E esta
Primavera aqui no meu entorno, e tu a olhares para as paredes vazias e para um
naco de céu fora do contexto, enquanto eu tenho toda esta abundância de
belezas! Meu Presidente querido, o quanto, o quanto penso em ti e desejo que,
além da justiça, possas ter a Primavera de volta... De uma certa forma, vivo um
pouco por ti a cada dia, assim como tantos de nós também o fazem!
Boa noite, Presidente Lula. Daqui deste meu cantinho,
te sopro, com carinho, um sopro de Primavera.
Sertão da Enseada de Brito, 10 de novembro de 2018.
(Sobre a autora: Urda Alice Klueger é escritora, historiadora e doutora em Geografia)
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