Por Erivelta Diniz (Divinópolis, MG)
“oh!que hora abençoada
que os três Reis aqui chegou
trazendo a santa benção
aos devotos moradores
que ao receber a bandeira
santos reis abençoou”
CANTO POPULAR DE CHEGADA
FOLIA DE REIS
As estrelas nas antigas religiões do Egito e da
Assíria revelavam os mistérios divinos. Por ocasião do nascimento de Jesus, o
evangelista Mateus conta que magos vieram do Oriente guiados por uma estrela
que os conduziu à gruta de Belém, onde acabara de nascer o Salvador (Mt 2,2).
A jornada dos Reis Magos – Gaspar, Belchior e
Baltazar – começa a partir do momento em que recebem o aviso do nascimento do
Messias, 24 de dezembro, e segue até a hora em que encontram o menino Deus na
lapinha. Cantando de casa em casa, os foliões reconstituem a historia dos Reis
Magos.
A festa dos magos recorda a extensão do compromisso de Fé. Somente a fé
vê mais longe; com os magos, é preciso
ter olhos de fé para ver muito mais além da realidade visível. A seqüência de gestos de troca, entre o dono
da casa e os foliões durante uma visita ou uma pousada segue mais ou menos
nessa ordem:
· Os
foliões cantam diante da casa, e diante do(a) dono(a) pedindo licença para
entrar;
· O
dono da casa segura a bandeira, beija-a, ou seja, aceita a folia;
· Os
foliões entram, cantam dentro da casa, em volta do presépio, pedindo as bênçãos
do menino Jesus para os moradores;
·
Enquanto o(a) dono(a) da casa pede as graças da Bandeira, passeia com
ela pelos cômodos da casa, os foliões cantam até o retorno da bandeira narrando
a viagem e a intenção da visita;
·
Assim que o(a) dono(a) da casa retorna, os foliões pedem licença para
guardar os instrumentos e parar de cantar;
· O
dono da casa beija a bandeira e a entrega aos foliões
· O
dono da casa serve aos foliões café, biscoito e doces ;
· Os
foliões cantam agradecendo cada um dos bens ofertados a eles;
·
Alguém pode intervir e dá uma
nova esmola;
· Os
foliões pedem bençãos para os parentes;
· O
dono da casa faz várias ofertas, tanto em dinheiro, quanto em material;
· A
pessoa que faz a promessa pega a bandeira, beija e oferta uma esmola;
· Os
foliões cantam anunciando que a promessa já foi cumprida;
· Os
foliões pedem licença pra saírem;
· O
palhaço sacode a “sacolinha” em frente aos donos da casa, pedindo esmola;
· De
costas, num sentido de respeito e agradecimento, saem um a um, cantando e
agradecendo.
A folia assim cumpre a sua verdadeira obrigação, de
dar, de receber e de retribuir. O ritual da folia extrapola os louvores ao
menino Jesus. O que a folia faz é proclamar
o mistério da manifestação (Epifania) de Cristo a todos, através de um ritual.
A presença dos palhaços encanta e fortalece as
folias. São considerados elementos de alegria para crianças e adultos.
Segundo a historia oral dos próprios foliões, os
palhaços representam o mal, a concretização dos soldados do Rei Herodes.
Há interpretações de que o rei Herodes teria mandado
espiões pra seguirem os reis Magos a fim de localizar exatamente o lugar onde
se encontrava o Messias e assim matá-lo. Os soldados disfarçavam usando
mascaras, evitando o seu reconhecimento. Os palhaços teriam função de desviar
os reis Magos do caminho, distraindo-os com brincadeiras.
Numa outra interpretação, os palhaços representam o
próprio demônio, para impedir que haja aproximação de pessoas do caminho dos
Reis Magos.
Com a ligação ao mal, estes palhaços são impedidos
de tocar a bandeira sagrada da folia, nunca podendo estar à frente nos
Cortejos, também impedidos de cantar as musicas dos devotos dos Reis Magos.
Há outras proibições para os palhaços, como a
impossibilidade de se aproximarem do presépio e tocar no menino, ou em alguns casos de só entrarem na casa
visitada após os cantos finais, sem as
mascaras.
Enquanto os foliões cantam as “chulas” – danças e cantos de origem
portuguesa – os palhaços fazem acrobacias, dando cambalhotas, rodopiando em um
pé, lutando com os bastões.
Na cultura popular de nossa região do Oeste de
Minas, diante da pureza e da força do menino Jesus se converte e decide
acompanhar os reis para sempre, abandonando o rei Herodes. Quem se encontra
verdadeiramente com Jesus não retorna mais pelo mesmo caminho. A vida prossegue
com novo sentido.
Antigamente em muitos sermões de domingo, o povo
aprendia o cristianismo ouvindo os
sacerdotes, ensinavam que os festejos dos reis representavam atos nocivos à
moral, havendo presença do demônio.
Hoje a situação é nova e há uma clara inversão desta
rejeição da igreja: alguns sacerdotes procuram valorizar as folias nas
liturgias, a tradição religiosa da Folia de Reis no período natalino.
Propiciando liberdade, alegria e fortalecimento
em festejar durante a missa.
A folia de Reis encerra o ciclo natalino, visitando
as casas até o dia 06 de janeiro que é o dia da comemoração da Epifânia.
Depois as festividades seguem até o dia de São
Sebastião, ampliando o caminho da estrela até o dia 20 de janeiro.
“Os três reis
Quando souberam
Viajaram sem parar
Cada um trouxe um presente
Pro menino Deus, ofertar”
(Sobre a autora:Erivelta Diniz é historiadora e pesquisadora da religiosidade popular do centro-oeste de Minas Gerais)
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