Por Humberto Pinho da Silva (Porto, Portugal)
Penso que é do vosso conhecimento, pelo menos
dos meus leitores – se os tiver, – que sou casado, há mais de quarenta anos,
com paulistana.
O avô de minha mulher, emigrou para o
Brasil, no início do século XX, após concluir o curso de “Comércio”, numa
escola que ficava junto ao Palácio da Bolsa, no Porto.
Emigrou,
porque lhe disseram: que nesse país, era fácil enriquecer. Embarcou num velho
navio, juntamente com outros, que buscavam vida melhor, com destino a Santos.
Rapidamente verificou, que a terra de
Santa Cruz, não era o paraíso esperado; mesmo assim, chegou a industrial.
Azares e infortúnios, levaram-no a perder parte do que conseguiu, o que não
admira, porque era intelectual, e dedicava-se às “ Letras “; caminho certo para
empobrecer alegremente.
Estando a conversar, com ele, no
“jardim-de-inverno”, na confortável casa de Vila Mariana, narrou-me, a traços largos,
a sua história.
Perguntei-lhe, a razão de nunca ter
vindo a Portugal:
Olhou-me fixamente, com os inquietos e
paternais olhos verdes, e, após segundos de silêncio, disse-me, em doce voz,
levemente cantada e conselheira:
-
“ Estou velho! …Já não vale a pena! … Depois, já não vivem os que conheci.
Estive sempre à espera de dias melhores… assim fiquei por aqui, pensando nos
que deixei…”
Camilo – considerado Mestre dos
mestres da literatura portuguesa por Vasco Botelho de Amaral (*) – incluía, nos
seus romances, quase sempre, o “ brasileiro”, que regressava à terra natal,
abastado de bens e de anos. Em regra, casava com jovem, por vezes, fidalga,
filha de ilustres nobres arruinados.
Mas a maioria dos que partiam e
partem, nunca regressavam, nem regressam, porque não queriam, nem querem, que
se saiba, que não alcançaram o sucesso desejado.
Silva
Pinto, narra, com azedume: “No Brasil”, as tristes desventuras de muitos que
desembarcaram no Rio: Ao famoso Ator Justiniano Nobre de Faria, foi encontrá-lo
como humilde carregador; e ao professor Franco (que introduziu, no Brasil, o
método de leitura de João de Deus,) segundo escreveu: “ Só pedia, aos cafres,
em troca da luz que lhes levava, o pão de casa dia.”
Há anos, indo eu, do Tua para Vila
Flor, em tarde de calor tórrido (com o asfalto da estrada, a ferver,) na
traquitana da Carreira. Sentou-se, ao meu lado “brasileiro”, de meia-idade,
trajado de claro e chapéu panamá; ostentava, entre os grossos e ásperos dedos,
várias notas de mil escudos! …
Saiu em Carrazeda de Ansiães, muito
hirto, muito sério, muito emproado… com as notas bem visíveis! …
A vida da maioria dos emigrantes não foi
fácil (basta ler a “ Selva” e os “Emigrantes”, de Ferreira de Castro,) e ainda
não é, apesar de agora, serem mais cultos, e haver leis que os protegem.
Muitos, após ásperas e humilhantes
desventuras, terminam na miséria; e é, muitas vezes, em extremava miséria, que morrem, longe da
família e dos que lhe querem bem.
Nos anos noventa, amigo meu, sabendo
que ia em viagem para São Paulo, pediu-me para entregar certa quantia, a irmão,
que vivia no Rio.
Prontamente aceitei, acrescentando:
que me deslocaria lá, para entregar-lhe pessoalmente.
Muito retraído, quase em cochicho,
disse-me: que enviasse, o dinheiro, pelo correio. “ É que vive numa favela, em
grande miséria…”
Assim fiz.
Todavia, há, quem conseguiu e consiga,
singrar, em terra estranha, tornando-se: importante empresário, político
influente, e comerciante de sucesso.
Infelizmente,
são exceções. A maioria, já se sente feliz, poder vegetar de cabeça erguida.
Tudo depende de sorte… e espírito de
iniciava…; e de outras coisas, que, por decoro, não devo revelar...
(*)
“ Glossário Critico de Dificuldades da Língua Portuguesa”
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