Por Napoleão
Valadares (Brasília, DF)
No
barco, os três conversavam mais do que pescavam. Mas Ananias, além de
conversar, bebia. Os outros tomaram uns tragos e foram parando. Ananias, não.
Bebia. Devagar e sempre. A ponto de os companheiros se preocuparem. Vamos ver
se pára. Bebendo demais. Aí, de repente, você vai é cair n’água e dar trabalho
pra gente. Mas ele nem ligava. Contava suas potocas e virava.
O
sol já baixo e quase nada pegavam. Alguns mandins, um ou outro piau. Mas a
prosa animada, gostoso aquele paradeiro, e o rio com sua beleza. Ananias é que
foi desanimando devagarinho, encostou-se no fundo do barco e dormiu. Dormiu que
roncava. Os companheiros acharam até bom, que pelo menos ele não caía n’água.
Começou
a escurecer e resolveram parar de pescar para fazer a comida. Deixa Ananias aí.
Ele não vai dar conta mesmo de subir o barranco. Quando a bóia estiver pronta a
gente vem e chama.
Foram.
Por perto da barraca toparam um tatu. Uma idéia: iscar o tatu no anzol de
Ananias, que quando ele acordar, vai pensar que está delirando... Assim
fizeram. Desceram o barranco, entraram no barco, puxaram a linha dele, iscaram
o tatu e jogaram n’água.
Com
a comida pronta, foram chamá-lo. Nada. Nem se mexeu. Dormia a sono solto.
Acabaram largando. Se não acordava, como é que ia jantar? Era estender uma
coberta em riba e deixar que passasse a noite ali mesmo.
No
outro dia, logo ao amanhecer, foram lá. Ananias, vamos tomar café. Ele acordou
assim com um olhar pedrês, olhou para o rio, olhou para o céu, olhou para a
garrafa. É, dormi um bocado. Dormiu... agora vamos tomar café, que ontem você
nem jantou. É, vamos, mas espera aí, que vou tirar meu anzol primeiro.
Puxou
a linha, estava pesada. Opa! peguei. Puxou, foi tirando, levantou o tatu, olhou
para os dois e lascou esta: É até bom vocês aqui pra testemunhar, porque o povo
diz que pescador é mentiroso, mas este já é o terceiro que eu pego.
Sobre
o autor: Napoleão
Valadares é escritor. Autor dos romances “Urucuia” e “Remanso”, entre outros
livros. É membro da Academia Brasiliense de Letras e do Instituto Histórico e
Geográfico do Distrito Federal..
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