Por Samuel da Costa (Itajaí, SC)
Eu
prefiro frases feitas...
Adoro
lê-las… E pensar que são minhas!
Dizer:
- Vou te amar para todo o sempre!
Usando
velhos clichés.
***
Finjo
ser poeta! Às vezes contista...
Nessas
horas uso velhos clichés.
Porque
dizer: - Eu te amo, não é dizer bom dia!
***
Às
vezes leio velhas poesias.
Mas
só às vezes! E penso que são meus...
Aqueles
idílios de saudade...
***
Às
vezes penso ser poeta!
Na
pós-modernidade liquefeita!
A
usar velhos clichés!
Para
poder ousar dizer:
˗Te
amo, não é bom dia!
Agora
é oficial, Clarisse Cristal é a mais nova cidadã das nuvens, pois
passou aquela manhã cinzenta e sonolenta, de outono sem sol, com a
cabeça flutuando em brancas nuvens. Naquela hora de extrema dor e
desespero, o pensamento de Clarisse pairava, na jovem mãe que
acabara de se matricular, em uma academia de musculação, só para
mulheres, era a novíssima fixação da jovem mulher naquele momento.
Como o clube do livro, fora no mês passado, a redecoração completa
da casa no mês anterior, e outros objetos de desejos efêmeros de
quem não tem preocupações mais sérias na vida. Sempre era assim,
a jovem mãe de Clarisse Cristal sempre tinha uma novidade premente e
urgente de tempos em tempos que não chegam vivas ao fim do mês. E a
cada efemeridade premente e urgente trazia junto, como subproduto, o
pouco tempo para se dedicar a filha única. Já o pai, de Clarisse,
era todo e só trabalho, o executivo de meia idade regozijava ao
falar a toda hora, em qualquer lugar e para qualquer um, sobre
planilhas de custos, relatórios, projeções futuras, mercado
internacional, flutuação do cambio, retração da bolsa de valores
e uma série de burocratizamos entediantes para os meros mortais.
Agora
parada diante da estante de livros, usando um pesado avental de couro
cru, usava vestes negras como a noite, a bota cano alto ornamentadas
com as cinco fivelas cromadas, a veste nascia na palma dos pés e ai
esvanecer nos joelhos, a saia preta crazy-in-love Portugal, um
crucifixo, artesanalmente entalhado em madeira, Paolo Santo
envernizada, estava no pescoço e uma blusa justa gothic oco rendas
cor de vinho emoldurava o tronco. E ela ali estática diante da
estante de madeira, repletas de livros velhos, a mais nova cidadã
das nuvens pensou em tudo isso e indo por fim parar de forma
intempestiva no seu amor platônico pelo o motoboy da livraria.
Talvez o estilo de vida dele fosse de fato a real paixão derradeira
de Clarisse. As idas e vindas, com o vento morno beijando o rosto,
sem horários definidos ou mesmo itinerários preestabelecidos por
quem quer que seja. Foi em olhada rápida nas redes sociais do moço,
que Clarisse Cristal pode se deliciar e passar a amar mais ainda,
aquela figura ideal, com os gostos daquele homem recoberto de doces
mistérios, aquela homem um pouco mais velho que ela. A paixão por
fotografia, jardinagem, viagens sem destinos certos, tatuagens
tribais, música romântica e poesia por fim, logo ele, uma pessoa
tão calada no ambiente de trabalho. Isso tudo se passou num estante
pela cabeça sonhadora de Clarisse, a mais nova cidadã das nuvens.
Até uma voz estridente a trazer de volta para a realidade em que
vivia: — Adeus mundo das nuvens, ou melhor, até breve! — Falou
uma voz sonolenta e distante dentro dela, que Clarisse reconheceu
sendo dela mesma, mas com muito dificuldade.
—
Astride... Astride… Astride desce dai guria... E vem cá, sua
sonsa, sua tapada. Olha pra mim mulher!
Não
tinha jeito, fingir estar ocupada já não dava mais, agora era
descer da pequena escada de madeira, se virar e sorrir docilmente,
escutar aquela criatura enfadonha e fútil , como se importasse com
ela e a vida vazia de objetivos que levava. E a palavra cavalgadura
brotou instantaneamente na mente de Clarisse, de forma natural e mais
que espontânea. Ela pensou no fato de trabalhar no lugar há quase
um ano e do enorme e o chamativo crachá em seu peito, escrito com
letras garrafais a nome Clarisse Cristal não fazia diferença para a
anencéfala. E foi quase vinte minutos de um relato monocórdio, sem
sal e muito chato, onde Anna Victória contou em minúcias atômicas
do fim de semana dela em família, que teve a felicidade de conhecer
o novo namorado da própria Anna Victória.
—
Nossa amiga! Que interessante, meu Deus que bom amiga! Simplesmente
fantástico mesmo!
E
a vontade de sair dali correndo, é outro clichê que Clarisse
tentava evitar, mas em vão, pois o sentimento vinham sem perguntar
se poderia vir ou não. E o terraço mais próximo era outra opção
a ser considerado, em momentos como aquele era outro clichê a bem da
verdade que também chegava sibilante. E a cena insólita, de ver do
alto do prédio, o próprio corpo espatifado no asfalto quente e as
pessoas passando ao lado do seu corpo sem vida e em pedaços, sem se
importarem com ela, a deixou com dor de cabeça.
E
entre a família problema, subemprego e vazios colegas de trabalho,
paixonite pelo motoboy e repetidos clichês, ela vivia a vida na
espera de algo novo, não melhor, mas novo e diferente daquela rotina
claustrofóbica e mais que angustiante.
Nenhum comentário:
Postar um comentário