Por Paccelli José Maracci Zahler (Brasília, DF)
Revista que atravessou
gerações do futebol brasileiro resiste como símbolo do jornalismo esportivo
impresso e se reinventa no mundo digital.
Era um sábado de março de 2020
quando o torcedor brasileiro percebeu que algo mudara para sempre. As ruas
estavam mais vazias do que de costume — afinal, a pandemia de COVID-19 já havia
começado a transformar o ritmo da vida. Mas, naquela manhã, havia também um
silêncio diferente nas bancas de jornal. O Lance! diário esportivo que,
por mais de duas décadas, desde 1997, havia acompanhado a rotina de quem vivia
de futebol, deixava de circular em papel.
O fim de o Lance! não
foi apenas o fim de um jornal: foi o fim de uma era. Antes dele, já tinham
ficado pelo caminho gigantes como A Gazeta Esportiva, de São Paulo, e o
carioca Jornal dos Sports. O Brasil, que tantas vezes se reconheceu nas
páginas cor-de-rosa ou nos cadernos recheados de estatísticas, passava a contar
com um único sobrevivente em papel: a Revista Placar.
A Revista Placar nasceu
em 1970, em plena euforia da Copa do Mundo no México, quando Pelé, Jairzinho,
Tostão e companhia escreveram um dos capítulos mais gloriosos da história do
futebol. Era natural que o país quisesse uma revista que acompanhasse o tamanho
dessa paixão.
De lá para cá, foram cinco
décadas e meia de resistência. Mais que isso: de reinvenção. A Revista
Placar atravessou crises econômicas, mudanças de dono, transformações do
jornalismo e a revolução digital. Ainda assim, segue viva — mensal, em papel,
com 66 páginas que respiram futebol.
Abrir uma Revista Placar
é sempre mais do que folhear uma revista. É quase como abrir um álbum de
lembranças. Em novembro de 2024, por exemplo, o torcedor corintiano foi
recebido com a imagem de Yuri Alberto na capa, sorridente, sob a frase
provocativa: “Nunca critiquei”. Lá dentro, havia uma entrevista com
Guilherme Arana, um perfil detalhado de Lucero, do Fortaleza, e uma discussão
acalorada sobre a Bola de Ouro que, para muitos, deveria ter sido entregue a
Vinícius Júnior.
Mas o encanto da Revista
Placar não está apenas no conteúdo de cada edição. Está também nas suas
seções fixas, que se tornaram parte da rotina do leitor: Prorrogação,
com números e curiosidades históricas. Time dos Sonhos, em que craques
de diferentes épocas montam sua seleção ideal. E a última página, sempre
ocupada por um colunista convidado. Esses espaços funcionam como pequenas
janelas de memória e debate, que ajudam a entender por que, mesmo em tempos de
smartphones, ainda vale a pena sentar-se e folhear.
Se a tradição da Revista
Placar é fundamental, sua sobrevivência passa também pela capacidade de se
adaptar. Hoje, Placar já não é apenas revista: é aplicativo, canal de YouTube,
lives, podcasts, shorts, vídeos interativos.
No celular, o leitor encontra a
Placar Digital, que mistura notícias, vídeos e recompensas. No YouTube,
a TV Placar promove debates ao vivo e análises, com nomes conhecidos da
TV, como Leandro Quesada, Fábio Sormani, Flávio Gomes e Felippe Facincani. É o
mesmo espírito de 1970, mas agora com outras ferramentas: falar de futebol como
quem fala de vida, com paixão, com emoção e com profundidade.
A Revista Placar
sobreviveu porque nunca se limitou ao simples resultado do jogo. Suas páginas
contaram histórias de bastidores, denunciaram problemas estruturais do esporte,
registraram a ascensão e a queda de ídolos, e mostraram o quanto o futebol se
confunde com a própria identidade do Brasil. Mais do que informar, a Revista
Placar preserva a memória do futebol. Cada edição é quase um documento
histórico, guardado por colecionadores, revisitado por jornalistas, lembrado
por torcedores. Em um tempo em que a notícia se perde na velocidade do scroll
infinito das redes sociais, ter em mãos uma revista que exige fôlego e
contemplação é quase um ato de resistência cultural.
Hoje, quando completa 55 anos,
a Revista Placar está exatamente no ponto de equilíbrio entre o passado
e o futuro. De um lado, a tradição das bancas, das capas históricas, do papel,
que ainda resistem. Do outro, a multiplicidade de telas e plataformas que
garantem a sobrevivência da marca. Talvez essa seja a maior lição da revista:
mostrar que é possível se reinventar, sem perder a essência. O futebol continua
sendo o centro de tudo, não apenas como esporte, mas como memória, cultura, negócio
e emoção.
E enquanto houver torcedores
querendo não apenas saber o resultado, mas também entender o jogo, sempre
haverá um espaço para a Revista Placar.
Vozes que viveram a Placar
“Lembro de correr até a banca para comprar a edição com o
pôster da Seleção Brasileira, em 1994. Aquele poster ficou colada na parede do
meu quarto por anos. Para mim, a Revista Placar é parte da minha
adolescência.”
— Marcelo, 42 anos, torcedor do São Paulo
“Quando entrei no jornalismo esportivo, nos anos 80, meu
sonho era assinar uma reportagem na Revista Placar. Era o sinônimo de
prestígio, de estar no lugar certo, no momento certo. Até hoje, folhear uma
edição me traz respeito pela profissão.”
— Ana Luiza, 61 anos, jornalista esportiva
“Meu pai me deu minha primeira Revista Placar quando
eu tinha 12 anos. Guardo até hoje. Ele dizia: ‘Aqui você vai entender que
futebol é muito mais que bola na rede, é paixão. Tinha razão!”
— João Pedro, 27 anos, estudante de jornalismo
“Hoje, eu acompanho a Revista Placar pelo YouTube
e pelo aplicativo. Mas faço questão de comprar as edições especiais em papel. É
como ter um pedaço da história em mãos.”
— Camila, 34 anos, torcedora do Flamengo
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