Por Samuel da Costa (Itajaí,
SC)
Em dias de sol e calor
Minha alma serena
Passeia livremente
Pela charneca em flor
Nesses dias de extrema
felicidade
Eu tenho sentimentos
bons
Eu tenho pensamentos
probos
Eu sou feliz
Quando as duas, por fim se
desgrudaram, não tinham noção de quanto tempo de fato a cena se se desenrolou.
Foi como uma enorme fossa abissal equidistante se materialize entre ambas.
Clarisse com os olhos negros em chamas não parava de olhar para Anna Victória,
não a desejando e sim com certa curiosidade da bela e jovem mulher parada a
poucos centímetros dela e tão distante ao mesmo tempo. A outra estava confusa e
atônita olhava para o chão em desespero e perdidamente, como quem procurasse
algo que acabara de perder, sem nada a dizer, estava corada.
Era constrangedora a cena que
se desenrolava ali, mas ambas tinha noção que nada seria mais como antes, nada
poderia ser igual, tudo mudou em absoluto. Para Clarisse o mundo ficou menor e,
antigas certezas se dissolveram por completo. O desejo intenso e o corpo em
chamas exigiam prazer imediato e entrega completa, não o amor platônico e
pueril. A apaixonite adolescente, pelo motoboy da livraria, fora sepultada em
definitivo, era por fim uma mera lembrança esfumaçada, perdida não só no tempo,
mas também no espaço. A antiga cidadã das nuvens revogara a sua cidadania, já
não existia mais aquela figura evasiva, agora Clarisse tinha os pés bem
fincados no chão. Um novo mundo cheios de infinitas possibilidades erguia bem
diante dela. E não precisava ir muito longe de onde estava no exato momento.
Antigas desejos que vinham e evanesciam em nanossegundos, agora não pareciam
tão distantes e impossíveis assim. Clarisse não queria mais olhar pelas frestas
da vida, Clarisse queria vivê-la ao máximo do possível e do imaginável da
possibilidade cotidiana. E decidiu começar com o que tinha ao seu alcance, o
mundo liquefeito enfim batera na porta da jovem e bela Clarisse.
***
Anna Victória só agora tinha
lembrado do que tinha ido fazer ali, na seção de obras raras, e levou a mão até
a pesada prateleira de madeira Paolo Santo, e com o dedo indicador esquerdo
passa a em revista nos livros ali dispostos, encontrou o que queria e pegou um
por fim. Era a primeira edição de um livro autografado, raro e caro, o título
era as cinzas da horas. A moça se vira de forma intempestiva, da as costa para
a outra, sem nada dizer e sai sem presa alguma, se arrastando na verdade como
um enorme peso lhe caísse nas costas.
— Foi bom para você, meu anjo?
— A pergunta de Clarisse pegou a outra bem distante, era um tom alegre e
descontraído e não de deboche. A outra olha para trás e sorriu, já não estava
mais enrubescida, achava graça da situação embaraçosa, afinal o que era um
beijo entre amigas? Nada de mais, era assim que Anna Victória pensava naquela
hora.
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