segunda-feira, 1 de setembro de 2025

CRÔNICA DO DIA: A DAMA DO LAGO E A REVISTA ASTRO-DOMO (EPÍLOGO)

Por Clarisse Cristal (Balneário Camboriú, SC)

Para Fabiane Braga Lima

‘’São meio século de uma existência inexistente.

Com o cabelo nevado, que o tempo me deu...

 E eu ainda lutando para saber o que é uma chave

E para que ela serve! ’’

Samuel da Costa 

 

            Foi uma cena inusitada, eu tarde da noite chegando em casa depois de extenuantes aulas na faculdade e o meu pai, complacentemente me esperando na sala de estar. Ele com aquela cara amarrada, de poucos amigos, denotando que eu estava muito encrencada. O economista de profissão, estava me esperando com uma revista nas mãos, para a minha infelicidade era um exemplar da malfadada revista Astro-domo. Acontece que eu tinha esquecido a revista de literatura, arte e cultura, na nossa mesa de centro. Deixei a revista ali, pela manhã, depois de conferir as correspondências da família, eu separava as correspondências da casa, em montículos. Como eu meu velho, tinha o hábito de ler as correspondências dele e da casa pela manhã. O meu pai acordava bem cedo, para ler as correspondências antes que as novas chegassem, vai entender a agenda do economista. E o meu intento, era lê-la, assim que voltaria das minhas noturnas lides acadêmicas. E aquela quebra de rotina, que aliás não era uma rotina, pois eu tinha essa função desde que me conheço por gente, uma lição do economista, me dando responsabilidades. O meu bom pai conferia o meu trabalho matutino quando eu não estava olhando.    

            — Eu nem sabia que tínhamos assinado esta preciosidade, menos ainda que a senhorita assina textos neste pasquim alvissareiro! — Incisivo disse o meu progenitor, para depois um álgido sorriso lhe brotar na cara.

            — E não assinamos, eu recebo de graça e é uma publicação restrita! — Disse eu, ainda de pé, a minha alma saiu do meu corpo nessa hora.

            — Terá sequência? Ou vai parar por aqui? Fiquei curioso, meu anjo bom! — Disse isso e me convidou para sentar e eu querendo terminar o meu dia em paz. Sentei-me e a curiosidade me bateu forte, como a coisa terminaria e como eu iria responder a uma pergunta, que eu não tinha respostas alguma. Então decidi improvisar.

            — O conclave das entidades sobrenaturais, se deu em uma gruta, não muito longe do lago. As iniciadas, prestaram reverências a rainha e o resto o senhor já sabe o que aconteceu... 

            — Eu sei? — Disparou o meu progenitor, não disfarçando o mau humor.  

            — Eu disse que o senhor já sabe, mas no mundo das belas-letras temos os finais em aberto, são finais onde as respostas quem dá é o leitor. Mas hoje como tenho a melhor das audiências e posso sussurrar o final, somente para melhor das audiências. O financista teuto, Julius Karl Gross, se reuniu na capital, para tratar dos efeitos e possibilidades da grande guerra, que se iniciava no velho mundo. Foi de veleiro, porque não queria se expor olhos curiosos, reunião terminada, na volta para casa, o austero homem de negócios é avisado do falecimento misterioso, da esposa Margarida Buerger Gross, conhecida e reconhecida pintora, fotógrafa, poetisa e aventureira. Entre idas e vindas depois do infortúnio, ele conhece a jornalista Frederica Blank, a rainha renascida-mor nas águas de Dagon, se casa com ela e tem filhos e filhas. Agora as irmãs cultistas da jornalista, renascidas nas águas de Dagon, elas com identidades novas, não demoraram para ter filhos e filhas e resto...

            — Não hesite, filha querida! — O humor do economista e meu progenitor estava curioso, eu estava cansada e com sono.

            — O culto se infiltrou ao longo das décadas seguintes infiltrando nas elites da sociedade! — Terminei assim aquela marafunda, levantei, sem resistências tirei a minha revista das mãos do meu progenitor. Iria para o meu quarto, quando a voz do economista me obrigou a me virar.

            — Gostei do texto publicado e mais ainda do Gran finale particular e mais ainda que tenha ficado de fora desta marafunda e eu gostaria que da próxima vez de ter a possibilidade de ler os textos antes de serem publicados da grande escritora que tenho aqui em casa! Boa noite minha filha e durma bem!

            — Durma bem papaizinho querido! — Disse isto e fui dormir. 

 

Fragmento do livro: Do diário de uma louca, texto de Clarisse Cristal, poetisa, contista, novelista e bibliotecária em Balneário Camboriú, Santa Catarina.

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