Por Samuel da Costa (Itajaí, SC)
Pegar
o trem monotrilho foi uma opção imposta pela conveniência do momento, um
transporte rápido, barato e superlotado, mais que perfeito, para se tornar
invisível, se perder em meio à multidão dissoluta. Então Aurora, preferiu
embarcar em uma subestação, não muito longe do apartamento onde ela mora. Subir
a pequena escadaria, não pegar o elevador, foi uma opção pessoal, a
programadora de computadores, estava adorando experimentar a quebra de rotina.
Acostumada a trabalhar em casa, fazia tempo que ela não experimentava a
liberdade, de andar sozinha e em plena luz do dia em meio as massas em um dia
de outono.
Pôr a mão
esquerda no leitor biométrico e experimentar as luvas de tecido digital e
verificar que elas funcionavam de fato, ela mesmo tinha escrito as linhas de
programação da peça bélica. E Aurora, entrou sem problemas no sistema integrado
de transporte público individual e coletivo, ela poderia usufruir de uma gama
variada de veículos de massa e individual. A pequena subestação de trem estava
vazia, não havia ninguém naquele início de manhã outonal. Aurora, passa por um
policial uniformizado, o agente do aparato de segurança, olha para a
programadora, bate continência. Silencioso o trem monotrilho, para na estação
de subestação e Aurora adentra no veículo, que estava vazio, a programadora de
computadores prefere não ocupar o assento privativo que tinha direito e ficar
de pé. E não demoraria muito aquela pequena digressão, rumo ao desconhecido se
iniciar.
E o
trem monotrilho, dei partida e ganhou velocidade, rumou para a cidade vizinha,
em uma pequena viagem de linha direta, então uma música passa a ser executada,
inundando o vagão do trem, era uma antiga, conhecida e popular sonata
escandinava, gélida e monótona. E Aurora, se perdeu em si, ao olhar pela janela
e ver a paisagem que passavam em alta velocidade e o ela sente o estomago se
embrulhar. A programadora de computadores, então, leva o dedo indicador à
orelha esquerda.
— Gaya meu bem, ligue o módulo de vigilância e alerta total! — Disse
Aurora para a Inteligência artificial.
— A senhora quer mesmo quebrar o protocolo? — Perguntou Gaya, a voz
álgica e robótica, ecoa na mente da programadora de computadores, por alguns
segundos apenas.
— Só
se vive uma vez, meu anjo bom! — Surrou Aurora, parecia confidenciar um segredo
constrangedor para uma pessoa amiga.
Aurora escutou um leve zunido, uma estática e um mapa com o itinerário e
horários se projeta na lente de contato da programadora de computadores,
alertas e protocolos de segurança e a patente que ela estava usando naquele
dia. A patente de investigadora de primeira classe, agente de campo em
atividade secreta de rastreio. Detalhes atômicos de onde do destino, informes
sobre os agentes de segurança ativos, agentes infiltrados e as células
criminosas ativas, informantes e agentes infiltrados. Modelo rastreio informa
os detalhes do elemento a ser encontrado. As luvas de tecido digital, nas mãos
de Aurora apertaram e esquentaram, os informes das ferramentas das luvas
surgiram na janela projetada nas lentes de contato. As botas de cano alto nos
pés de Aurora, se auto ajustaram, apertaram e esquentaram, o informe deu conta
dos limites do que os calçados poderiam fazer. As manoplas nos antebraços foram
ativadas e as especificações e recomendações também foram informadas. Aurora,
tinha escrito as linhas de códigos das peças e ajudado nas especiações na
fabricação de cada uma daqueles artefatos.
—
Algo mais agente investigadora de primeira classe? — Perguntou Gaya e um tom
ameno!
— Por
hora não! E durma bem, minha querida! — Disse Aurora, desligando a Inteligência
artificial. Mais uma recomendação que ela mesma tinha feito, quando entregou os
projetos. Aurora estava orgulhosa do que tinha acabado de ver.
A
programadora de computadores, sente o trem monotrilho acelerar e pensar que a
curta viagem, estava para acabar, olha para a janela e vê manchas amorfas
devido à alta velocidade. Aurora, então perde a noção do tempo e do espaço,
olha para o vagão vazio e deseja, brevemente, a possibilidade de ter alguém
naquele ambiente. Quis ativar a inteligência artificial e mudar de ideia,
somente espero que a coisa todo se estabilize. E o trem monotrilho acelera,
mais e mais e Aurora olha para a janela e vê borrões e manchas de cores
variadas, alguma coisa está errada logo ela pensou. A viagem do entre cidades,
era para ser bem curta, pois aquela linha direta, sem paradas, a programadora
de computadores, reluta em usar a manopla, para ver o que estava acontecendo.
O trem monotrilho desacelera e para, uma voz de mulher anuncia o
ponta de chegada, a porta se abre e Aurora se prepara para sair do vagão,
quando uma multidão adentra pela porta. A programadora de computadores se
aperta em meio a massa amorfa e sai do vagão. A subestação de trem estava
lotada de pessoas de todas as classes, gêneros, etnias e raças. As lentes de
contato nos olhos, da programadora de computadores, fazem as leituras faciais
dos indivíduos. O escaneamento, deu conta das informações pessoais dos
indivíduos a frente da programadora. Aurora, sente dores de cabeça e os
olhos ardem, a Aurora pensa em desativar o módulo de rastreio, mas não o fez. E
ao andar pela subestação de trem, uma vendedora ambulante chama atenção da
programadora de computadores, uma pequena mulher de aparência andina de idade
indefinida, ela carrega um fina varra cabideiro, com chapéus e óculos escuros.
O escaneamento facial, deu conta que era uma indígena Aymara, sem passagens
registradas nos serviços de segurança e na agência de imigração. Aurora decide
comprar um chapéu para a mulher andina e então escolhe um feminino chapéu
australiano, da mesma cor do seu sobretudo que usava. A vendedora ambulante
ergueu um pequeno espelho e Aurora viu o seu rosto alvo e pensa que ainda falta
algo e a vendedora oferece um par de óculos de sol preto com finos aros
redondos. A vendedora ambulante, ergue um cartão de visitas, com um código de
pagamento, as lentes nos olhos da programadora de computadores, lê o código de
pagamento e um apito soou alto na máquina de pagamentos no bolso da Aymara. As
duas trocaram sorrisos e se despediram com os olhares.
Ao
descer as escadarias da subestação de trem monotrilho, Aurora se depara com uma
avenida apinhada de gente, eram vendedores ambulantes, artistas de rua, monges,
pastores religiosos, trabalhadoras e trabalhadoras do sexo, pequenos
traficantes, vendedores ambulantes e moradores de rua e músicos com os seus
instrumentos executando as suas obras. Lojas com artigos populares ladeadas com
lojas de departamentos, serviços variados. Aurora olha para cima e vê as
passarelas envoltas em tubos, interligando grandes prédios. Obra do arquiteto e
urbanista Grege Sanders, prédios inteligentes, residências e comerciais
interligados, uma solução apresentada e executada pelo ousado arquiteto e
urbanista. Solução apresenta e implantada, depois de sucessivas ondas de
criminalidades, intempéries climáticas, migração e emigração e as avalanches
tecnológicas. Então as pessoas passaram a trabalhar e estudar em casa, a
enclausurarem, uma classe média e uma classe média alta. As ruas, se
transformaram em subsolos da sociedade, não que as classes abastadas deixaram
de circular nas ruas, pois por motivos variados, por não se adaptarem àquele
modo de vida, ou mesmo por questões profissionais. O que Aurora passa a pensar,
àquela hora, que na prática, era que a vida de fato ocorria no primeiro piso da
sociedade, enquanto cordeiros assustados viviam as suas vidas em uma falsa
sensação de segurança.
E a
programadora de computadores, não queria percorrer aqueles poucos metros a pé,
até a rua Alcebíades Vanolli, a tal fadada rua L, para a reunião que estava
marcada com o obscuro engenheiro mecânico, o mago da robótica, o doutor Henton.
Mas a realidade se impõe e Aurora, tentar a sorte, se voluntariou para uma
missão e a missão teria o seu término. Ao percorrer uns poucos metros o alarme
soou alto no ponto eletrônico no ouvido de Aurora. Então uma sirene dá um
alerta em um estrondo, a avenida superlotada, o mar de gente em frenesi,
procura abrigo nas calçadas e a avenida ficou deserta. Aurora, olha para cima e
vê um guarda pretoriano, no alto de uma das passarelas, se equilibrando em cima
do tubo. As lentes de contato, nos olhos da programadora de computadores, se
autoajustaram e foca no agente de segurança, a base de dados informa, que é um
agente de alta patente em um uniforme de combate. A programadora de
computadores, olha para o piso e vê um carro antigo, sem placas, o carro era um
Mary Shelley, um carro montado a partir de vários outros carros. As lentes de
contato, escanam o interior do carro hibrido ilegal e percebeu quatro elementos
lá dentro. A leitura facial, informa que são perigosos elementos facionados,
membros de uma rede criminosa extensa.
O
oficial de alta patente quedou do alto do tubo da passarela, Aurora percebe o
ato em câmera lenta, um campo de força se forma abaixo dos pés do homem da lei.
Que se expande conforme ele se aproxima do chão. O oficial ganha velocidade
enquanto o veículo se aproxima, para de repente e quando os dois corpos se
alinham. O homem da lei, ganha velocidade e queda em cima do capô do veículo em
fuga. Uma avassaladora onda magnética, se expande e atinge os transeuntes nas
calçadas e eles vão ao chão. O oficial, que se afunda no capô do veículo,
membros da guarda convencional, fortemente armados, cercaram o veículo e
renderam os ocupantes do veículo de fuga. O perímetro da ocorrência é isolado
pelas forças de segurança, os ocupantes das calçadas se recompõem e voltam a
rotina como se nada estivesse acontecendo. Aurora, processa a cena, os dados
são enviados para a inteligência artificial.
Um
riquixá motorizado, que passa ao lado de Aurora, a programadora de computadores
levantou a mão, o pequeno veículo elétrico para, a porta se abre e Aurora
adentra no veículo. A programadora de computadores lembrou da manobra ousada do
oficial de alta patente, uma manobra que ela mesmo criou e recriou várias vezes
na realidade simulada.
—
Para onde vamos madame? — Perguntou o motorista do riquixá, um homem alto de
pele morena e muito bem vestido.
—
Vamos para rua Alcebides Vanolli! — Respondeu Aurora secamente e aponta para
frente.
O
motorista nervoso, acelerou o veículo e passou ao lado da área interditada
pelas forças de segurança, Aurora vê os quatro ocupantes do veículo de fuga,
que estavam atordoados, com as mãos na cabeça. As lentes de contato nos olhos
registraram a cena.
Fragmento
do livro: Sono paradoxal, texto de Samuel da Costa, poeta, novelista e contista
em Itajaí, Santa Catarina.
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