sexta-feira, 1 de dezembro de 2017

MINHA HORTA ERA UMA PISCINA

                   Por Urda Alice Klueger (Enseada de Brito, SC)
                                                                     Para Onice Sansonovicz

                                    Pois é, minha horta era uma piscina que um dia foi enchida de terra. Era terra magra, tirada do âmago de algum morro amarelado, e que eu fui alimentando, alimentando, com todas as cascas e talos, e cascas de ovos, quase tudo que sobrava da cozinha. Faz um ano que estou aqui, e no outono, quando me pus a dar uma virada naquela terra, vi que ela engordara, criara uma camada de outra cor por conta dos meus cuidados. Foi virar e nasceram milhares de pezinhos de trevo que deixei crescer por algum tempo, antes de tornar a virar a terra.
                                    Estava cheia de planos. A ideia inicial era fazer uma horta tipo mandala, como aprendi com o MST no tempo das aulas de doutorado com o querido professor Dr. Jorge Montenegro – até comecei a tentar, no entorno de um pé de tomate que nascera espontaneamente quase lá no meio da mesma. Cavouca daqui, semeia dali, põe mudinha mais adiante, e fui vendo que a área era pequena para uma horta em mandala, que as plantas acabavam se misturando mais que o esperado.
                                    Fui então para o modelo milenar e sábio dos meus vizinhos Guarani, que vivem do outro lado do morro aonde vivo – e comecei a plantar tudo no meio de tudo, deixando sempre bastante mato e capim entre as diversas plantas e espécies – meu, só valeu!
                                    Vou contar como estão as coisas agora, um ano depois que aqui cheguei. Sem usar nenhum agrotóxico, a não ser um pouquinho de sabão em pó quando deu pulgão num pé de couve, minha horta está uma beleza! Tenho que contar que nos fundos da casa, numa área com menos sol, tenho como que uma continuação dela, onde também tenho misturado tudo a tudo e a todos os capins. Saí de bloquinho na mão para anotar e poder contar para vocês tudo o que se passa na minha horta, e vamos aos resultados:
                                    Estou colhendo em abundância tomates grandões e tomatinhos cereja, couve-manteiga, alfavaca, orégano, espinafre... e se quiser, boldo para o chá, algumas flores. Apanhei quanto à salsinha: não sabia que havia que replantar um pé que existia, e deixei que acabasse uma safra para voltar a plantar. Em compensação, nos fundos da casa arrisquei semear abóboras no verão passado e deu que foi uma beleza – já as comi!  Em desenvolvimento tenho novo pé de abóbora, cebola de cabeça, viçoso e lindo milho, um espraiamento de batata doce que não sei o quanto crescerá ainda, dois abacaxis que arrisquei plantar para ver no que dava, pimentão, rabanetes, amorinha silvestre, diversos novos pés de mamão – porque já havia um pomar farto, quando cheguei aqui – inhame, chuchu e acho que um pé de melancia. Os passarinhos se encarregaram de semear alguns pés de cereja e algumas outras coisas inesperadas, como uma mudinha de pitanga, e minha vizinha Maria Antônia me deu uma muda de araçá que também vingou. Fiz um experimento com feijão preto para ver o que acontecia e já colhi - vou plantar mais. Tudo isso está misturado entre si e dentro de muito mato e capim – quando aparecem os predadores, não se dão ao trabalho de entrar muito na piscina e comem o que primeiro encontram. Os grandes inimigos são a seca e os caramujos africanos, e algumas vezes esses últimos já me pegaram desprevenida – para esses bichinhos sem inimigos naturais aqui no nosso continente, ponho uma certa isca ao redor da piscina que impede que eles cheguem ao meu tesouro.
                                    Antes de vir para cá disse à minha amiga Onice Sansonowicz, historiadora lá em Itajaí, que ainda iria convidá-la para a festa da colheita. Onice, comece a preparar o vestido para vir festejar!

                                    Sertão de Enseada de Brito, 29 de outubro de 2017.

                                    

                                    

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