Por Urda Alice Klueger (Enseada de Brito, SC)
Para
Onice Sansonovicz
Pois é, minha horta era uma piscina que um dia foi enchida
de terra. Era terra magra, tirada do âmago de algum morro amarelado, e que eu
fui alimentando, alimentando, com todas as cascas e talos, e cascas de ovos,
quase tudo que sobrava da cozinha. Faz um ano que estou aqui, e no outono,
quando me pus a dar uma virada naquela terra, vi que ela engordara, criara uma
camada de outra cor por conta dos meus cuidados. Foi virar e nasceram milhares
de pezinhos de trevo que deixei crescer por algum tempo, antes de tornar a
virar a terra.
Estava cheia de planos. A ideia
inicial era fazer uma horta tipo mandala, como aprendi com o MST no tempo das
aulas de doutorado com o querido professor Dr. Jorge Montenegro – até comecei a
tentar, no entorno de um pé de tomate que nascera espontaneamente quase lá no
meio da mesma. Cavouca daqui, semeia dali, põe mudinha mais adiante, e fui
vendo que a área era pequena para uma horta em mandala, que as plantas acabavam
se misturando mais que o esperado.
Fui então para o modelo milenar e
sábio dos meus vizinhos Guarani, que vivem do outro lado do morro aonde vivo –
e comecei a plantar tudo no meio de tudo, deixando sempre bastante mato e capim
entre as diversas plantas e espécies – meu, só valeu!
Vou contar como estão as coisas
agora, um ano depois que aqui cheguei. Sem usar nenhum agrotóxico, a não ser um
pouquinho de sabão em pó quando deu pulgão num pé de couve, minha horta está
uma beleza! Tenho que contar que nos fundos da casa, numa área com menos sol,
tenho como que uma continuação dela, onde também tenho misturado tudo a tudo e
a todos os capins. Saí de bloquinho na mão para anotar e poder contar para
vocês tudo o que se passa na minha horta, e vamos aos resultados:
Estou colhendo em abundância
tomates grandões e tomatinhos cereja, couve-manteiga, alfavaca, orégano,
espinafre... e se quiser, boldo para o chá, algumas flores. Apanhei quanto à
salsinha: não sabia que havia que replantar um pé que existia, e deixei que
acabasse uma safra para voltar a plantar. Em compensação, nos fundos da casa
arrisquei semear abóboras no verão passado e deu que foi uma beleza – já as
comi! Em desenvolvimento tenho novo pé
de abóbora, cebola de cabeça, viçoso e lindo milho, um espraiamento de batata
doce que não sei o quanto crescerá ainda, dois abacaxis que arrisquei plantar
para ver no que dava, pimentão, rabanetes, amorinha silvestre, diversos novos
pés de mamão – porque já havia um pomar farto, quando cheguei aqui – inhame,
chuchu e acho que um pé de melancia. Os passarinhos se encarregaram de semear
alguns pés de cereja e algumas outras coisas inesperadas, como uma mudinha de
pitanga, e minha vizinha Maria Antônia me deu uma muda de araçá que também
vingou. Fiz um experimento com feijão preto para ver o que acontecia e já colhi
- vou plantar mais. Tudo isso está misturado entre si e dentro de muito mato e
capim – quando aparecem os predadores, não se dão ao trabalho de entrar muito
na piscina e comem o que primeiro encontram. Os grandes inimigos são a seca e os
caramujos africanos, e algumas vezes esses últimos já me pegaram desprevenida –
para esses bichinhos sem inimigos naturais aqui no nosso continente, ponho uma
certa isca ao redor da piscina que impede que eles cheguem ao meu tesouro.
Antes de vir para cá disse à
minha amiga Onice Sansonowicz, historiadora lá em Itajaí, que ainda iria
convidá-la para a festa da colheita. Onice, comece a preparar o vestido para vir
festejar!
Sertão de Enseada de Brito, 29 de
outubro de 2017.
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