Por Antonio Francisco de Paula (Brasília, DF)
Velha mala de garupa
De pano de colchão
Herança da tradição
Da gauchada de antanho
Que a ferro branco e estanho
E lança firme nas mãos
Defenderam este chão
Dos valentes castelhanos
Rude trapo de riscado
Da nossa gente simplória
Costurado pela história
Com a linha da esperança
Que ficaste nas estâncias
Pendurada nos galpões
Abarrotada de emoções
De saudades e lembranças
Toda vez que me deparo
Com uma mala de garupa
Já vejo o velho Chicuta
Oitavado no bolicho
Contente matando o bicho
Num martelo retovado
E depois comprando fiado
Os apetrechos de serviço
Espoleta ,chumbo grosso
Fumo em rama ,rapadura
Uma meia de canha pura
Pra espantar a solidão
Erva buena pro chimarrão
Pavio e pedra pro isqueiro
Charque gordo pro carreteiro
E querosene pro lampião
Café, açúcar mascavo
Tecido de chita e de brim
Mata piolho,criolim
E glostora pras melenas
Cabrestilhos pras chilenas
E como sempre de costume
Um frasquito de perfume
Pra agradar dona pequena
Socando tudo na mala
Metade pra cada lado
E saindo meio emborcado
Levando as compras nas costas
Atalhando pela encosta
Por dentro de uma picada
Chegando dando risada
Na sua velha palhoça
Quantas e quantas vezes
Andastes entreveirada
Em rinhas e carreiradas
Nos reboliços de venda
Onde o índio ventena
Te enrodilhava no braço
Pra se livrar dos puaços
Dos retalhos de chilenas
Viajando presa nos tentos
No recavém dos arreios
Acompanhando os tropeiros
Os vaqueanos andantes
Os caixeiros viajantes
A indiada campeira
Aparceirando as parteiras
E as benzedeiras de dantes
Sacolejando nos fueiros
No assoalho das carroças
Levando a bóia na roça
Para o humilde camponês
Que todo final de mês
Tapado de judiaria
Se bandeava a lá cria
Pro armazém do português
Num joguito de osso
Ou carteado de baralho
Na beira de um borralho
Numa roda de chimarrão
Nos fandangos de galpão
Nos bailes de cola atada
Nos tragos e porfiadas
Nas pulperias do rincão
Nas domas e gineteadas
Tiros de laços e castração
Nos dias de marcação
De esquilas e carneadas
Nos bolichos beira de estrada
Atirada pelos balcões
Amadrinhando os peões
Nas fuzarcas animadas
Lendária mala gaudéria
Peregrina dos pagos
Tu és o maior legado
Que carrego na memória
Da indiada de outrora
Que vagueavam sem assombro
Contigo atirada nos ombros
Carregando a nossa história.
Sobre o autor:Antonio Francisco de Paula nasceu no povoado de Caputera, município de Itapeva, em Santa Catarina, na fronteira com o Estado do Paraná. Neto de gaúchos, é poeta e declamador premiado nos torneios dos Centros de Tradições Gaúchas do Planalto Central.É autor do livro de poesias gauchescas MEU AVÔ, MEU MESTRE, publicado em 2005. Inaugurou o primeiro número do CERRADO CULTURAL, em 27.jul.2008.
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