Por Leandro Bertoldo Silva (Padre Paraíso, MG)
Maternidade
era uma das palavras esquecidas no seu dicionário. Era fácil demais para
algumas pessoas pensarem nisso, não para ela, de corpo perfeito e vida em
liberdade. Por isso, seu ventre crescido estava na contramão de todos e
recordava sua rejeição. Daquele invólucro perfeito, ficariam cicatrizes, marcas
que sobreporiam ao efemeramente físico e atingiriam sonhos interrompidos.
Dejanira
era mulher do mundo. Esse era o resguardo que nunca pensou em abandonar, nem
sequer substituí-lo por um momento que fosse. Sentia-se sem vida, apesar da
vida que crescia dentro de si. E, agora, mesmo sendo duas, teimava em sua
solidão. O tempo passava, mas não levava a angústia que aumentava a cada dia
que a circunscrição de seu estado apontava. Já dividia seu alimento, mesmo sem
sua permissão, como seria dividir o resto? Era o que pensava desolada e
inquieta. Só havia um jeito: acabar logo com aquilo. Porém, o feto crescido já
era uma criança e, antes mesmo de pensar em qualquer outra coisa, de seu corpo
redondo começou a emergir um líquido que, ao rebentar da bolsa, jorrou junto
com uma sensação indefinível que a urgência do momento não permitiu reflexões.
Elas só vieram quando, já com a criança liberta deitada em seu peito em meio
aos médicos, começou a cantarolar uma cantiga de ninar no mesmo momento em que
seus seios saciavam o filho que calava a ouvir.
Seus
olhos recém-maternos se iluminaram, e o coração, que antes rejeitava, agora
acalentava e se punha a descobrir uma desconhecida impressão felina e
protetora.
A
mulher do mundo sem fronteiras não sabia se o choro convulso que irrompia
naquele instante era amor ou remorso, talvez fossem os dois. Aquele momento
eternizado na música que embalava sua criança fazia pensar: afinal, é a mãe
quem dá à luz um filho ou é o filho que faz nascer a mãe?
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