Por Humberto Pinho da Silva (Porto, Portugal)
Os
meus amigos de infância, resumem-se a meia dúzia. Dessa meia-dúzia, destacam-se
apenas três:
Não
são propriamente de infância, mas de adolescência. Um, que me dava grande
prazer, era moço, baixo e folgazão. Amava calcorrear as ruas e ruelas da antiga
cidade, em busca de curiosidades, velharias, e casas brasonadas.
Conheci-o
quando fazia preparatórios. Fomos colegas de turma. Pertencia à aristocracia,
mas nada tinha de velha e empertigada fidalguia. Gostava de prosear sobre
famílias de antanho, da história da cidade, e era versado em heráldica.
Éramos
íntimos e trocávamos intimas confidências.
Terminado
o preparatório, vispou-se…Escreveu-me, ainda, inflamados e sorumbáticos
aerogramas, da Guiné.
Tornei-o
a descobrir, doente, envelhecido, ligeiramente surdo, casado. Continuava o
mesmo rapazinho prestável. Digo: “continuava”, porque faleceu. Ainda
rezo, pungidamente, pela alma.
Os
outros ou as outras, eram meninas:
Uma,
era criança. Afeiçoou-se a mim, e eu a ela. Cresceu. Tornou-se formosa
menina-moça…A fértil imaginação, refervia. Iludi-me. Queria divertir-se, e pela
certa chasqueava a minha ingénua e platónica afeição.
A
última, era mulher feita, graciosa, de faces rosadinhas, ameninadas, corpo de
gazela e inteligência arguta.
Certa
tarde ensolarada, saímos juntos. Acanhado, não lhe soube revelar o meu casto e
pudico sentimento.
A
mocinha arrufou, receando ficar para titia. Enfastiou-se.
A
amizade não finara; ainda bordou com esmero, delicada toalhinha de linho, a
algodão azul, cor romântica e significativa de miosóte, quando a amizade já
esfriava…
Já
que estou em época de confidências, tudo devo revelar, para que nada fique
encoberto.
A
minha adolescência, e a própria infância, ficaram enrodilhadas em manto negro,
negríssimo, que estigmatizou- me para sempre.
Deixou-me:
receoso, triste, medroso. Certo é, que houve centelhas inefáveis. Períodos, que
fugazmente olvidaram as amarguras do infortúnio… Mas, extinguiam-se, como
estrelinhas doiradas, que se desprendem, esvoaçando, enxameadas, do braseiro da
vida.
A verdadeira
felicidade – se há plena felicidade, – encontrei-a na velhice; no prelúdio do
acaso, quando os derradeiros raios ensanguentados do crepúsculo, já desfalecem,
na espessa cerração da noite negra, que sinto ou pressinto avizinharem-se, sem
o desejar.
Dou
graças a Deus, pelas bênçãos recebidas, assim como Sua divina proteção. Talvez
imerecida…
Todos
tentamos esconder, e eu não sou diferente, – as horas sombrias, que enlutaram a
existência, receando, que os mundanos, se divirtam com nossas malogradas
fraquezas.
Mas,
não consigo silenciar, todas os segredos – pelo menos, os mais fúteis, – por isso,
confidencios… em papel….
Recordar
é viver; mas recordar, o passado, que passou, por vezes, faz-nos chorar. Chorar
baixinho…para que não nos ouçam e não nos vejam…
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