sexta-feira, 1 de abril de 2022

EM NEGRAS PALAVRAS

Por Samuel da Costa (Itajaí, SC)

Para Miguel Maria da Costa e Aristide Souza Maia

 

Em New Orleans, os sacos de algodão estão cheios, pois já passa das onze horas da manhã. O sol a pino não intimida aquele exército de corpos reluzentes. São Deuses de Ébano a cantar uma doce canção. Que para o povo que está na outra margem do oceano de desigualdade ainda não aprendeu a entoar.

Indo mais ao sul, no Rio de Janeiro, bem próximo à praia, um bater de palma encanta quem passa por perto, corpos elásticos voam ao som de um instrumento musical rústico.

Em África em um país, cuja língua oficial veio a muito da Europa, imposta pelos colonizadores. Um jovem fortemente armado e uniformizado na selva sonha com um futuro melhor, e vê seu país livre do domínio do colonizador. Diante de um regimento estava impaciente tentando articular as palavras em um discurso trêmulo.

No sul do Brasil um jovem artista negro troca o dia pela noite ao cumprimentar os presentes. Está lançando seu primeiro livro de poemas, ninguém parece notar o fato, pois estão todos chocados com a dureza das palavras proferidas.

Um tripulante negro de um navio mercante, que cruza os oceanos para e recorda da infância e juventude em uma ilha perdida nas Antilhas. E no em quem ele teve que deixar para trás, para cruzar a imensidão do mar. Conhecer o mundo era um dos seus sonhos, ainda jovem sonhava em rodar o mundo e conhecer pessoas. Negro como a noite e de origem humilde sabe que jamais comandaria o navio em que trabalha.

Um jovem negro de um país desértico que queira ver a neve pela primeira vez. Agora sentado à mesa de um café, ao norte no velho mundo no leste europeu, se espanta com a forma rude como é tratado a fazer seu pedido.


Samuel da Costa é cronista e funcionário público em Itajaí, SC.

Contato: samueldeitajai@yahoo.com.br


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