Resguardada do ardor da tarde
sob frondoso castanheiro, na cercania de carriça transmontana, a velhinha fia.
Tem o rosto sulcado pela goiva
do tempo. Olhos apagados, lábios finos, boca desdentada, e tez crestada, da cor
de centeio.
Fia; e o fuso:
gira...gira...gira... pressionado pelos descarnados dedos.
Foi moça fagueira; esbelta, de
farta cabeleira calamistrada e viçosa face da cor de nácar.
Casou… Foi mãe.
Criou filhos, que abalaram...
Todos partiram: uns, para o
Céu; outros, em demanda de vida melhor...
Ficou; mergulhada em saudade e
cuidados de quem a deixou.
De tempo a tempo, telefonam,
escrevem...
Prometem interná-la num lar...
Daqueles que guardam pais e
mães, que deixaram de serem prestáveis.
Cuidou dos filhos com esmero: ajudou-os
a darem os primeiros passos; a comerem; à mesa; aparou-lhes a baba viscosa, que
escorregava do beiço; enxugou-lhes o húmido nariz; branqueou-lhes a roupa
enegrecida pela traquinice; passou horas de angústia à cabeceira do berço...
Os meninos eram tudo, e tudo
era para eles.
Agora, é a mãe que carece de
mão amiga: quem a ampare; quem cuide; quem lhe lave a veste enodoada; quem lhe
apare as unhas endurecidas; quem a desvele com carinho.
Para que nada lhe falte.
Mas os filhos não têm
disponibilidade...
Olvidam, que chegou o tempo de
retribuírem; esquecem-se de pagarem - os cuidados, os carinhos que receberam...
Meditando, a velhinha fia.
E o fuso: gira...gira..gira...
Pelos desgastados olhos,
desenrolam-se cenas amorosas, recreações pueris, que a memória guardou, com
amor.
Agora só Deus permanece...
Só Ele ficou...
Os gerados pelas suas entranhas
esquecem-se, que: a felicidade, o diploma, a riqueza que gozam, é fruto daquela
velhinha, que junto ao carriço, arrimada ao secular castanheiro: fia... fia...
fia...
Zagaziantes lágrimas de
saudade, docemente escorem pela face encarquilhada:
-" Coitados! Têm muito
que fazer...A culpa é das mulheres... trabalham muito. Como gostava de estar na
companhia deles!…”
Leve sorriso amoroso,
alastra-lhe pelo rosto tisnado...
E o fuso: fia...fia...fia...
Parabéns pelas verdades em poesia.
ResponderExcluirAbraço. Manoel Ianzer
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