sexta-feira, 1 de março de 2024

PONTO NULO NO CÉU: O QUINTO ELEMENTO

Por Clarisse Cristal (Balneário Camboriú, SC)

 

          A escuridão imperava, na estrada vicinal, a viela estava tomada por policiais militares e policiais civis, ao longe jornalistas, em vão, tentam tirar as suas fotografias e produzir vídeos, pois as máquinas digitais, não estavam funcionando na plenitude, poucos aparelhos eletrônicos funcionavam, a bem da verdade.

        Uma estranha ilha de luz, era aquele trecho da viela, a poucos metros da bem iluminada avenida movimentada, repleta de lojas de departamentos e escritórios. A viela, uma rua residencial, bem tranquila, ao final da mesma tinha um pequeno rio, nas duas margens opostas, haviam pequenos atracadouros, para pequenas embarcações e lanchas.

         — Tu engoliste, o papinho escabroso, daquela gótica esquisita? — Falou o investigador Mattos Gama, sem olhar para o tenente Bastos, pois o policial civil estava com os olhos ocupados.

        — Claro que não, tu viste o tal vídeo da madame bruxa? Alias! Qual o gótico ou gótica que não é esquisito? — Disse o tenente Bastos.

       — Assisti sim, e está na perícia sendo analisado, fiz uma cópia pra tu, é claro! — Falou o investigado e perguntou — Adivinha quem é a subcelebridade, que figura no filmete da madame bruxa?

       — Lucas Ribeiro, vulgo Luquinhas das dunas, vulgo Liquinho, vulgo Rato e por aí vai! — Respondeu o tenente da polícia militar.

       — Espertinho, ligou os pontos então! Começamos então a reconhecer um padrão aí, o marginal encontrado morto, com o pescoço quebrado, depois de um pequeno voo solo no submundo do crime! — Concluiu Mattos Gama, ainda com o olhar perdido, para a cena do crime.

        — Mas, deixemos isto para depois e me diz olhando este quarteto aí em cima? Amigo investigador da polícia civil e me diga qual é o teu olhar? — Perguntou o tenente da polícia militar, olhando para os corpos sem vida.

         — Posso dividir em múltiplos olhares, meu caro Watson. O meu olhar, a princípio, eu vejo a simetria, a equidistância perfeita, no vocabulário dos poetas clássicos e engenheiros civis. — Respondeu, o investigador da polícia civil e continuou — Estão com os braços em posição de Cristo e estão simetricamente equidistantes entre si, os corpos estão quentes ainda, na verdade em chamas.                      E aposto os fios da minha barba, que estão embranquecendo, que os relógios, que os nossos presuntos estão usando, pararam há três horas passadas. Mas isso tudo pode ser medido e analisado, agora mesmo. Mas os corpos, assim vai dizer o relatório do legista, que eles foram atingidos por uma onda, de deslocamento do ar, devido à explosão de uma bomba, que os projetaram contra uma parede. É isto, mas o que não se vê tenente Bastos? O que nem eu, nem o legista e mais ninguém pode ver agora mesmo?

           — Diante destes palhaços neonazistas mortos, eu posso te dizer algumas coisas, concordo contigo em gênero, número e grau. Eu só posso dizer, que eles foram interrompidos, inesperadamente, pois vejo sangue nos coturnos e hematomas nos nós dos dedos. E foram interrompidos, quando massacraram alguém, digo que é um pequeno coletivo, aposto. E com muita sorte, é bem possível que estejam em algum pronto atendimento, não muito distante daqui. E com as roupas cheias de evidências, dos crimes desses caras aí em cima. Mas, o que nem eu, nem o legista e mais ninguém pode ver agora mesmo? Simples, meu querido! Para onde eles estão olhando? E eu te respondo, para o quinto elemento, meu querido Sherlock Holmes!

           O tenente Bastos, chamou um policial militar, com ambas as mãos, pois os rádios não estavam funcionando. O agente da lei, se aproximou bem rápido, Bastos falou ao pé-de-ouvido do homem, o soldado saiu e voltou com uma escada portátil, retrátil e pequena de metal com quatro degraus. O enorme tenente Basto, armou a pequena escada, subiu até o último degrau, o militar tomou cuidado, para não tocar nas grades do muro, ficou na altura dos corpos e os encarou com desprezo, estavam com os olhos vidrados. Com dificuldade, se virou, tirou do colete uma caneta laser vermelha e apontou para onde as vítimas estavam olhando. O tenente teve então a visão dos homens mortos.

        — Bastos meu caro, creio que tu acabaste de enxergar, o que nem eu, o médico legista e mais ninguém poderíamos ver com precisão, para onde estes bastardos estão olhando. Passe, por favor, o binóculo visão noturna, para o tenente Bastos. — Falou Mattos Gama, para um policial militar que estava atrás dele.

         O policial militar, de baixa patente, sem se mexer, jogou o objeto para o superior, que ainda estava nas escadas. Bastos se curvou, pegou o binóculo, levou até os olhos e ajustou o aparelho, que funcionava precariamente.

        — Mattos Gama, meu caro, eu acabo de encontrar o quinto elemento, por assim dizer. — O policial não tirou os binóculos dos olhos enquanto proferiu essas palavras. Ajustou o foco e aproximou ao máximo, o que o aparelho pode suportar.

         No alto da Torre Xoclengue, o álgido vento soprava, um pequeno bando de aves negras e vagas, circundavam um corpo sem vida. Mais tarde, soubesse que era o corpo de Oskar Boere, vulgo polaco, o líder local do grupo neonazista Misanthropic Division, da secção local do Batalhão Azov. Preso, em posição de cruz, por tiras feitas das próprias roupas, jazia com o pescoço quebrado, o rosto estava voltado para o chão, com os olhos abertos, como quem apreciava a cena, que se desenrolava lá embaixo.

         O policial militar, desceu da escada retrátil, salvou uma das imagens no cartão de memória auxiliar, do binóculo militar de visão noturna, tirou o cartão, colocou no compartimento no lado esquerdo do uniforme, quebrando o protocolo militar. Chamou Mattos Gama, que estava a poucos metros dele, o policial civil que notou a coisa, nem se importou com a quebra do protocolo. Os dois agentes da lei, foram até uma viatura da polícia civil, longe dos olhares atentos dos outros agentes da lei.

         — Vamos ver o que temos para hoje, meu amigo Sherlock Holmes! — Falou o tenente Bastos, o oficial militar pegou um tablete no porta luvas da viatura e conectou um cabo USB ao binóculo.

        — O campo magnético, está passando, se dissipando lentamente, como sempre acontece, soube disse assim que ajustei a Betty para ver a fuça do cretino, lá em cima.

        — Betty! Ora, tenente! O que há? Se apegando a estas novas tecnologias digitais, por fim? — Brincou o investigado Mattos Gama.

       — Não enche Mattos, tu sabes que sou um homem carente de amor e carinho! — Respondeu o tenente Bastos.

       O policial militar, demorou para ajustar os filtros do aparelho, os chuviscos da tela de cristal líquido, pareciam uma velha TV preto e branco de tubo. Para pôr a imagem com total nitidez, o policial militar levou a mão na tela para aumentar o foco, Mattos Gama, se antecipou e levou a mão ao aparelho e focalizou o rosto do cadáver. Eram uma batalha, de mãos e dedos para ver quem melhor mexia no pequeno aparelho digital postado, no capô da viatura.

        — Quase isto soldado...Ops tenente! — Disse de forma irônica o policial civil.

         — Pensei que queria ver o rosto do elemento, não me atrapalhe! — Devolveu o tenente da polícia militar.

       — Quase lá, quero ver o pescoço somente. Quero ver as lesões, de esganadura no pescoço do meliante. Veja tenente Bastos, as mãos leves e dedos finos e delicados de uma mulher. — Falou Mattos Gama apontado para o pescoço de Oskar.

        O aparelho mediu e tirou um molde de uma mão de mulher, que deixou gravíssimas lesões no pescoço do homem, postado no alto da torre. Das muitas inconsistências, tabeladas pelo aparelho, o que mais chamou a atenção, dos dois experientes policiais, foram os formatos da mão versus a pressão feita no pescoço da vítima. E outras inconsistências, mais precisas sugerem depois, das necropsias dos corpos, com os laudos do legista, mas era o esperado pela dupla de policiais.

         — De uma certa florista eu suponho! — Disse o tenente Bastos da polícia militar.

        — Não suponha nada, caro amigo e irmão de combate ao crime! Vamos nos ater aos fatos e deixar as suposições de lado, pelo menos no momento presente. Nada de supor e imaginar, e vamos aos fatos para depois supor, tal como esse cara seminu foi parar lá em cima? E depois como ele ganhou as marcas no pescoço. E por aí fora meu irmão de luta. — Disse Mattos Gama com pesar.

Fragmento do livro: Em dias de sol e calor, em noite de tempestades e frio, Texto de Clarisse Cristal, poetisa, contista, novelista e bibliotecária de Balneário Camboriú, Santa Catarina.

 

 

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