quarta-feira, 1 de maio de 2024

MAÊTICA: ARTHUR DIANTE DO ESPELHO

 Por Samuel da Costa (Itajaí, SC)

 

Há o despertar impermanente

Somente para te desnudar

Entre sedentas lágrimas de ébano

Trágicas carícias cósmicas

E abissais algozes desejos sonolentos

 

 

 

Arthur estava mudado, o que era de se esperar, depois de uma longa viagem, pois o jovem literato queria conhecer o mundo. Não os grandes centros urbanos do Novo mundo e da velha Europa. Arthur, o pretenso escritor, queria andar pelas escaldantes areias do deserto africano. Navegar e vislumbrar no azul do mar mediterrâneo, contemplar as milenares ruínas do oriente e do oriente médio e indo parar em cidades e ilhas perdidas no sudeste asiático. Depois conhecer a América Central, navegar pelo caribe e se perder no México.

Arthur conhecia bem, os grandes e médios centros urbanos de seu próprio país, as grandes paisagens interioranas, dos grandes estados e as agitadas cidades turísticas do litoral. Sempre em viagens de férias com a família, ou em excursões escolares e com amigos, idas a espéculos variados. Mas a sede da solitude, era grande, enorme a bem da verdade.

E, depois que perambular perdidamente, por terras distantes, aprender novos hábitos, aprender novos falares, outros idiomas, provar novos sabores, se embriagar com diferentes bebidas e se entorpecer, com diferentes alucinógenos. Se apaixonou, perdidamente, por diferentes mulheres de diferentes etnias e viveu rápidas aventuras.

Agora, Arthur estava de volta, tinha voltado para a bucólica cidade interiorana que o viu nascer e crescer. E como a volta para casa lhe doía no seu âmago, mais que profundo, ali não era mais a casa dele, ali era um outro lugar, um lugar desconhecido.

E Arthur em seu estúdio, o seu outrora amado local de trabalho, diante de um espelho. Ele teve um vislumbre de um tempo perdido, de uma vida que não era a dele. Um conclave, em um suntuoso e enorme salão de festas. Arthur, estranhamente reconheceu o lugar e reconheceu todos e todas ali presentes. Eram pessoas de suas relações íntimas e profissionais, homens vestidos de fraques e mulheres usando vestidos de gala. Em meio a conversas amenas proferidas altas, pelo efeito do álcool, Arthur escutou os nomes, assim como os nomes de Condessa Fá Rodrigues Butler e da imperatriz Sibelly Lopez. Arthur sentiu o medo e a admiração de todos e todas ao mencionarem os nomes das duas poderosas mulheres, ele mesmo sem saber o motivo experimentou as mesmas sensações.

— Então! Meu jovem? Como está indo, o vosso novo opúsculo? — Disse um homem gordo e aparência próspera, ele tinha na mão um charuto cubano em uma mão e uma delicada taça de cristal na outra. O homem levou a taça à boca e degustou lentamente a champagne rosé gelado. 

— Está vendendo muito bem o meu último romance, meu senhor! — Respondeu casualmente Arthur, como se conhecesse o homem estranho na frente dele e como soubesse do que estava falando!

— Que marmota é esse mancebo? Te perguntei da nova peça de teatro O rei... O rei... de alguma coisa! Me disseram que é supimpa! Se precisar, conte comigo para montar o espetáculo! — Falou alto o homem, parecia que ele queria ser notado por todos e todas.

Um silêncio sepulcral tomou conta do salão de festas, a temperatura caiu e o olor de gardênia tomou conta do lugar. E uma elegante mulher, de meia idade adentrou de forma teatral, no salão de festas, ela estava usando um elegante negro vestido espanhol. Era a Condessa Fá Rodrigues Butler a razão da festa, Arthur se emocionou ao ver mulher de ares nobres. Ele quis chorar tamanha a felicidade ao vê-la, taças foram erguidas em uma saudação silenciosa e contida para a dona da festa.

Arthur se voltou para o homem, que estava ao lado dele, mas este já tinha sumido e o jovem escritor o viu dirigir por uma porta lateral. Pareciam que fugia de algo ou de alguém, era patético a cena que se desenrolava. E a cabeça de Arthur começou a doer, de forma leve, bem leve à foi aumentando, até o jovem escritor levar a mão à cabeça e voltar para o seu aposento. O espelho se partiu e um nome explode na cabeça do jovem escritor: Calibor!

 

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