Por Samuel da Costa (Itajaí, SC)
‘’Entre os aromas
Das flores e a sutileza
Das palavras,
Eu prefiro as flores.
Nem toda palavra é confortável. ’’
Clarisse da Costa
Layla tinha uma vida vazia,
despropositada e com uma sufocante rotina burocrática e monótona, era sempre
fazer a mesma coisa, do mesmo jeito no trabalho de meio expediente e ela
trajada com um impecável uniforme de trabalho. E tinha os fortes odores de
álcool, vindos dos mimeógrafos sempre a rodar, os amanuenses de cabeça baixa e
concentrados no trabalho, em silêncio copiando textos e carimbando papéis e o
vai e vem estafetas, entregadores e coletores de encomendas e
caixeiros-viajantes. Tinha também o rádio ligado, dando informes em idiomas
variados em termos técnicos, que Layla desconhecia. E os ruidosos chiados do
telégrafo funcionando, cuspindo tiras de papel a toda hora, alertando as
posições das embarcações mercantes em alto mar.
E de repente, tudo mudou na vida de
Laila, com uma reunião no final da tarde no meio da semana, no Hotel Reno, foi
uma pequena confraternização. Enrico, o dono da casa de comércio, tinha fechado
um grande contrato de distribuição e representação, com empresas nacionais e estrangeiras.
Enrico, estava feliz e, quando Enrico estava feliz, fazia lá as suas
extravagâncias, o jantar de confraternização com todos os empregados do
escritório da casa de comércio, vendedores externos e alguns poucos associados.
Então a jovem Laila, sempre calada e obscura datilografa, experimentou um pouco
do gosto, de uma felicidade momentânea em um ambiente, que para ela era
desconhecido e distante. E provar do gosto de champanhe gelada, cigarros
aromáticos, charutos caribenhos e comida sofisticada, foi um divisor de águas
para Laila.
E não
demorou muito, para Layla passar a tomar café da manhã, almoçar, tomar café da
tarde e jantar no pequeno e mal afamado Hotel Reno e se embrenhar na fauna e na
flora do lugarejo pitoresco. E não demorou muito para surgirem novas e
inusitadas amizades e não demorou muito para o lugar se tornar o lugar de caça
de Laila, ela à procura de fortes emoções. Ao cair na noite eram breves
aventuras românticas, no hotel Reno, eram encontros furtivos à meia luz, com
gente totalmente desconhecida e pouca gente conhecida. Então vieram os
presentes, pequenos mimos, os pequenos agrados para e bela esfuziante
redescoberta Laila. Eram brincos, tiaras, colares, broches, pulseiras, anéis,
perfumes, lingeries, licores, batons, sapatos, e bombons e quase sempre
importados e caros. Itens que viraram lembranças bem guardadas, peças que Layla
raramente pensava em usar em público.
***
Layla
olhou para frente e viu uma luz distante e diáfana, a datilógrafa teve a
estranha impressão que os murros, que a ladeavam, estavam lhe comprimindo e
sufocando. Laila, a datilógrafa, lembrou da frase que sempre dizia para si,
antes de começar uma aventura amorosa: — Bem vindo a minha teia! Disse a
aranha para a mosca!
E indo para mais
uma aventura romântica, caminhando no beco escuro que dá acesso a entrada dos
fundos do Hotel Reno, Layla sentiu o horrível odor de carne putrefata pairando
no ar. Laila, elegantemente trajada de vestes negras, caminhando sozinha, com
os seus saltos altos, em meio a escuridão escutou: — Bem vindo a minha teia!
Disse a aranha para a mosca! — Os sons inorgânicos das palavras proferidas,
ecoaram no ar, enchendo a mente e o coração da datilógrafa, de pavores e medos.
Laila, correu em desespero e chegou até a porta dos fundos do Hotel Reno.
E ao cruzar a porta da entrada de serviço do Hotel Reno, Laila, se deparou com
o hall de entrada do amplo corredor vazio e a datilógrafa caminhou acessou a
porta à esquerda. Ela se deparou com uns poucos funcionários do hotel, estavam
se aprontando para o trabalho e outros funcionários estava se aprontando para
voltar para casa, era a troca de turno.
—
Tudo bem senhorita Layla? — Perguntou a preocupada Mariângela, a chefe das
camareiras. A trabalhadora, olhava para a desconcertada Laila, a poucos passos
à frente dela, eram quase amigas as duas. Era comum para Mariângela, receber a
alegre e feliz Laila, quanto estava se aventurando no Hotel
Reno.
—
Tudo bem mulher! — Respondeu a ofegante Laila, que tirou do bolsa um frasco de
perfume Aimer, um perfume belga, raro de encontrar no comércio local, era praxe
presentear a simpática chefe as camareiras. Mariângela, que naquela altura,
pensava ser desnecessário receber os presentes de Laila.
— A
senhorita Layla precisa de alguma coisa? — Perguntou o preocupado Raphael, o
chefe de segurança do hotel. Ele atrás de Laila, ela que se vira e encara o
chefe de segurança.
—
Tudo bem meu bom amigo! — Respondeu Laila, com a voz trêmula.
A
datilógrafa, mais uma vez, levou a mão à bolsa e tirou dois cartões de
cortesia, de acesso às bebidas do bar do hotel, era outro presente para as duas
equipes do hotel. Era a praxe final, antes de Layla subir as escadarias das
camareiras, rumo à suíte privativa do Hotel Reno. Raphael repassou as chaves de
acesso à suíte privativa, chaves que somente o chefe de segurança e a chefe das
camareiras possuíam, assim como os cronogramas de atendimentos dos quartos. Layla
pegou as chaves da suíte privativa, com certa rudeza, deu as costas e rumou às
escadarias das camareiras.
Layla
estava nervosa, pois a datilógrafa sentiu fortes odores putrefatos de carnes
mortas. Odores fétidos, que ela passou a sentir quando entrou na entrada de
serviço do hotel. A datilógrafa, teve um mal presságio, sentiu que alguém ou
algo a acompanhava, desde quando entrou no beco de acesso aos fundos do Hotel
Reno. Laila, se sentiu como um animal selvagem, na mira implacável de um
caçador à espreita, um paciente caçador noturno. E uma voz gutural passou a
repetir na mente dela: — Bem vindo a minha teia! Disse a aranha para a
mosca!
Fragmento do livro: Em perpétuos ciclos, por Samuel da Costa,
novelista, poeta e contista em Itajaí, Santa Catarina.
Argumento de Clarisse Cristal, bibliotecária, contista, novelista e
poetisa em Balneário Camboriú, Santa Catarina.
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