terça-feira, 1 de julho de 2025

A FLORISTA DA RUA 57 (O ANCESTRAL E O MODERNO)

 Por Clarisse Cristal (Balneário Camboriú, SC)

 

Sinto-me tão agraciada

Por saber que as minhas verves

São aladas aves raras  

São usadas como ferramentas

De ensino e inspiração!

***

Sento-me honrada por saber

 Que a minha divinal

E sacrossanta arte abstrata

 Desempenhar um papel

Tão significativo no deserto do real

 Enche-me de alento e gratidão

***

E de deparar na rua

Com alguém que eu não conheço

Dizendo-me que eu sou é responsável

Por filigranas de felicidades fugazes

Nestes dias de pós-modernidade fluidas

***

Pensei que as minhas belas-letras

Desvaneceriam para todo o sempre

Nas imensidades dos nadas absolutos

Que fluem nas redes sociais digitais

***

Feliz Dia da Terra disse para mim

Uma belíssima florista vaporosa

 Que estava na calçada da rua 57

Pedi à arcangélica dama do lago  

Sintécticas flores negras do tédio

E orgânicas flores vagas

***

Penso eu que ás vezes

A única forma de expor

A minha maturidade inexorável

É encomendar místicas flores

De uma pessoa desconhecida

No meio de uma rua

Convulsivamente movimentada  

 Fazendo que os passantes ao lado

Entendam que sou realmente

Uma mulher madura

***

Um outro fato da vida muito engraçado

É que acabei de receber um cartão de papai

Sai para comprar bebidas e cigarros

Na Doca 21  

Esqueci-me da minha carteira de identidade  

Mas disse à atendente

Que era maior de idade

Ela não acreditou na minha pessoa  

Chamou o chefe e ele também

Não acreditou na minha infanta pessoa

Escuso dizer que saí dali

Sem a minha dignidade, sem os meus cigarros

E sem as minhas bebidas  


Fragmento do livro, Sustentada no ar por negras asas fracas, texto de Clarisse Cristal, poetisa, cronista, contista, novelista e bibliotecária de Balneário Camboriú, Santa Catarina.

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