Por Leandro Bertoldo Silva (Padre Paraíso, MG)
Enquanto
não atravessarmos
a dor
de nossa própria solidão,
continuaremos
a nos buscar
em
outras metades.
– Fernando Pessoa –
Gosto muito dos velhos que consertam coisas. Eu mesmo tive
um tio assim. Consertava tudo.
Uma vez pegou uma lâmpada incandescente queimada no lixo,
emendou seu filamento e o pequeno bulbo de luz nunca mais deixou de acender.
Osmânio era um velho como ele: consertava ferros, rádios,
relógios de corda, chuveiros, televisões velhas…, Mas o que ele sabia mais
consertar eram sentimentos…
Não havia um só casal que, se estivesse a ponto de
separação, Osmânio não os unia. O que falar das brigas entre irmãos, pais,
mães? Até os animais pareciam respeitar o dom reparador que vinha das mãos
daquele velho, e a braveza instintiva se transformava em mansidão quando
estavam em sua presença.
Os alaridos viravam sons de passarinhos, assim como as
flores floresciam mais e os aromas ficavam ainda mais cheirosos. Osmânio era
assim: consertava corações…
Mas, apesar de tanto talento naquelas mãos, a tristeza não
se apartava de seus olhos. Camuflava-se nos sorrisos tímidos daquele jeito
misturado de sentimentos. E isso por uma simples razão: Osmânio era homem e,
como tal, havia amado, e muito, uma mulher que agora existia apenas em seu
passado. Ninguém nunca soube quem era de fato ou o que acontecera para ela não
ter envelhecido com ele.
O que todos sabiam, porém, era que Osmânio, o velho que
consertava corações, nunca havia consertado o seu…
(do livro Entrelinhas, contos mínimos.)
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