quarta-feira, 1 de dezembro de 2021

AMOR E PECADO

AMOR E PECADO 

Por Tiago Martins Koeler (Brasília, DF)

-           Amo... - disse ao vigário.
-           Como? - indagou o outro.
-           Amo... - tornou a dizer.
-           Ora! E onde o pecado? Por que te confessas? Do que devo absolvê-lo? - interpelou, confuso
-           Ela é casada.
-           Hum!...
-           Eu sou casado.
-           Ah!...
-           Amo, todavia... - enfatizou.
-           Planejaste isso?
-           Não!
-           E ela?
-           Muito menos.
O padre, agora em silêncio, movimentava, ciclicamente, indicador, médio e anular, numa estereotipia peculiar.
Decorrido, porém, breve intervalo, o vigário rompera o silêncio, recomendando em seguida:
-           Dez rosários, meu filho.
-           Dez rosários?
-           Sim! Isso! Dez rosários.
-           E conseguirei deixar de amá-la?
-           É provável que não. Quiçá, seja tão improvável quanto provocar uma fenda numa rocha, lançando-lhe pétalas.
-           Então... Por que não me condenas em definitivo?
-           Ora! Se não tenho do que absolvê-lo, porque o teria de condená-lo?
-           Não me condenas, então?
-           Por amar?
-           Sim...
-           Meu filho - disse o confessor - se for para atirar a primeira pedra, que eu a atire diante do espelho. Ademais - prosseguiu - se amas, filho meu, por amor não te condenaria; e se tivesse do que condenar-te, por amor te absolveria.
-           Amo-a profundamente, padre... É tanto amor que não sou capaz de contê-lo no próprio peito.
O sacerdote contemplou demoradamente o interlocutor.
-           Como condenar-te?
-           Sou um pecador - insistia.
-           Por amar deveras?
-           Sim. Meu pecado é amar...
O vigário, no limiar da paciência, penetrando, paternalmente, o olhar daquela ovelha, arrematou compassivo:
-           Filho, acalma-te, vá e ama em paz.
 
(O poeta, contista e compositor Tiago Martins Koeler é autor do livro ‘Veredas Poéticas’. Escritor Imortal e Membro Efetivo da Cadeira no 57 da Academia de Letras do Brasil/DF).
 

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