sábado, 1 de janeiro de 2022

O MISTÉRIO DE ÂNGELA (Capítulo 1)

 

O mistério de Ângela

Capítulo 1: Aceitar a Morte primeira parte

 

Demétrio estava na cozinha tomando o seu café amargo acompanhado do velho biscoito natalino feito pela sua tia Antonella. Ao seu lado a sombra do reflexo da lua nebulosa.

Ela, debulhada em papéis velhos, encontra uma carta e a leva com sigo entre os seios para a sala. Sentindo o cheirinho de café a jovem foi até a cozinha, por algumas frações de segundo apenas encontra a xícara vazia e no ar o perfume inconfundível de Demétrio. Percorre a casa inteira e o encontra lendo o jovial Jornal Andar de Bicicleta.

Senta-se ao lado dele e não consegue entender a frieza com que este ontem olha o jornal sem ao menos dar um sequer olhar para ela. O tempo todo ela dizia eu estou aqui e Demétrio não esboçava uma reação se quer.

O seu olhar era direcionado ao jornal. Ela apenas tinha que se contentar ao estar do lado dele. Então foi que ela teve a ideia de lhe escrever um longo bilhete. — Ele sempre leu os meus bilhetes, vou escrever um. — Ela pensou.  O bilhete dizia: "Meu amado, meu perfume está por toda parte da casa, mas é o seu perfume que sinto. Por mais que a minha presença não seja notada, eu estou aqui te amando com o meu olhar e o coração a pulsar por ti! Olhe para o lado e veja você em mim, no meu olhar a te amar sem espaço para chorar a sua falta de atenção, pois sempre estarei aqui para você".

O bilhete ela deixou no colo de Demétrio, e por incrível que pareça nem o toque de suas mãos esse homem sentiu. As mãos de Ângela corriam suas pernas com o bilhete em uma das mãos. Imóveis sempre, para a surpresa da jovem. E o seu olhar ainda permanecia sobre o jornal. O que ali tanto lhe interessava?

No jornal a seguinte matéria: "O passado do Brasil é o marco de acontecimentos, considerados os piores na sua história é a escravidão e a ditadura. Não por menos, ambos trouxeram sofrimento para uma população marginalizada. São anos de mudanças e outros retrocessos. E o Brasil se desenvolve lentamente. Mas para de fato ser um país de ordem e progresso vai levar alguns anos. Talvez isso não ocorra. Mas acredito que tudo isso depende exclusivamente da sociedade, enquanto ela continuar conivente e os políticos apenas com suas mentes voltadas para as finanças de seus bolsos, nada vai mudar’’.

Amor não vem com receita básica que diz a forma correta de amar. A vida não tem retorno, não adianta querer voltar para trás como forma de acertar os erros. E como bem saudade não se explica se sente. Já os problemas, todo mundo tem, digamos que é uma via de mão dupla, ora vem ora vai. E o maior problema de Ângela era ser notada por Demétrio. A invisibilidade a incomodava. Na verdade, o ser humano busca atenção. Não sei se a palavra certa é essa, mas ficar no escuro ninguém deseja.

Clarisse da costa é poetisa, cronista em Biguaçu SC

Contato: clarissedacosta81@gmail.com

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