segunda-feira, 1 de agosto de 2022

IMPRESSÕES DO PARAÍSO (THE BLACK ALLEY BROOKLIN)

Por Clarisse Cristal (Balneário Camboriú, SC)

   

      O meu elemento remissivo, a minha imersão abissal, o meu voltar para minha infância, o eu ser menina travessa caminhando nas calçadas estreitas e ruas esburacadas. Passava sim, sem o meus progenitores, assim o saber é claro, era um atalho divertido e perigoso a bem da verdade. Entre uma ligeira fuga, quando a despeito de passar mais tempo, com os meus amigos e amigas da escola. Escapava da van escolar para acompanhar amiguinhos da escola até as suas casas, saímos em um pequeno bando, escapava dos olhos atentos do monitor. Desembarcava a poucos metros da minha casa, só para passar pelo beco da perdição. Ali poderia ver as criaturas nefastas, embriagadas, drogas, pervertidas e decadentes em plena luz do dia.

          Sim, era bem pequena e usava o atalho pelo temido beco, confesso que era apavorante ver aquelas pessoas falando sozinhas, com seus cachimbos e bebidas baratas em garrafas e plásticos. Claro que quando os meus pais sabiam da minha imprudência infantil explodiam, aí sobravam sermões nos meus pequenos ouvidos de criança travessa e telefonemas nervosos para a empresa que me pegava na escola particular muito cara.

           Depois da mudança de endereço acabou com a minha festa e hoje jovem mulher adulta penso onde anda o Gabriel meu amigo, o flanelinha que cuidava dos carros dos frequentadores dos prédios de atividades suspeitas do entorno do malfadado beco. Por onde anda a Judite, que fazia ponto ali bem perto e arrastava seus clientes para aventuras rápidas, nos prédios adjacentes ao beco. Por onde anda o Dagoberto o barbudo bêbedo local, que sempre me dava bom dia e perguntava o que eu fazia por ali, e claro me pedia uns trocados para um goles. Criatura efêmeras e marcantes da minha tenra meninice travessa.

            Confesso que não resisti, o eu desligada das minudências do mundo real e material, o eu cidadão das nuvens passei pelo meu recanto proíbo da minha infância e reencontrei o local modificado e sem graça. Revitalizado, com calçadas largas, capeamento nas ruas e modernos postes de iluminação. Os guardadores de carros deram lugar para estacionamentos pagos, com seus funcionários uniformizados. Os muros e fachadas dos prédios cheio de artes murais coloridas. A travessa com direito a uma cancela ao fim da fronteira, onde o submundo termina e o oceano Atlântico dá o ar da sua graça. Em suma, uma perfeita armadilha de turista à beira mar.    

 

Clarisse Cristal é poetisa e bibliotecária em Balneário Camboriú, Santa Catarina.                                                       

 

             

 

 

 

 

 

 

 

 

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