quarta-feira, 1 de março de 2023

OS ASCOMANNIS E A ÁRVORE YGGDRASIL

Por Samuel da Costa (Itajaí, SC)

 

                 Leif Eriksson Van Peter relembrou das longas conversas com seu velho pai, sobre a saga dos Ascomanni, os homens madeiras e as velozes Drakkars, com as suas cabeças míticas de animal esculpidas na proa. Eram tempos gloriosos, dizia o velho pai de Leif naqueles tempos remotos e de doçura de uma infância feliz, à beira do velho Mare Germanicum. O avô fumava um cachimbo, ele ficava quieto observando impassível o pai de Leif repassar as lendas, de seu povo. Dava a impressão de nunca estar ali, tal era o seu mutismo. 

                 Hoje, olhando para a movimentação lá embaixo da janela do terceiro andar, ele percebeu tudo, pelo menos agora, as coisas tomaram as dimensões exatas. Leif não gostava de ficar na cidade, preferindo a pureza e quietude do campo, antes de partir rumo ao mar e terras distantes. Ficava na cidade, pelo menos uma semana antes do embarque. Até isso acabava ficando difícil naquele tempo, movimentações das tropas, aquele prelúdio de tempos de guerra, fez Van Peter se lembrar de uma data em especial, o ano de 793 DC. Foi quando os Ascomanni saquearam o famoso mosteiro insular de Lindisfarne, na costa Leste da Inglaterra. Saquearam o mosteiro, mataram os monges que resistiram, carregaram seus navios e retornaram à Escandinávia, cheios de glórias e histórias para contar. Eram perturbadoras, as imagens que se formavam na cabeça de Van Peter. As crônicas que viam na cabeça do homem do mar. Como os Ascomanni saquearam cidades importantes como Hamburgo, Utrecht e Rouen. Também não se esqueceu da figura do rei Canuto,  que reinou toda Inglaterra até 1066 e governava a Dinamarca e a Noruega simultaneamente.

            Levando o bico do narguile a boca, tragando o fumo do Marrocos, entorpeceu a mente  Leif Eriksson, pouco acostumado às esses prazeres. Então, o velho mito Teutônico se repetiria enfim, mas como uma ópera bufa de Wagner, uma versão tosca. Um tanto surreal em tempos modernos. O fato que terem um dia terem conquistado a maior parte da Irlanda e grandes partes da Inglaterra, viajando pelos rios da França, Portugal, Espanha e ganhando o controle de parte da Rússia e na costa do Mar Báltico. Para depois invadir no Mediterrâneo e o leste do Mar Cáspio. Eram mesmo tempos gloriosos, mas era passado. Na atualidade era uma tentativa grotesca, pelo menos era assim que Van Petter pensava, naquela hora extrema e em meio a devaneios entorpecidos.  Eram dias cinza de totalitarismo e terror aqueles.

              Tudo lembrava a efêmera colônia Vinland, no novo mundo. Toda essa movimentação e arrogância, não iam levar a nada, somente em dor e desgraça. Era assim que Van Peter encara a realidade que vivia. Leif Eriksson Van Peter que navegou pelos rios Elba em Cuxhaven, o Weser em Bremerhaven, o Ems em Emden, o Reno e o Mosa em Roterdã, o Schelde em Flushing, Tâmisa na Inglaterra e toda a intenção navegável do Danúbio. Van Petter conheceu e conhecia bem essas porções de água europeia e toda sua gente diversa, que um dia seus velhos descendentes, um dia, levaram a guerra. Hoje as coisas mudaram e os povos, um dia dominados por Odin, já não eram mais os mesmos. Skoll e Hati, os filhos de Fenrir, dessa vez eles voltariam para casa, derrotados. Não haveria no arco-íris, a ponte Bifrost, Heimdall não estaria lá em guarda. Estavam distantes os dias em que a Deusa-Sol, passava todo dia com sua carruagem, puxada pelos cavalos Asvid e Arvak. Os deuses Odin, Thor e Njord, não seriam mais venerados, como no passado. Enfim a humanidade não mais se regozijaram embaixo da árvore Yggdrasil.  Perdido em si mesmo, com imagens do passado outras se projetando no futuro. Cidades em chamas, e o mundo submerso pelas trevas, abaixo da Asgard. Um Midgard onde Hel, era o todo soberano.  

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