quarta-feira, 1 de janeiro de 2025

EDITORIAL

Um Farol na Literatura Brasileira

 

Hoje, 1º de janeiro de 2025, celebramos não apenas um aniversário, mas a realização de um sonho: a Revista Cerrado Cultural completa 14 anos desafiando os vendavais da indiferença e da desconfiança, e iluminando o cenário literário brasileiro com a chama inextinguível da criatividade.

Nesse período, a Revista Cerrado Cultural não se limitou a ser uma porta, mas tornou-se um refúgio para escritores ávidos por dividir suas almas convertidas em palavras e para leitores famintos por histórias que os transportassem para além de suas realidades. Ao abrir suas portas virtuais, a revista democratizou o acesso à literatura, derrubando as barreiras que separavam a criação da fruição.

Mais do que uma página virtual, a Revista Cerrado Cultural é um manifesto. Um manifesto em defesa da diversidade, da liberdade de expressão e da importância da literatura como ferramenta de transformação social. Ao acolher autores de todas as regiões do país e de diferentes origens, a revista contribuiu para a construção de um mosaico literário que reflete a riqueza e a complexidade da cultura brasileira.

Ao completar mais um aniversário, a Revista Cerrado Cultural não apenas celebra o passado, mas reafirma seu compromisso com o futuro. Em um mundo cada vez mais fragmentado e superficial, a revista continua a ser um farol que guia aqueles que buscam o significado e a beleza nas palavras. É um espaço onde a imaginação encontra abrigo e onde a voz de cada autor ecoa com força e clareza.

Cabe-nos agradecer aos colaboradores, aos leitores, aos incentivadores, aos propagadores deste espaço literário virtual, desejando que a chama da Revista Cerrado Cultural continue a arder por muitos e muitos anos, iluminando o caminho de novos escritores e inspirando uma nova geração de leitores.

Graças a tudo isso, a Revista Cerrado Cultural conquistou os prêmios de “Melhor Página Literária do Centro-Oeste – Inspirações 2024” e “II Prêmio Sapiens de Melhor Página Literária – 2024”.

 

Paccelli José Maracci Zahler

Editor

Brasília, DF, 01 de janeiro de 2025.


HINO NACIONAL BRASILEIRO EM IDIOMA TIKUNA


Crédito: RafaelHBarroso (YouTube).

ENCONTROS POÉTICOS, PROFÉTICOS!

Por Manoel Ianzer (São Paulo, SP)

 

Cada um chegou com seus escritos,

uns na ponta da língua,

outros no celular,

palavras que justificam o amor,

letras que reforçam o poder da vida,

frases adocicadas, verdadeiras,       

mentes leves em ação,

turbilhão de pensamentos,

para dar liberdade de se apaixonar,

de se expressar,

de rodar pela estrada poética

que é longa, vapor quente,

temos o vínculo afetivo da amizade,

sentimos no peito, no coração

a força desses encontros!

 

Na alegria de conquistar

com espírito leal, 

letras diferenciadas,

cada um traz na cor da pele,

da mente, do sangue,

o QI dos seus antepassados,

reflexos de partículas de luz,

iluminando a todos.

 

Versos intrigantes,

prosas de reflexões,

poesias de emoções,

ao som da sinfonia de um piano

imaginário,

perto de um violão na parede,

num constante círculo de amigos

onde não há inveja, nem ciúmes,

algo que vem de longe

de outras existências,

que nem o silêncio ou os gritos

apagam a memória da alma,

caridosa, generosa, cobradora,

sempre disposta a ampliar a bondade

para que o coração seja úmido,

nunca ressecado, seja único,

discreto e não debochado,

mas pulsante nos seus batimentos,

assim seguem dias esplêndidos,

espírito eterno, num eterno plantar 

de um Planeta coletivo, global,

com aprovação da Divindade!

É o fim das revoluções profundas,

profanas, dos séculos passados,

a Era da Eva passou,

agora é a Evolução Humana

que chegou sem pedir licença,

determinada e assustadora

para a revelação, salvação e libertação!

Desejo para todos nós e para a humanidade,

FELIZ ANO NOVO!

IGOR - EM MEMÓRIA DO BAILARINO IGOR XAVIER

Por Eduardo Waak (Matão, SP)


O PRIMEIRO LIVRO DE JÚLIO DINIS

Por Humberto Pinho da Silva (Porto, Portugal)


Recentemente narrei o grande amor de Júlio Dinis, pela menina Henriqueta, companheira de folguedo do escritor, e pupila do Senhor Reitor de Grijó (Gaia).

Parece-me, portanto, oportuno abordar agora a primeira obra do escritor, publicada em folhetins, a 12 de maio de 1866, no: " O Jornal do Porto", e mais tarde reunido em livro, em outubro de 1867. Edição que se esgotou no prazo de um mês!

Júlio Dinis nunca foi ilustre desconhecido, seu talento, como médico, era notório, mas ninguém o conhecia como notável escritor, nem o próprio pai., o Dr. Gomes Coelho.

Várias vezes o progenitor chegou a prosear, com amigos, sobre quem seria o neófito escritor, que escrevia os folhetins, no jornal portuense.

Até que um dia, tendo ido ao quarto do filho, encontrou surpreso sobre a secretaria, manuscritos, que lhe despertaram curiosidade.

Ao ler as primeiras linhas, imediatamente, descobriu, que o jovem que escrevia o folhetim, para "O Jornal do Porto", era nem mais nem menos, seu filho.

Pinheiro Chagas, Alexandre Herculano, entre outros, até o " briguento" Camilo, em carta a Castilho, escrevia, referindo-se ao autor das " Pupilas do Senhor Reitor." Aquilo é rebate de entroixar eu a minha papelada e desempeçar a entrada á nova geração."

Será que, ao escrever: " As Pupilas",o primeiro romance, Júlio Dinis, inspirou-se na Henriquinha, a menina que desde pequena, exerceu séria influencia, na sua curta existência. Creio que sim: Daniel, filho do José das Dornas, o rapaz que aprendia latim e nutria especial afeição pela pastorinha, chamada Margarida.

Mais tarde, formado em medicina – o mesmo curso de Júlio Dinis, – regressou, à aldeia, e encontra a amiga de infância, já mulher, que ainda nutre afeição pelo rapaz, que aprendia latim. Margarida a pegureira, não será a figura disfarçada de Henriqueta?

Em muitas obras do escritor, a Henriqueta, surge, de forma mais evidente. É natural. Não era a menina, sua companheira de infância e seu grande amor?

A GATINHA LÚCIFER

Por Humberto Pinho da Silva (Porto, Portugal)

  

Em vésperas de Natal, andava eu atarefado, num hipermercado, em busca de brinquedo, para a minha neta.

Após percorrer as prateleiras dos jogos didáticos, e das bonecas – algumas verdadeiras cópias das originais, – deparei entre os felpudos, graciosa gatinha. O fabricante ou importador, assegurava que a bichana emitia sons reais, graças ao mecanismo que instalaram no interior do " animal".

Curioso atentei, observando as instruções; mas, qual foi o meu espanto, quando atónito, verifico que tinham dado ao brinquedo, o anátema nome de: Lúcifer!

Rapidamente saltou-me ao pensamento, imaginosa cena de uma extremosa mãe, depositar ternamente, sob a árvore natalícia, o mafarrico, ou colocar rés ao Menino a gatinha Lúcifer!

Cena ainda mais burlesca será quando a menina, eufórica, disser às coleguinhas da catequese ou das aulas dominicais:

- O Pai Natal ou Papai Noel, se for brasileira, trouxe-me, neste Natal a Lúcifer!..."

Eu sei que no mercado há produtos fabricados por empresas que financiam a " igreja do diabo", igreja que parece estar florescente em certos centros excêntricos e imorais, do vasto continente americano.

Também sei – com alegria e jubilo, – que existem multinacionais, que são " Sócias de Deus", entregando parte dos lucros a Igrejas Evangélicas.

Mas, que o maligno esteja tão difundido, aponto de se vender descaradamente, em países cristãos, pelúcias, com o nome de: Lúcifer, nunca me passou pelo pensamento.

Eu sei, nós sabemos, que a imoralidade marcha desenfreadamente em desabrido corcel, em todos os meios de comunicação.

Escritora amiga, declarou-me, em carta, que o editor lhe solicitara " apimentar" o romance, se o quisesse publicar!

E também sei que a influencia das forças do Mal estão infetando, sem pejo: novelas televisivas, cinema, Internet, e até, sem o desejarmos, a emporcalhar o nosso smartphone.

Em meios, e movimentos cristãos, já se fala, a medo, da ignóbil "nova moral", que não passa, a grosso modo, desvirtuar a doutrina de Jesus.

Dir-me-ão: é evolução, novos ventos, que sopram no século XXI; mas eu direi: que é involução, regresso à velha Roma, ao tempo de Noé:

Em Mateus 24:37/ Lc. 16:27, encontramos a profecia de Cristo, que diz: quando Jesus regressar à Terra, tudo se encontrará como no tempo do ancião Noé.

Ouvi a jovem católica declarar publicamente: que o pecado não existe, porque o pecado não passa de imaginação, e o diabo não existe.

Para o crente inteligente, que sabe pensar, basta-lhe analisar os acontecimentos quotidianos, que os meios de comunicação social transmitem para verificar que a nossa civilização descamba, a largos passos, para o abismo, para o reino das trevas.

CONSELHO DE MÃE

Por Dias Campos (São Paulo, SP)

 

Camargo Aranha tinha um modo peculiar de ganhar a vida e um meio sublime de se livrar das “correntes da vida” que por vezes o prendiam. Apropriar-se dos bens alheios por meio de golpes mirabolantes era o seu ganha-pão. Dedicar-se à literatura, escrevendo e publicando contos fantásticos, a sua maneira de se desacorrentar. Esta, aprendera-a com sua mãe no início da adolescência; aquele, seduziram-no os falsos amigos, antes de largar a faculdade.

E se D. Ana sempre agradeceu a Deus pelos dons da criatividade e da originalidade com que brindara seu filho, mais graças a Ele rendia pelo lar constantemente provido; se bem que jamais suspeitasse do ofício a que ele se dedicava.

Certa tarde, Camargo Aranha entrou em casa carrancudo. D. Ana logo percebeu que algo estava errado, pois, além de notar o seu semblante, o horário que chegava não era o de costume.

A bondosa senhora deixou que os minutos passassem na esperança de que seu filho viesse conversar.

Mas como não saía do quarto, o jeito foi acender o fogo a fim de que o perfume do bròdo o tirasse da clausura.

Pois não demorou muito para que ele aparecesse, e com um aspecto mais sereno.

D. Ana serviu ao filho um prato cheio. Depois sentou-se ao seu lado e esperou que começasse a falar.

Camargo Aranha, que jamais resistira a esse jeito materno de persuasão, contou que estava se deparando com muitos entraves à resolução de um negócio que imaginara, sendo essa a razão por que entrou em casa de cara amarrada.

D. Ana, então, tratou de relembrar ao filho o velho e sábio conselho – “Toda vez que se sentir acorrentado, usa do papel e do lápis para libertar-se”. Assim, se chegou com problemas, que os pusesse de escanteio e se entregasse à escrita. E à medida que fosse escrevendo, as correntes iriam se quebrando. Ao final, ficaria completamente livre para avaliar melhor as decisões que precisaria tomar.

Camargo Aranha sorriu; e pediu desculpas pelo esquecimento. E como soubesse que um muito obrigado não seria suficiente à sua mãe, usou do repeteco como meio de gratidão.

Terminada a refeição, o filho voltou para o quarto e sentou-se à escrivaninha. Seria por meio da sua arte que ele desanuviaria os pensamentos e acharia o caminho de que precisava.

Desta vez, porém, resolveu unir o útil ao agradável, e passou a escrever sobre a manobra desonesta que pretendia. Tinha esperança de que as dificuldades com que se debatia seriam todas superadas no desenvolver da história, o que resultaria em um verdadeiro roteiro àquilo que almejava.

Com efeito, na medida em que o texto crescia, e ganhava vida própria, os parágrafos faziam-se setas que indicavam os trajetos possíveis a serem percorridos. Os períodos convertiam-se em itinerários que descreviam os percursos prováveis a serem escolhidos. E o texto acabado transformou-se em um mapa detalhado, que, se seguido à risca, levaria ao destino cobiçado no menor tempo, com o menor custo e sob riscos aceitáveis.

É claro que esse foi o único dos contos que Camargo Aranha resolveu não publicar. Vai que tivesse como leitor algum investigador que reconhecesse os lugares descritos, que identificasse algum padrão de comportamento e que ligasse todos os pontos?

A exceção ficou a cargo de sua mãe. Afinal, ela sempre foi a sua primeira e mais fiel admiradora.

Em que pese D. Ana não gostar da temática escolhida – assalto a uma transportadora de valores –, e muito menos do final escolhido ao personagem principal, que escapava ileso, não deixou de aplaudir e de estimular o talento do contista.

À noite, sozinho em seu quarto, Camargo Aranha leu e releu o texto. E dele extraiu as passagens essenciais com que elaboraria um cronograma. Assim, ficaria mais fácil memorizá-lo, bem como explicar o plano aos comparsas com quem costumava agir.

E se sonhou com a sua execução, reproduzindo cada alternativa, decisão ou movimento descritos naquele conto, não conseguiu terminá-lo da maneira como concluíra, comemorando com a quadrilha, pois na hora exata em que iria agarrar os sacos de dinheiro, o despertador soou o estridente alarme.

Camargo Aranha levantou-se assustado. Mas foi se acalmando assim que se lembrou de que a reunião com seus cúmplices só aconteceria às dez horas.

Como sempre, D. Ana preparara o café e pusera a mesa.

Camargo Aranha lambeu os dedos com um pão na chapa feito na hora, sorveu o café com leite quentinho e cremoso, travou um gostoso bate-papo com sua mãe, e, por conta disso, adiou a leitura do jornal para quando retornasse. 

Percebendo que seu filho acordara animado, D. Ana foi logo louvando a terapia do papel e do lápis, santos remédios que libertam os homens dos grilhões por eles forjados durante a existência!

Camargo Aranha sorriu, e concordou com um meneio de cabeça. Em seguida, beijou-lhe a testa, consultou o relógio, e partiu avisando que não o esperasse para o almoço.

E se ela aparentou concordar, ele fingiu acreditar.

Quando chegou ao local marcado – um bar insuspeito, no centro da cidade –, os três criminosos já o aguardavam, desejosos de dinheiro e saciados de cerveja.

Demonstrando certa contrariedade, Camargo Aranha perguntou se não era muito cedo para beberem.

A resposta, porém, agradou aos seus ouvidos – comemoravam antecipadamente mais um golpe de mestre.

O líder da quadrinha mostrou o cronograma que fizera, explicou o plano, e distribuiu as tarefas, enfatizando que cada um deveria agir em estrita obediência ao que idealizara.

Os ladrões tudo compreenderam.

Ao final da empreitada, repartiriam uma bolada de fazer inveja à concorrência, e poderiam viver sossegados por um bom par de anos; desde que, é claro, não dessem bandeira à polícia, ostentando luxo nos meses seguintes.

 Como todos ficaram bastante satisfeitos, e confiantes, Camargo Aranha recostou-se na cadeira, varreu o bar com os olhos, e terminou por pousá-los no relógio. E como o horário incentivava, desconsiderou a pergunta que fizera ao chegar e indagou quem lhe serviria uma gelada.

O chefe do bando voltou para casa outro homem. Seu semblante nem de longe lembrava a carranca do dia anterior. Estava bem-humorado, falante, e trouxera de presente para sua mãe um lindo ramalhete de rosas brancas. – O mimo também visava a desviar sua atenção quanto ao fato de ter bebido.

D. Ana preparara o seu prato predileto – lasanha à bolonhesa. Pena que estivesse um pouco fria, visto que demorou para voltar.

Na hora do cafezinho, sempre recém-passado, D. Ana perguntou se poderia mostrar à vizinha o conto que escrevera. – Havia, sim, uma vontadezinha de fazer inveja.

Camargo Aranha chegou a engasgar. Mas depois que se recompôs, inventou que estava em tratativas com uma Revista especializada. E quando o publicassem, traria alguns exemplares cheirando a novos, de modo que sua mãe poderia distribuí-los à vizinhança até com mais prazer. Isso foi suficiente para que ela se contivesse.

Antes de dormirem, o filho de D. Ana ainda foi visitado pela inspiração. Mas como a história revelava-se tremendamente autobiográfica, resolveu abortar o texto com medo de que sua mãe também quisesse mostrá-lo aos vizinhos.

Na manhã seguinte, ele nem precisou do despertador para levantar-se. Era a véspera do roubo. E como sempre acontecia, a preocupação fez as vezes da campainha.

Camargo Aranha ensaiou partir sem tomar café. Mas como sua mãe o lembrou de que saco vazio não para em pé, a antevisão dos muitos malotes de dinheiro que deveria transportar fez com que mudasse de ideia.

Mesmo que a ação só acontecesse a uma e meia da madrugada, horário em que a vigilância na sede da empresa parecia relaxar, de acordo com o relatado por um funcionário que se vendera, Camargo Aranha fez questão de passar o dia todo com seus amigos de rapinagem, pois o plano deveria ser estudado tantas vezes quanto achasse necessário. E podemos afirmar que cada um dos quadrilheiros sabia precisamente onde se posicionar, o que lhe cabia fazer, o seu momento de agir, e o tempo máximo de sua participação.

No horário marcado, a ação teve início com precisão cirúrgica. Dois carros para fuga a postos (1h30); invasão por uma porta lateral facilitada pelo funcionário corrupto (1h31); rendição dos guardas sem um único disparo (1h37); abertura do portão principal para entrada dos automóveis (1h40); arrombamento do cofre com explosivos suficientes (1h43); ensacamento do dinheiro encontrado, perfazendo cinco malotes lotados (1h46); retorno dos assaltantes aos carros (1h49); e abertura do portão principal pelo quarto partícipe visando à fuga (1h50).

E todo o plano aconteceu em cravados vinte minutos, um novo recorde para a equipe de malfeitores.

Os bandidos pisaram fundo no acelerador e desapareceram.

O assalto foi notícia por quase uma semana, tempo esse em que Camargo Aranha e seus parceiros ficaram como que invisíveis.

Mas as investigações prosseguiram. E levaram os agentes àquele funcionário venal.

O subornado não aguentou a pressão e acabou revelando todos os nomes.

Camargo Aranha foi preso em um sábado chuvoso, justamente quando tomava café da manhã com sua mãe.

D. Ana, que desfaleceu e precisou ser amparada por um dos policiais, foi internada às pressas.

No hospital, já desperta, a pobre senhora tanto insistiu que ficou sabendo que seu filho tinha sido preso por ter organizado e participado do famoso roubo à transportadora de valores.

D. Ana chorou todas as lágrimas que podia... E só retornou para casa três dias depois; bem mais magra, e envelhecida.

Seguiu-se o processo e a sentença foi proferida. E a Camargo Aranha foi imposta a maior pena, porque mentor intelectual do crime.

E como a penitenciária para onde foi levado estava longe de ser um modelo de reabilitação, Camargo Aranha, além de ser frequentemente humilhado pelos presos com quem dividia a cela, era por vezes seviciado pelo carcereiro encarregado do seu pavilhão, visto que teve a infelicidade de não cair em suas graças logo no primeiro contato.

Mas haveria um momento de consolo. Seria o primeiro dia em que sua mãe iria visitá-lo.

Ao se reverem, o presidiário desatou a chorar. E por entre soluços e súplicas de perdão, confessou que não aguentaria passar por tanto sofrimento, que não suportava ficar preso nem mais um dia, que preferia morrer a viver acorrentado ao inferno.

D. Ana fitava o filho com ternura. Não falava, apenas sorria. E como o cansaço do desiludido impusera-lhe uma pausa, sua mãe abriu a sacola que trouxera e, com as mãos trêmulas, entregou a Camargo Aranha algumas folhas de papel e um punhado de lápis, itens que prometia trazer a cada vez que fosse visitá-lo.

E o prisioneiro compreendia, com os olhos marejados e os lábios cerrados, que os contos que escreveria seriam, mais do que nunca, as únicas maneiras por que poderia se sentir livre, haja vista os longos anos que ainda teria para cumprir.