sexta-feira, 1 de agosto de 2025

NA JANELA DA MINHA CASA EU A VEJO

Por Fabiane Braga Lima (Rio Claro, SP) e Samuel da Costa (Itajaí, SC)

 

Eu estava acostumado a vê-la brevemente todos os dias, como se fosse uma pintura vívida, aquela jovem, ela era uma bela mulher, porém sempre estava triste. Logo de manhã, bem cedo, saia apressada, com sua mochila nas costas, para enfrentar as lutas diárias. Colocava o lixo no portão e respirava ofegante e seguia em frente. E eu sempre apreciava essa cena tão comum para muitos, mas ela me chamava a atenção. No final da tarde, estava ela de volta ao lar, parecia chegar triste e muito abatida.

Em um novo dia, lá estava ela, de novo segundo a mesma rotina, mochila nas costas, olhar triste, partindo para o ponto de ônibus próximo. No começo de um dia, percebi que a rotina tinha sido quebrada, ela demorava para ir ao trabalho. Tinha acostumado vê-la partir e chegar todos os dias, apesar de não a conhecer pessoalmente. Como moro ao lado, fui ver o que tinha ocorrido.

— Olá, tem alguém em casa? — Resolvi chamá-la assim, eu não sabia sequer o nome da mulher, tive um mal pressentimento. De repente ela aparece na porta. Estava machucada, havia hematomas em seu rosto.

— Estou aqui, ando gripada vizinho. — Constrangida me respondeu ainda dentro de casa.

 Mas era mentira dela, pois não estava com gripe. Ela, uma dedicada professora de história, em início de carreira, que trabalhava em três escolas todos os dias, mas estava sofrendo várias agressões. E eu, um completo estranho para aquela mulher, um desconhecido qualquer, ela gentilmente me convidou para entrar em sua casa. Era uma casa simples e modestamente decorada, mas tinha as melhores de todas as decorações possíveis, livros variados e mais livros de todos os gêneros e por toda a parte e em todos os cômodos da casa.

          A dona da casa, me conduziu para a sala de estar, ela tinha acabado passado um café no coador de pano. Sentamos à mesa, ela me serviu uma xícara de café preto e, sem sequer perguntar o meu nome, contou das agruras que estava passando naquele exato momento da vida. Confidenciou-me que era de origem humilde e conseguiu se formar em história a duras penas. E uma vez formada, fez concurso público, foi dar aulas na rede pública de ensino e depois na rede privada de ensino também. Depois, contou dos assédios morais e agressões sofridas, dentro e fora da sala de aulas, por alunos, alunas e colegas de profissão. Ameaças de morte e até uma agressão física, nas duas redes de ensino. E eu sem nada dizer sobre isso, ouvi de tudo isso com profundo pesar no coração e na alma, depois disto forjamos uma bela e profunda amizade.

Eu filho de professora primária, além de vê-la partir e chegar do trabalho, agora no começo da noite, eu vejo aquela mulher forte, sentada na varanda da casa, preparando as aulas, corrigindo trabalhos, tão dedicada, ao mesmo tempo desvalorizada da vida...!


Fragmento do livro: Duas lágrimas, duas vidas e dois sorrisosTexto e argumento de Fabiane Braga Lima, novelista, poetisa e contista em Rio Claro, São Paulo.

Texto e revisão de Samuel da Costa, novelista, poeta e contista em Itajaí, Santa Catarina. 

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