segunda-feira, 1 de janeiro de 2024

DÓRIAN E LUEN: NÃO HÁ FLORES NAS RUAS DAS FLORES, RUPTURAS (QUINTA PARTE)

Por Samuel da Costa (Itajaí, SC)

 

‘’E a coisa melhor do mundo?

É pensar em você, todos os dias...

Acho isso tão perfeito, ficarmos juntos...

Do jeito que eu quero, te admiro...

Gosta de mim, me adora, sorrindo...

Prometemos juntos

Até quando eu não sei!

Mas sonhar com o futuro a dois...

Como convém ser, é definitivo

Por toda a eternidade! ’’

Patrícia Raphael  

 

            O som do martelar, nas teclas da máquina de escrever continental, subiam as escadas, como se fosse uma metralhar de uma bateria de antiaérea, Dórian estava deitado na cama, estava exausto. O notório professor universitário de comunicação, olhou para a porta do quarto e viu Luen. E como ela estava deslumbrante, usando o uniforme de trabalho, ela estava com um cigarro mentolado na mão e ela estava rindo, por dentro e por fora.

            Para Luen, as rupturas do espaço e tempo, eram somente atos naturais, coisas da vida e sempre em companhia de sussurros astrais. Agora de pé, olhando o marido deitado, combalido e fatigado, a fazendo Luen lembrar do que ela nunca foi, não queria e nem desejava ser. A realidade, o tempo contínuo e limitado ao entorno dela, nunca foi uma opção de fato, não para Luen.

            No ateliê de Dórian, Luen reescrevia a hirta realidade de Dórian, com se ventos siderais, como uma explosão de uma supernova a atingia frontalmente, não era um incômodo para Luen compor assim. Para Luen, a primeira secretária da câmara alta, era como um ato final, era como estar diante de um pelotão de fuzilamento, com armas sendo, engatilhadas, apontadas, disparadas depois do comando de um militar de média patente. Tinha o som de mosquetes sendo disparados, o cheiro de pólvoras queimadas, o impulso de ser jogada para trás, o ser levada ao chão, perder todos os sentidos e depois recomeçar de novo e novo, rompendo leis naturais, de uma realidade limitada, em um perpétuo ciclo.

            O matraquear, das teclas da máquina de escrever continental, inundavam a casa na Ruas das flores, Dórian de olhos fechados, lendo as páginas que brotavam da máquina de escrever, cada palavra envenenada, cada infernal negra linha composta, eram adagas afiadas que rompiam o corpo incorpóreo de Dórian. Ele quis gritar, gritou alto, mais alto, os desesperos galgaram as imensidões cósmicas infindas, eram sacrossantas oferendas aos imortais deuses e deusas exteriores.

            Luen Di Santis, caminhou anômala e lentamente, como se os pés não tocassem o chão, flutuou para junto do leito de Dórian La Verdi, era como um astro em total colapso fosse de encontro com um astro menor. Mas não houve nenhuma explosão cósmica aos corpos celestes se conflagraram, somente o álgido vácuo celestial, o nada absoluto entre o casal improvável.

            — Agora, meu querido, eu vou trabalhar e só posso dizer um breve adeus, meu amor! — Sussurrou Luen, para o marido sem abrir a boca.

            E Dórian aterrado, sentiu Luen, se retirar do quarto, que estava na completa escuridão, então aladas criaturas negras, vaporosas e indescritíveis adentraram no quarto, flanavam no teto, nas paredes e no chão e Dórian gritou apavorado. Sons metálicos e estridentes vieram do ateliê, o martelar da máquina de escrever continental, enquanto Luen, soberana e dona se si, ganhava as ruas dissolutas, era o alvor rubro de um novo dia. Luen indo trabalhar, plena, sabendo que o marido estava em boa companhia. As criaturas, presas na mente de Dórian estavam livres afinal.   

 Fragmento do livro Sono Paradoxal, de Samuel da Costa, poeta, contista e novelista em Itajaí, Santa Catarina.

Contato: samueldeitajai@yahoo.com.br

 

Nenhum comentário:

Postar um comentário