Por Samuel da Costa (Itajaí, SC)
Dos muitos embates que eu presenciei, na localidade em que vivo, e que marcou nesses anos de lutas de classe, política e social, destaco uma em um momento muito particular. Das muitas ridiculices, que eu presenciei, eu um mero habitante dos ambientes do subsolo, da sociedade estratificada, eu o mero trabalhador mal pago, o agente efetivo do aparato repressivo do estado. Em suma, eu uma figura menor, dos grandes debates e embates públicos entre classes.
E lá estava, no parlamento local, eu um homem negro, marxiano, um militante do movimento sindical e movimento negro, muitas das vezes um mero observador anônimo e nada mais. Era o primeiro decênio do início do século XXl, e o mergulhado em debate público efervescente, pois uma onda progressista à esquerda, vinha varando o país. E grandes avanços sociais, se viram em todos os cantos do país.
E voltando ao tema aqui, no parlamento local, depois do dito grande expediente, o então presidente da casa do povo, alinhado com a tal onda progressista à esquerda, resolveu cometer um pequeno suicido político. Assim que terminou, o dito grande expediente, do parlamento local, o querubim-mor, saiu de lá, das densas alturas. Enquanto os demais parlamentares locais foram ter com as suas vidas, o querubim-mor, o senhor presidente da casa do povo saiu da mesa da presidência e foi sorridente pavonear, com os meros mortais. E lá estavam os meros mortais e o querubim-mor, o parlamentar presidente do parlamento local, na segurança, mais que segura, no páramo, nós separados por uma pequena amurada. Afinal de contas, figuras mitológicas, semi deuses e semideuses não se misturam, com o povo do subsolo.
No lado dos mortais estava eu, mais um parlamentar conservador de oposição, mais um famoso jornalista setorista local, uns alguns outros meros mortais, diante do impávido querubim-mor. E ele, o sorridente parlamentar presidente o ser mitológico, então perguntou para a audiência involuntária, se tudo estava indo bem, então um popular, respondeu que nada estava indo bem. Quem era o popular? Um professor de educação física, ele dando conta de atletas, jovens atletas estavam abandonados, pelo poder público local! Quem eram os jovens atletas? Eram de cidades do interior, que vieram integrar os quadros, de atletas locais e segundo o tal professor, estavam abandonados à própria sorte, pelo poder público local, estavam na rua.
E para os muitos ridículos da vida, desta e muitas outras possíveis e imagináveis vidas, depois que o tradicional bate boca, entre os dois contendores, o querubim-mor presidente da casa do povo local, exigiu provas das graves denúncias. E elas vieram, as provas vieram, pois o tal professor de educação física, dona de si, se virou e perguntou para dois jovens a pouco metros atrás dele. Perguntou quem eram, o que eles vieram fazer na cidade e onde estava morando. Somos atletas, viemos para cidade jogar e estamos vivendo na casa do senhor, responderam alternadamente os dois jovens atletas.
Depois do pequeno constrangimento alheio, dando conta que os dois contendores, o presidente da casa do povo, do mesmo partido do alcaide local e a professor de educação física eram desafetos. A pequena tragicomédia terminou, com a fala do presidente da casa do povo, que ele não era do executivo local e um convite para o professor e seus novos agregados para uma conversa reservada.
Do que saiu da tal conversas a portas fechadas eu não sei dizer, o que a minha debilitada memória afetiva guardou é quando as figuras mitológicas donas de si voam lá nas densas alturas para os subsolos. Eles e elas plenos de si, cheios de suas superioridades abstratas, perante aos meros mortais, raramente acabam bem, de um jeito ou de outro a coisa não termina bem.
Fragmento do livro Dos ridículos da vida, de Samuel Costa, contista, poeta e novelista em Itajaí, Santa Catarina.
Contato: samueldeitajai@yahoo.com.br
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