domingo, 1 de outubro de 2023

OPERA MUNDI (8ª PARTE): EPÍLOGO (2ª PARTE)

Por Samuel da Costa (Itajaí, SC)

 

Madrugada chegou, silêncio no peito,

Mente oscila, atrita voz silenciosa,

Alma rasgando, grito calado de aflito

Saudade daquele amor antigo, amigo.

***

No oceano de lamúria a insônia castiga

Lembranças infindas ilusões, intrigas,

Lágrimas caem no rosto, sob’ desgosto,

Entrego, vivo, amo, universos opostos.

***

Nítido ver, quem minh‘alma chorou, sofreu

Calado esperar, o amor que aflorou, viveu

Do nada se calou o amor padeceu!?

Não! Coração avisou, sofreu, revigorou,

Seguiu na sua jornada, amou, não negou!

Hoje a alma silenciosa, vive, sobreviveu...!

 

Fabiane Braga Lima

 

Fazia tempo que Bartira não sentia aquela sensação, era como arame farpado lhe dilaceram o corpo mortal e cegada por astrais luzes negras. Tão comum quando ela ressurge em uma nova espécie e sem distinguir o certo do errado. São cósmicas dores, que se tornam feridas dentro do âmago mais profundo. São novíssimos olhos, que ardem em chamas de cosmovisão e cada novo olhar, que doem como cortantes arames farpados a lhe dilaceram a alma imortal.

E ela que sobreviveu a negra noite do fogo eviterno, ela que nunca parou de observar o fogo celestial, a chama consumidora nas próprias mãos. E só agora, que ela comandando o Dirigível Mare Crisium, ela sentia que estava indo ao chão. Como Ícaro quando chegou perto do sol e foi levado ao chão. Mas era tarde demais para apagar as chamas que ela abanou em suas próprias mãos.

Mas o perigo estava bem próximo, as asas estavam se desfazendo, pois o Dirigível Mare Crisium rumava para o sol, e ela não iria atingir o solo. O silêncio era ensurdecedor, na ponte de comando do dirigível, pois Bartira estava sozinha, ela devidamente uniformizada, ela usava seu uniforme de hussardo. A comandante, ligou o campo de força, usando a telecinese e abriu uma ponte de Einstein-Rosen.

Para Bartira, não era o fim, era um começo, um recomeço a bem da verdade. Para ela, para a afra rainha Luna e para o vate Yendel, pelo menos era assim que ela desejava. E antes de dar partida no Dirigível Mare Crisium refez os cálculos mais uma vez, acessou velhos e novos manuscritos, manuais, tratados e protocolos e tudo usando somente o palácio das memórias.

E no vazio existencial, ela deu um brado, como seu povo fazia todas as vezes que ia à guerra. Era hora de começar um motim, uma rebelião contra Hastur e contra Calibor, concluiu a comandante. Pois somente quando se encara a morte é que as pessoas se sentem vivas. Era um velho dizer do povo de Bartira, era hora de reverenciar os deuses antigos, pensou Bartira quando deu partida no Dirigível Mare Crisium.

Ao ressurgir na imensidão cósmica sem fim, Bartira olhou o astro rei bem na frente dela. E ela visualizou as duas capsulas de energia quântica, ambas estavam em uma distância segura, no proa do dirigível. Separados por potentes campos de força, o mesmo campo de força que envolvia o dirigível. Doze tanques Aparai AS13 conduziam as cápsulas, seis em cada lado, cápsulas de energia quântica. Bartira sabia que era insustentável a operação em médio prazo e ela tinha pouco tempo para agir. Pois os tanques conduziam as cápsulas até as escotilhas, pois as cápsulas deveriam ser unidas e lançadas ao astro rei.

A comandante, parou a operação e se dirigiu até a proa, antes que elas se unissem para, depois, serem lançadas ao sol. Bartira desceu as escadas lentamente e chegou até a proa e acionou o protocolo de segurança manual. Os tanques Aparai AS13 pararam a marcha e a comandante assumiu a operação, antes moveu o dirigível para a imensidão cósmica, levou as mãos à cabeça e dissolveu o campo de força que separava o casal. Bartira se aproximou e olhou o casal separado por centímetros, a afra rainha Luna, a predileta de Hastur, ela trajada em vestes brancas e amarelas, usando na cabeça um diadema de ouro cravejado de diamantes ao lado e o vate Yendel o bibliotecário-mor de Calibor, o vate trajado com uma bata negra cerimonial, ele o responsável pela Turris ebúrnea.

Bartira não poderia errar um nano centímetro sequer, a comandante do dirigível Mare Crisium, apontou as mãos para as cápsulas, de pura energia e ela levou as mãos para o alto, as cápsulas se elevaram. Bartira lentamente uniu os punhos e as cápsulas se uniram e se fundiram, uma onda magnética fez o Dirigível Mare Crisium vibrar. Bartira sabia que tinha pouco tempo, então ela abriu a escotilha e o vácuo cósmico inundou a proa, a comandante e as cápsulas estavam protegidas pelos campos de força.

A comandante Bartira, uniu os dedos das mãos e os abriu, lançando a cápsula na imensidão cósmica. Bartira desuniu as mãos e olhou para a manopla no punho direito, acionou um comando e lá fora uma ponte de Einstein-Rosen se abriu e a cápsula de energia foi tragada para o desconhecido.

Então a comandante Dirigível Mare Crisium tinha um último ato: ̶ Agora é tarde demais para apagar a chama que eu mesma abanei! ̶ Falou Bartira para si mesma. Levou a mão à manopla mais uma vez e o Dirigível Mare Crisium corrigiu a rota rumo ao sol.

— Ícaro, não voe tão perto do sol! — Bradou Bartira bem alto.

 

Fragmento do livro Sustentada no ar por asas fracas, de Clarisse Cristal, poetisa, contista, novelista e bibliotecária de Balneário Camboriú, Santa Catarina.

 Texto de Samuel da Costa, poeta, contista e novelista em Itajaí, Santa Catarina.

 

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