Por Dias Campos (São Paulo, SP)
Em uma pizzada na casa de amigos, no
último sábado, o bate-papo migrou para a vida dos casais; mais precisamente sobre
as eventuais mudanças que um dos parceiros teria imposto ao outro nos primeiros
meses após o casamento.
Pode parecer clichê, amigo leitor,
mas constatamos que apenas os homens foram obrigados a modificar os seus
hábitos. Assim, a tampa do vaso sanitário passou a ser abaixada depois do uso;
a roupa suja não mais foi esquecida no chão do banheiro; e, sobretudo, a louça
das refeições ficou a cargo de ambos os cônjuges. – Você pode não acreditar,
mas só me enquadro nesta última situação.
Conversa vai, conversa vem, e acrescentei três manias que, por serem as
mais enraizadas, só poderiam ter sido modificadas por um poder além da imaginação,
e que nunca me foi revelado.
Nem se precisaria dizer que todos os olhos, interjeições e
questionamentos voltaram-se para minha mulher.
Ela caiu na risada. E fazendo-se de mística,
recusou-se a contar quais teriam sido os feitiços que me lançou tão logo
voltamos da lua de mel.
Então pediram para que eu contasse sobre minhas transformações.
É claro que me divertia com a reação de todos. E fui buscar em mais um
gole de tinto o tempo necessário para que a curiosidade aumentasse.
Pois coloquei a taça sobre a mesa, inspirei profundamente, e disse que sempre
achei um absurdo ver gente colocando pimenta na própria comida. Não conseguia
entender como alguém poderia gostar de sentir a boca pegando fogo. Da mesma
forma, tomar sopa não fazia o menor sentido. Afinal, trocar o prazer de morder
um suculento contrafilé pelo sacrifício de engolir legumes imersos em água fervente
era, para mim, coisa de maluco. Por fim, terminada a refeição, não tinha como aceitar
que pessoas preferissem substituir a deliciosa lembrança da última garfada,
seja a do prato principal, seja a da sobremesa, por uma xícara de café para lá
de quente, com ou sem açúcar. – Só um colega concordou comigo, e foi quanto à
repulsa pela sopa.
Seja como for, a única explicação
aceitável é a de que minha esposa teria conjurado sortilégios poderosíssimos,
pois desde aquele momento o meu paladar simplesmente mudou, e eu não consigo mais
comer bifes que não tenham sido temperados com pimenta; não deixo passar todo o
inverno sem apreciar a calórica sopa de cebolas à francesa; e me recuso a
levantar da mesa, acabada a refeição, sem sorver um cafezinho recém-passado e muito
bem adoçado!
Mesmo por entre palmas, assobios e insistentes pedidos para que revelasse
o seu segredo, minha mulher recusou-se peremptoriamente. E a justificativa foi
a de que eu poderia recair naquelas esquisitices de solteiro. – Mas falou
baixinho que depois enviaria a receita por WhatsApp.
E como continuei sem saber o que ela teria feito, o jeito foi abrirmos
mais uma garrafa de vinho, brindarmos aos mistérios femininos, disputarmos no
palitinho a última fatia de pizza, e escolhermos outra brincadeira, pois a
noite apenas começava.
Quem sabe um dia ela me conta?...
Nenhum comentário:
Postar um comentário