quarta-feira, 1 de novembro de 2023

DÓRIAN: NO JARDIM DAS AFLIÇÕES

Por Samuel da Costa (Itajaí, SC)

 

Ofereço-te negra fada

Da floresta negra

Todo o meu etéreo amor

Em tempos de guerras

De atrozes desesperos

E dores atrozes

 

            Dórian sempre pensou no enlace que tinha com Luen, não como se fosse o simples os opostos se atraem, para Dórian era os opostos se complementam. Se o homem da relação e mesmo assim ser o elo fraco, como dizem muitos, dele ser o mais introspectivo, resguardado e quieto do casamento. Já Luen era uma usina de força, uma fortaleza inabalável nos piores e nos melhores momentos.

A vida impos Luen para Dórian e a vida impôs Dórian para Luen, em um acordo tácito, onde Luen seria um resplendor uma líder nata e Dórian seria o exemplo da continuidade de uma rotina certa como o amanhecer depois uma noite escura.

Dórian acordava cedo e organizava a casa para Luen, verificar se faltava algo na geladeira, fazer o café, verificar que as roupas deixadas na máquina de lavar, na noite anterior estavam lavadas. Colocar as roupas no cesto para as secretaria passar e as guardar mais tarde, subir no quarto do casal e acordar Luen com um beijo leve nos lábios. Verificar a agenda da esposa e separar roupas que ela iria usar no dia. Preparar o banho da esposa e por fim descer e verificar a própria agenda.                                                                                                                      

         Dórian foi até a cozinha e verificou os bilhetes presos na porta da geladeira por imam, eram lembretes de contas a pagar e a vencer, comprar domésticas por fazer a agenda da diarista da semana. Dórian tirou uma a uma da porta da geladeira de duas portas, memorizou tudo e jogou os bilhetes no triturador de papel. Dórian foi até a sala comum de estudos e biblioteca, verificou a agenda física em cima, separou os livros para preparar a aula da noite e memorizou os telefonemas que tinha dar, as mensagens eletrônicas que tinha que dar e os livros e revistas que tinha que consultar. E por fim foi até o próprio escritório, que ficava ao lado da sala de estudo e biblioteca. Iria preparar os apetrechos de trabalho, papel e caneta nanquim, olhar as anotações do dia anterior e ver onde tinha parado no planejamento. Para depois ir preparar a mesa para tomar o café da manhã junto a esposa Luen.       

            Mas ao tentar abrir a porta, ela não se abriu, Dórian levou a mão no bolso e procurou a chave no bolso do robe de seda azul de dormir, tentou abrir a porta com dificuldades e descobriu que a velha máquina de escrever continental estava em cima da mesa de trabalho. Dórian olhou para o velho objeto reformado e o professor universitário e revisor de textos científicos sentiu um ódio animalesco vindo da máquina. Foi Luen que a escolheu, era para ser um presente para Dórian, uma peça decorativa, escolhida em uma loja virtual.

Peça decorativa comprada, embalada e enviada, para depois Luen a achar combalida e que deveria ser reformada e Dórian não soube como, mas Luen encontrou um especialista em consertos de máquinas de escrever. Luen não deixou que o senhor de ascendência teuta levar a peça para o ateliê, Luen queria que ele restaurasse a peça em casa.    

          Dórian não soube os motivos, mas tudo era estranho, como a coisa se dava, Luen sempre foi, toda trabalho, mergulhada e afogada em trabalho, assuntos domésticos, ficavam fora do radar de Luen. Dar e receber presentes surpresas não faziam parte do universo da esposa de Dórian. O professor, então fez o que de melhor fazia, deixou que as coisas se resolvessem por si só.

E não muito tempo depois, em um intervalo de aulas a noite, na sala dos professores, com as fofocas correndo solta, Dórian que as evitava, mas não estava unine as fofocas, descobriu a última e mais quente fofoca no mundo acadêmico. O mundo das ciências humanas e sociais, que um velho e conhecido antiquário de ascendência teuta, o senhor distinto tinha recebido uma encomenda, um restauro de uma velha máquina de escrever alemã. E que o antiquário reconheceu uma peça sendo do ditador alemão, a peça era usada pela secretária pessoal do Führer, o líder máximo do Terceiro Reich.

 

Fragmento do livro Sono Paradoxal, de Samuel da Costa, poeta, contista e novelista em Itajaí, Santa Catarina.

Contato: samueldeitajai@yahoo.com.br

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