Por Fabiane Braga Lima (Rio Claro, SP)
Eu costumava observar a moça, por breves instantes todos os dias. Ela era uma pintura viva, uma jovem bonita, mas sempre triste. Logo de manhã, bem cedo, ela saia apressada, com sua mochila nas costas, para enfrentar as lutas diárias. Colocava o lixo no portão e respirava ofegante e seguia em frente. Eu sempre apreciava essa cena, tão comum para muitos, mas ela me chamava a atenção. No final da tarde, estava ela de volta ao lar, parecia chegar triste e muito abatida.
Novo dia, lá estava ela de novo, segundo a mesma rotina, mochila nas costas, olhar triste, partindo para o ponto de ônibus próximo. No começo de um dia, percebi que a rotina fora quebrada, ela demorava para ir ao trabalho. E havia me acostumado a vê-la partir e chegar diariamente, apesar de não a conhecê-la pessoalmente. Como moro ao lado, eu fui ver o que ocorrera.
— Olá, tem alguém em casa? — Resolvi chamá-la assim, eu não sabia sequer o nome da mulher, tive um mau pressentimento.
De repente, ela aparece na porta. Estava machucada, haviam vários hematomas em seu rosto.
— Estou bem, ando gripada, vizinho. — Respondeu constrangida, ainda dentro de casa. Mas, era mentira dela, pois não estava com gripe. Descobri depois, que ela era uma dedicada professora de história, em início de carreira, que trabalhava em três escolas todos os dias, mas estava sofrendo várias agressões.
Eu, um completo estranho, um desconhecido qualquer e ela me convidou para entrar na sua residência. Ao adentrar, notei que era uma casa bem simples e modestamente decorada. Mas, eu vi que tinha as melhores de todas as decorações possíveis, vi livros variados de todos os gêneros e modalidades e estavam por toda a parte em todos os cômodos da casa.
A dona da casa, me conduziu para a sala de estar, ela acabará de passar um café, no coador de pano. Sentamo-nos à mesa, ela me serviu uma xícara de café preto e, sem sequer perguntar o meu nome, contou das agruras que ela estava passando, naquele exato momento da vida.
Confidenciou-me que era de origem humilde e conseguiu se formar em história, a duras penas. E uma vez formada fez concurso público, foi dar aulas na rede pública de ensino e depois na rede privada de ensino também. Contou-me dos assédios morais e agressões sofridas, dentro e fora das salas de aulas, por alunos, alunas e colegas de profissão. Ameaças de morte e até uma agressão física, nas duas redes de ensino. Eu, sem nada dizer sobre isso, ouvi de tudo isso com profundo pesar no coração e na alma, depois disto forjamos uma bela e profunda amizade. Conversamos sempre que possível, aos finais da tarde, à tardinha, tomávamos café eu contava da minha mãe professora e das agruras que eu a vi passar e o que ela me contava. Coisas boas e ruins que uniam as duas professoras.
Eu filho de professora
primária, além de vê-la partir e chegar do trabalho, agora no começo da noite,
eu vejo aquela mulher forte, sentada na varanda da casa, preparando as aulas,
corrigindo trabalhos, tão dedicada, simultaneamente, desvalorizada da vida…!
Fabiane Braga Lima, poetisa, contista e novelista em Rio Claro, São Paulo.
Contato:
debragafabiane1@gmail.com
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