Por Samuel da Costa (Itajaí, SC)
Após uma grande confusão social ou mudanças bruscas em uma sociedade, é quando as águas baixam, é que são elas. Não cabe aqui, neste pequeno e singelo espaço, se debruçar em análises conjunturais profundas. Perspectivas abissais, que este singelo narrador não as têm. Só cabe dizer que no início do século XXI, uma onda progressista, inundou as urnas com votos vermelhos. E tradicionais caudilhos em todo o país, saíram do poder via voto popular. O que me cabe dizer é que eu, homem negro, marxista, do baixo clero do funcionalismo público local, experimentaria rescaldos, frutos do embate da política nacional.
E lá estava, de novo, no limbo, pois mais uma vez, fui mobilizado para proteger um aparelho educacional do estado. E como nada é simples quando se trata dos aparatos estatais. Uma simples transferência de local de trabalho, de membros do aparato estatal podem causar pequenos e grandes atritos.
Pois bem, fui assumir o meu novo posto de trabalho, era em um bairro tradicional de classe média, perto da zona portuária, saquei as chaves do bolso, chaves que peguei na base da minha secretária. Ao adentrar do aparelho, e dar uma geral, no lugar que iria cuidar e descubro que as chaves que me repassaram não abriam nada, somente o portão da frente. Em suma, eu ficaria ao relento a noite inteira, perspectiva nada boa para quem vive no sul.
Pois bem, depois de uma noite fria ao relento, fui atrás das ditas chaves, fui até a base, a sede do aparato que pertenço, que fazia e faço parte neste exato momento que narro está crônica muito pessoal. Então, eu diante da minha superiora hierárquica, me deu duas hipóteses, ou ficava a noite toda ao relento ou mudaria de posto. Eu, comprometido com a luta de classes, comprometido com o bem estar coletividade, da classe à qual pertenço, fui buscar o meu direito de receber as chaves do aparelho, a qual eu deveria cuidar.
E lá estava eu um nível acima, na sociedade estratificada, eu na sede do poder local, solicitando uma audiência com o alcalde local. Foi atendido por uma belíssima secretária, muito parecida com aquela, que anos futuros balançaria um molho de chaves, na minha cara me infantilizando. Então a secretária, assustada e com um sorriso amarelo, me encaminhou para o chefe de gabinete, agendou para a manhã do dia seguinte. Voltei para casa, com um senso de dever cumprido, hora veja, horas depois fui visitar a minha mãe, ao vê-la nervosa fiquei com medo, sim eu homem feito, tinha e tenho medo da minha mãe. E nos muitos ridículos da vida, ela me disse enfurecida, que o meu superior hierárquico, foi ter com ela uma conversa, o dito cujo do meu chefe, esbravejando me ofendeu.
Eu volto para as densas alturas do poder, a sede do poder local, eu enfurecido com o drama familiar, que se resumiu pela disputa das chaves do aparato educacional, a qual eu tinha direito. Repassei para querubina de ébano, o que se passou, na casa da minha mãe. A secretária do alcalde local, também enfurecida com a situação tragicômica muito particular, antecipou a minha reunião com o chefe de gabinete.
Lá estava eu, diante do chefe de gabinete, político que sofreu uma derrota amarga, na tal onda progressista acima mencionada, o político de quatro costados, atônito ouviu o meu relato. O experiente político, me disse para voltar para casa que ele iria resolver o caso, nem perguntei qual, a das chaves ou da ridícula visita que a minha mãe recebeu do meu chefe funcional.
Pois bem, passei mais uma
noite ao relento, e ao meu chefe imediato veio pegar o meu ponto, e nada de
chaves, somente uma ordem de serviço dando conta que eu retornaria para o meu
antigo posto de trabalho. E que se seguiu após, esse caso sui generis, foram
escaramuças ridículas, comigo e outros colegas de fardas com o dito cujo que
foi reclamar de mim, para a minha mãe.
Fragmento do livro Dos Ridículos da Vida, de Samuel Costa, contista, poeta e novelista em Itajaí, Santa Catarina.
Contato:
samueldeitajai@yahoo.com.br
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