Por Samuel da Costa (Itajaí, SC)
Relato aqui, uma passagem emblemática da minha vida, do eu, um funcionário público do baixo clero. Na época, eu vagando daqui para acolá, em um limbo eviterno, de quem sai do nada, rumo a lugar nenhum. Pois lá estava eu, no primeiro decénio do século XXI, com um filho para chegar, com pouco dinheiro no bolso e sem um teto acima da minha cabeça.
Pois bem, para além de relatar os meus dramas pessoais, pois o foco aqui não são os meus dramas, que são muitos e são somente meus. Foi acolhido por um bom amigo, também membro efetivo do aparelho repressor do estado local. Esse meu bom amigo, me abrigou na casa dele, no meu momento mais difícil da minha vida. Isto diz mais do meu bom amigo, do que de mim mesmo.
Mas, indo direto ao objetivo aqui, este meu bom amigo, que um dia foi das forças de segurança estadual, me chamou para conversar em um canto. Estávamos de folga do trabalho e longe das influências dos nossos uniformes e da instituição chamada estado. Uma conversa séria longo calculei, como bom marxista e materialista que era e ainda sou e pretendo morrer assim. Bom, o problema em si eram dois pequenos moldes, mas não eram moldes quaisquer, eram moldes de balas, de munição.
Assunto sério? Sim, um ex-policial com moldes de munições na garagem? Problemas à vista, meus queridos e queridas. Depois de eu ouvir uma breve história, de como o meu fraternal amigo, de como ele ter encontrado os moldes em um bota fora, um depósito de lixo informal.
Pois bem, o drama é que fazer com os moldes, era essa a perguntar, como no entendimento do meu bom amigo, euzinho era um homem sábio, eu poderia apontar o caminho certo. Mais uma vez, pois bem, eu sábio? Credo! Mas vamos lá, às vezes problemas complexos, demandam soluções simples, digo isto contrariando séculos de análises conjunturais de pensadores ocidentais. É simples assim.
Senti-me, naquele momento, um pouco como um Mefistófeles, por um breve momento, mas o bom senso tomou conta e expus a primeira problemática. Como ex-policial e há época ostentava um cargo menor, mesmo assim sendo membro do aparelho repressivo do Estado. Ele tinha a iminência de receber uma visita das forças de segurança na garagem dele. E encontrar um molde para balas trinta e oito e outro molde de bala quarenta e cinco. Munições para revólveres, pistolas automáticas, submetralhadoras e metralhadoras.
Para uma simples problemática temos duas soluções, uma era vender as peças no mercado negro de armamentos bélicos. Arriscado? Sim! E ter na consciência de ter alguns em algum lugar fabricando munições para revólveres trinta e oito, pistolas quarenta e cinco, submetralhadoras e metralhadoras não era e não é um cenário bom. A segunda solução, também simples, era uma doação, sim doar as duas peças, para o museu local. Para um aparelho do estado, simples assim!
E o meu bom amigo, me olhou
desconfiado e me perguntou qual caminho à seguir. Pois bem, eu disse que ela
era quem deveria escolher o caminho a seguir. Resumo da ópera, do dia seguinte,
fomos rumo ao centro da cidade, rumo ao museu municipal fazer uma doação.
Fragmento do livro Dos Ridículos da Vida, de Samuel da Costa, contista, poeta e novelista em Itajaí, Santa Catarina.
Contato: samueldeitajai@yahoo.com.br
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