Por
Humberto Pinho da Silva (V.N. de Gaia, Portugal)
São
quatro da tarde. Entro em casa de chá da baixa. O salão está quase despovoado.
Junto ao balcão magote de adolescentes soltam gargalhadas escandalosas, sob o
olhar reprovador da empregada.
Ao
meu lado, na mesa vizinha, dois roliços sujeitos, entrados em idade, dialogam a
meia voz. No passeio, rente à parede, casal de namorados grudam furiosamente os
beiços, e senhora, de imenso chapéu cor-de-rosa, que acaba de sair de viatura,
lança-lhes gesto de indignação, arregalando os olhos.
A
conversa, que desenrola-se ao meu lado, anima-se. Um deles, estendendo a mão, a
jeito de orador de comício, e de olhinhos fuzilantes, reclama: - “Trabalhei
como um burro. Privei-me de tudo, e agora…”
Pus
as orelhas à escuta: - “ Via colegas tomar cervejitas, beber cafezinhos, em
alegres farras… e eu nem férias. Tudo era aforrado.”
- “
Comprei apartamento e pus um dinheirinho a render. Agora… é o que se vê! O
caseiro ausentou-se com a chave. O imposto sobre imóveis, subiu
assustadoramente, e os descontos que o banco faz, são tais, que o juro é uma
mirreca.
Depois…
eu, que era chefe, recebo de pensão menos que o salário mínimo de muitos
países.”
Ergui-me.
Pousei duas moedas sobre a mesa, e acenei ao garçon.
Já
na rua, entre a multidão que afluia para a Praça, indiferente, meditava no que
ouvira, recordando as sábias palavras de Alexis Carrel, que havia lido na
juventude, em “O Homem Esse Desconhecido”. “ Se um homem economiza algum
dinheiro para sua mulher e para educação dos filhos, esse dinheiro é-lhe
roubado por financeiros audaciosos. Ou, então, é-lhe tirado pelo governo, e
distribuído àqueles cuja imprevidência, aliada à imprevidência dos industriais,
banqueiros e economistas, os reduziu à miséria.”
E de
regresso a casa, após o jantar, ainda ecoavam dentro de mim, as desoladoras
palavras do velho senhor: “ Trabalhei como burro. Privei-me de tudo… e agora
é o que se vê! …”