Revista literária virtual de divulgação de escritores, poetas e amantes das letras e artes. Editor: Paccelli José Maracci Zahler Todas as opiniões aqui expressas são de responsabilidade dos autores. Aceitam-se colaborações. Contato: cerrado.cultural@gmail.com
quarta-feira, 14 de abril de 2021
quinta-feira, 1 de abril de 2021
O DOUTOR (miniconto)
Por Paccelli José Maracci Zahler (Brasília, DF)
Morava na cobertura com piscina e estava com o saldo
devedor além das suas possibilidades.
A taxa de condomínio estava atrasada e a taxa extra, em
execução judicial.
Tinha carro do ano, financiado em 60 meses.
Tinha celular de última geração, financiado em 24 meses.
Tinha cachorro de raça cheio de pulgas e com problemas de
desnutrição.
Nas reuniões do condomínio, fazia exigências e botava
banca, ameaçando entrar na justiça contra quem falasse qualquer coisa dele ou
de suas contas atrasadas.
Não respeitava a faixa de pedestres e ainda xingava quem
fazia sinal para parar.
Gostava de azucrinar a vizinhança fazendo barulho nas altas
horas da madrugada.
Para mostrar a sua virilidade, pagava para as garotas de
programa gritarem e gemerem como se ele estivesse arrasando na cama e lhes
proporcionando prazer.
Exigia que os empregados humildes o tratassem por “doutor”.
O EMPRÉSTIMO (miniconto)
Por Paccelli José Maracci Zahler (Brasília, DF)
Ele ocupava um cargo de alta direção, mas vivia atolado em dívidas.
Quem o via, dizia que ele estava bem. Mas ele aparentava
mais do que realmente tinha.
Dirigiu-se a um amigo e pediu:
- Me empresta R$ 20 mil?
- Posso te emprestar, porém, não por muito tempo!
- Eu te pago logo, pois ainda tenho alguns papagaios para
pagar no banco.
E o amigo emprestou.
Passaram-se dias, meses...
- Pedro, e aquele dinheiro que te emprestei? Quando me irás
pagá-lo?
- Estás me chamando de caloteiro? Não falo mais contigo.
Não sou mais teu amigo.
Não falou mais, nem pagou o empréstimo.
OPRESSÃO, A DURA REALIDADE... (miniconto)
Por Paccelli José Maracci Zahler (Brasília, DF)
-Mãos na cabeça e documentos!
- Sou um trabalhador registrado! Vejam meus documentos!
- Cala a boca, vagabundo! Mãos na parede!
- Ok, pode liberar!
- Sim, sargento!
A honra e a dignidade de um humilde cidadão assalariado
jogadas na lata do lixo.
A ORIGEM DO CHIBO (Adaptado)
A
ORIGEM DO CHIBO (Adaptado)
(De
Vagner Garcia “Seu Negro”)
Por Severino Moreira (Bagé, RS)
O "Tio Negro", como é chamado pela “parentalha inteira” é um
índio por demais conhecido nos arredores de Bagé, onde tem uma
"chacrita", ali perto do cemitério dos Azevedos, e vive, até hoje,
puchando teto de umas vaquinhas e vendendo leite na cidade.
Pois, ora vejam “que certa feita” eu estava mateando com esse vivente, à
sombra de um guabijuzeiro, ao lado da vivenda da chácara, quando começou a me
assuntar dos sacrifícios que na vida já havia passado.
Segundo o próprio há algum tempo fora dono de um pedaço de campo, de
tamanho bem regular, ali no Passo do Tigre, que na verdade é um dos galhos do
rio Jaguarão e nesse campinho criava uma média de cinqüenta a sessenta cabeças
de gado.
Acontece que o campo era praticamente improdutivo, pois as enchentes, de
quando em vez, levavam uma safra inteira água abaixo, e na região ainda havia
muita paca, cutia, capincho lebre e veados tudo bichos "flor de
roceiro" que chegavam a andar aos bandos lambendo tudo o que o vivente
plantasse, e se não bastasse o campo era virado em pajonal que fazia com que o
gado vivesse bordado de carrapatos, e para piorar a sorte tinha cada sumidouro
que, de quando em vez, achava alguma vaca só com as aspas para fora dos
atoleiros.
Resolveu, então, vender o gado e povoar o campo com umas borregas
bueníssimas, todas na casa de um ano, no máximo ano e meio. Rebanho de encher
os olhos, e como ovelha não é pra mato, e tampouco anda em banhados, estavam
livres dos carrapatos e dos atoleiros.
Dividiu o rebanho em vários potreiros, cada lote de quinze ou vinte com
um dos carneiro contrabandeado do Uruguai, bichos de raça apurada que,
certamente, se traduziriam em uma bela safra de cordeiros para esquilar no ano
seguinte.
Bueno, passou um ano e a safra de cordeiro não foi além de meia dúzia, e
no ano seguinte a coisa não melhorou muito.
Imaginou ter feito um mau negócio em contrabandear os carneiros. Tinham
boa raça, mas provavelmente fossem animais de baixa fertilidade por alguma
razão desconhecida, e por isso trocou a carneirada por borregos de procedência
conhecida, só que a produção foi ainda menor.
Desiludido capou os carneiros e
começou a carnear as ovelhas, em uma média de duas ou três por semana e foi
vendendo a carne na cidade, mas à medida que o rebanho foi diminuindo começaram
a aparecer ovelhas prenhas, e para não pecar por exagero, digo que das ultimas
trinta, não falhou nenhuma.
Era estranho, mas imaginou ter deixado algum carneiro mal capado, pois na
vizinhança ninguém criava ovelha. Assim mais por curiosidade do que por
ambição, nos cordeiros, o resto das ovelhas se livraram da faca.
Lhes conto, e acredite se quiser, nasceu uma bela cordeirada mas não
tinham lã, e sim uma certa pelagem, algumas baias, outras brancas e lhes digo o
pelo chegava a luzir quando no Sol.
Só, então, se descobriu que as ovelhas entravam no cio, mas não
emprenhavam porque os carneiros e os veados ficavam peleando pelo domínio do
rebanho, mas uma vez castrados, os carneiros perderam o interesse pelas ovelhas
e os veados assumiram definitivamente o domínio.
O problema é que nunca se viu uma cordeirada mais arisca e roceira, não
tinha cerca que segurasse, nem lavoura que durasse e como gostavam de um
lajeado aqueles bichos.
Hoje, já acostumado com a idéia, e aproveitando todo o tempo que teve
para pensar no assunto, chegou a conclusão que...
“Dessa cruza vem a origem do cabrito”.
É como diz o Tio Negro, “morro de
véio e não aprendo tudo o que o mundo tem p´ra ensinar”.
CARNEIRO GUACHO
Por Severino Moreira (Bagé, RS)
O Bonifácio Lopes era um índio campeiraço, que vivia changueando,
naquelas campanhas lá de Santaninha da Boa Vista, na época distrito de Caçapava
do Sul.
Dizia ser meu parente, por eu ter, embora não assine, o sangue dos Lopes
correndo nas veias, parentesco esse até possível, pois o cuera era do tipo
“guri abandonado” e não sabia quem fora a mãe, muito menos o pai, que o tinha
botado no mundo. E se tinha nome e sobrenome, era porque um estancieiro
apiedado lhes recolhera ainda guri, batizara e lhes dera vida de gente.
Era peão pra todo o serviço, campeiro como poucos, desses acostumados a
pealar lebre a campo fora. “Dizem até” que certa feita laçou um avião em pleno
vôo e quase se “estrepou”, o que não sei se é verdade, mas sei que era carpeteiro
e assanhado por um baile, apesar de não ser de muita sorte no namoro decerto
por ser além de pobre, mais grosso que canto de galo novo.
Mas, existem dias que até o diabo amanhece à soga e a sorte vira pelo
avesso. Foi num desses dias que, num fandangaço lá na casa do Lovegildo Brião,
a chininha Edmunda, bonita de cara “e de todo o resto”, na verdade, a mais
linda das filhas da viúva Ambrósia, embora cobiçada pela rapaziada toda, foi se
derreter de amor, justamente, pelo Bonifácio, apesar de feio, grosso e
desengonçado.
A moça era, realmente, cheia de predicados, a mãe apesar de solita, tinha
pelas filhas o maior desvelo, e dentro da pobreza que a viuvez lhe permitia, as
criara a altura de qualquer filho de patrão, tal era a conduta das moças.
“E a beleza incrusive”, dizia o Bonifácio.
Fim de baile, despedidas tristes, com uma esperança baguala corcoveando
por dentro do peito, se foi o Bonifácio de volta pro rancho, assobiando uma
“coplita”, que até me pareceu entender... “Vou m’imbora, prenda minha”...
Bueno, passou uma semana e o índio andava que nem cusco à soga, num
desespero de saudade, não via a hora de pegar o rumo de Santaninha, onde dona
Ambrósia tinha um ranchinho de barro e santa-fé, erguido pela própria e as
filhas com todo o sacrifício a custa de lavados, alguma costura e a ajuda de
pessoas de bom coração que por lá nunca faltaram.
Acontece que da estância até Santaninha, se estendiam seis ou sete léguas
de chão e o coitado era mal a cavalo que dava pena, pois tinha um tordilho
velho melado, que só a mango espora e, ainda, puxado a cabresto pra mexer os
quartos de tão ruim que era, num matungo assim, ia levar uma semana pra chegar à
casa da moça, de sorte que emprestei um baio ruano, ainda, de rédea, mas cavalo
com um estado de causar inveja.
Madrugada “muy” grande foi pegar o Bonifácio já com algumas léguas no
rasto de modo que bem antes do meio dia, estava desencilhando em frente ao
rancho da viúva.
Deu uma ração bem caprichada pro ruano, passou uma água nas fuças, numa
gamela que havia ao lado de um quartinho erguido nos fundos do galpão, para as
visitas mais cerimoniosas e se chegou pro rancho pra tomar uns mates, comer uma
bóia bem caprichada, um prato de mogango com leite, pra só então “empeçar” o bendito
namoro, que se estendeu pela tarde e adentrou a noite. até que em razão do
adiantado das horas a Dona Ambrósia educadamente, temendo os falatórios, pediu
ao moço que se recolhesse aos aposentos a ele arrumados, era o dito quartinho,
lá nos fundos do galpão, onde um catre “até com cheiro de Cashemere” lhe
esperava.
Mais contrariado do que boi da verga, sentou no catre, tirou as botas e
as bombachas decidido a dormir pra mode de dar uma aligeirada na noite.
Mas, deixa estar que quando se esticou de todo o tamanho no catre, sentiu
umas reviravoltas nas tripas e com medo de algum acidente que pudesse acontecer
durante o sono, resolveu visitar as moitas.
Era noite de lua ausente, de modo que saiu do jeito que estava, só de
ceroulas, dessas feitas de saco tingido, com as tintas trazidas pelos mascates.
A ceroula tinha sido preta um dia, mas já estava parda, onde até se podia ler,
na região sul do índio, “moinhos rio-grandense”, e tem mais, o buraco menor
era, sem duvidas, o de enfiar a perna.
Pegou o rumo de um chircal, que havia nos fundos do rancho, mas ao cruzar
na porta da cozinha, escutou a conversa das gurias, e viu que vazava luz por
algumas frestas que havia nas tábuas da porta.
Não resistiu e resolveu dar uma "frestiada" no que as gurias
faziam.
Escolheu como observatório, a fresta maior que havia na porta, mais ou
menos a altura de um cabo de pá até o chão, e a cena que viu fez o Bonifácio
morder os beiços, pois estava uma das moças a cavalo em uma gamela de
corticeira, no maior descuido, dando um capricho naquelas partes, que por haver
crianças na volta não vou dizer, mas os maiores entendem bem o fundamento da
coisa. Ou a falta, de fundamento da atitude do rapaz.
O retrato não podia ser mais bonito, e o pobre Bonifácio já estava numa
tremura quando, chegou a vez da sua flor ocupar o trono daquela gamela, de modo
que nessa hora quase enfiou o olho pelo buraco.
A moça arregaçou o vestido até acima da cintura, já sem nada por baixo,
enquanto o peão já quase no limite da loucura, tentava achar um ponto de visão
que fugisse de qualquer sombra do lampião, e com isso acabou ficando com o
próprio recavém arrebitado para cima.
Foi nesse exato momento, que um carneiro criado guacho, enxergou o
Bonifácio e recuando quatro ou cinco passos para ganhar impulso atropelou
metendo uma marrada na região "sul" do coitado, enfiando com porta,
tramela e tudo para dentro, fazendo afocinhar na gamela, e com a melena roçando
o entre - pernas da moça.
Não sei se de susto, mas a moça só atinou a dizer, que tinha água num
jarro no bidê do quartinho, imaginando decerto que o namorado estivesse com
sede, até porque com o susto, ainda, não atinara que o pobre estava só de
ceroula.
Bueno, para encurtar o causo, o meu baio amanheceu na mangueira banhado
em suor, o que prova que o galope foi puxado, e o Bonifácio, mal se despediu, e
desde então, não mais foi visto. Há quem diga que anda se justando em estâncias
no Uruguai e na Argentina, enquanto que a moça mais cobiçada daquele rincão
nunca mais namorou ninguém.
Tudo por causa de um carneiro guacho e, ainda, dizem que ovelha é um
bicho abençoado. Pode isso?
A TRILOGIA DO AMOR, DA PAIXÃO E DO DESEJO
Por Fabiane Braga Lima (Rio Claro, SP)
NÃO
POSSO FUGIR
Não
posso fugir da verdade...
Crueldade!
Amo sem vaidade.
Meu
corpo intacto, padece….
Vejo-lhe
distante, sinto saudade.
Nesse
meu querer adormeço!
Sinto-me
serva desse desejo.
Guardo
n’alma infindo segredo,
Tocar-lhe
e no oculto buscar.
Madrugada
afora não lhe vejo.
Resignei!
Finjo ser rude, forte,
De sua
boca palavras sem nexo!
No meu
coração tanto sentimento,
Indelével!
Como não querer, almejar,
Amo-lhe,
em todo momento…!
MEU
ANJO
Um anjo
de luz me abraçou!
Aceitei,
pois estava ferida.
Sem
permissão me beijou,
Sua
essência transbordou.
Naquele
dia conheci o amor
Minha
dor se calou, o senti.
Minha
alma se alegrou,
Despiu-me
sem permissão.
Hoje,
sinto sua presença
Chega
sem que eu perceba,
Em
minha poesia, ou crença.
Meu
anjo, onde moras!?
Coração
incauto implora,
Traz-me
magia na poesia…!
REFÉM
Fez-me refém de tua loucura,
Grito contido, desejo omitido.
Preciso possuir teu corpo.
Insanidade!
***
És a primícias que ofereço aos deuses,
Mistério que toma meu corpo,
Invadi meus desejos libidinosos,
Transbordando de vasta saudade.
Mas não lhe sinto,
Se esconde em versos profanos,
Heresia, me faz teu
atroz pecado!
***
Imploro!
Deixe-me sentir teu
corpo sobre o meu.
Diga-me se é
loucura, fantasia!?
Não me torture.
Afasta-se do nada, deseja-me intensamente,
E ignora-me. Juro!
Não consigo
desvendar tuas inúmeras faces,
Nem ao menos lhe
esquecer.
***
Complexidade que alimenta,
Paixão que aos poucos machuca,
Minha cura, sem juras...!
Desatino ou
destino!?
Contato:
bragalimafabiane@gmail.com
LONGOS BEIJOS
Por Vivaldo Terres (Itajaí, SC)
Como
podes ser tão deslumbrante e bela.
Com
tanto fascínio que a todos encanta.
Queria
eu ter o privilégio
De te
beijar a boca.
***
Se
assim fosse...
Um dos
meus sonhos seria realizado!
Pois
um beijo como o teu...
Jamais
foi me dado.
***
Quem
sabe um dia possa acontecer,
De
algo maravilhoso a nos envolver.
Então
terei a certeza
Que
esse dia chegara,
E
longos beijos iremos trocar.
DO REMINISCENTE BILHETE PARA LAURA
Por Samuel da Costa (Itajaí, SC)
O tempo apagou
As nossas memórias
Benquistas
***
O tempo curou
As nossas doridas feridas
Mais que profundas
Benfazeja amiga
***
O tempo passou e encaneceu
Os nossos sibilinos cabelos
Estimada
***
Mas outono chegou por fim
Nas nossas vidas cotidianas
E revelou o quão leve
São as nossas
Doces lembranças reminiscentes
E o quão pesadas
São as nossas amarguras
***
O tempo apagou
Todas as nossas memórias
Juvenis
MULHER PRETA, SIM!
Por Clarisse da Costa (Biguaçu, SC)
Muitas vezes parece que a
gente está militando o tempo todo, mas na verdade o que a gente está buscando é
apenas respeito. Ao me ver não cabe mais em pleno século XXI a pessoa de
pele escura ser chamada de mulata. Mesmo que um costume cultural e que muitos
não vejam isso como ofensivo, as pessoas deveriam ter a consciência de que nem
todas as mulheres negras gostam de serem chamadas assim, mesmo que para muitos
seja apenas um elogio.