Conversando com Deus (Vânia Moreira Diniz, Brasília, DF)
Como Te Pressinto (Vânia Moreira Diniz, Brasília, DF)
Vânia Moreira Diniz, poetisa, escritora, presidente da Academia de Letras do Brasil, Seccional Distrito Federal - ALB/DF
Revista literária virtual de divulgação de escritores, poetas e amantes das letras e artes. Editor: Paccelli José Maracci Zahler Todas as opiniões aqui expressas são de responsabilidade dos autores. Aceitam-se colaborações. Contato: cerrado.cultural@gmail.com
segunda-feira, 2 de março de 2015
UMA CANTIGA SÓ (MEMÓRIAS DE CORA)
Por Marcos Leonardo de Souza (Anápolis, GO)
Uma
cantiga só
Faz
me deitar ao pó
Torno
a ser criança
Renova minha esperança
Uma
cantiga só
Cantiga
de ninar
Cantiga
de amor
Cantiga pra sonhar
Uma
cantiga só
Lembranças
que me dão um nó
Aquela
casinha da ponte
Retratam
meu horizonte
Uma
cantiga só
De
doceira, lavadeira
Breve
vida passageira
Bela
vida traiçoeira
Uma
cantiga só
De
Vila boa de Goiás
Dos
canaviais, dos cafezais
Dos
becos e dos quintais
PEÃO VERDADEIRO
Por Marcos L. Souza (Anápolis, GO)
Logo
cedo quando me preparo pra lida
Coloco
no embornal o cafezinho e a marmita
Vida
de Peão não é brincadeira
Mais já me acostumei com o sobe e o desce da ladeira
Levo
comigo meu laço de três dobras
Um
par de esporas nas botas
Um
chapéu panamá na cabeça
E a minha fé pra que eu nunca me esqueça
Debaixo
de Sol ou debaixo de Chuva
Não
tenho preguiça de trabalhar
Lido
com a roça e com a reis astuta
Eu me sinto feliz, aqui é meu lugar
Volto
da lida com a poeira no rosto
Mais
com a alma lavada e sem nenhum desgosto
Se
me perguntam como é minha vida de Peão
Respondo
orgulhoso e sem medo
É minha verdadeira paixão
OBJEÇÃO
Por Pedro Du Bois (Balneário Camboriú, SC)
Objetivo saber
sobre
o tanto perguntado. Ergo
a mão em auxílio: o verbo
dispara.
O objeto se move
no extremo aposto
como prova.
Não objetivo reconhecer
o sinal e o signo.
Ergo a mão na demonstração
da desigualdade.
O DINHEIRO TRAZ FELICIDADE?
Por Humberto Pinho da Silva (Vila Nova de Gaia, Portugal)
Há muitos e muitos anos, tantos
que já se perdeu a conta, nas proximidades das margens do mar Egeu, havia rei orgulhoso,
senhor de riquezas sem fim, resultante da venda de pepitas de oiro do Pactolo,
afluente do Hermo, rio onde se banhava o infeliz Midas.
Residia em maravilhoso palácio,
belamente decorado de luxuosas alfaias de incalculável valor; e em rijas arcas
de ferro encerrava fabuloso tesouro, mais rico que a caverna de Ali-Babá.
Certa ocasião recebeu a visita
de Sólon – narra Plutarco na “ Vida de Sólon”.
Creso, assim se chamava o rei
orgulhoso, rejubilou de contentamento e saudou a feliz oportunidade para
deslumbra-lo, mostrando-lhe toda a magnífica riqueza que encerrara nos sólidos
cofres reais.
Concluída a longa e pormenorizada
visita, interroga-o envaidecido:
- “ Sólon: conhece homem mais
afortunado que eu?!”
O filósofo entortou
pensativamente a cabeça, sacudindo-a num gesto positivo: Que sim; e nomeou rol
de nomes completamente desconhecidos para Creso.
Atónito com o que acabara de
escutar, o rei encarou Sólon, e sorrindo com ar de dúvida, indagou quem eram as
ilustres individualidades.
Sólon aprumou-se, passou a mão
pelo rosto, e ergueu os olhos para o céu, como pedindo inspiração aos deuses; e
de voz bem timbrada informa-o: Que eram de facto desconhecidos, mas de grande
virtude e viveram despreocupados, porque não possuíam bens a guardar.
Como Creso permanecesse de
olhos vagos, refletindo, por momentos, no que ouvira, Sólon acrescentou, num
leve murmúrio:
- “ Agora ainda são bem mais
felizes…porque já faleceram e não receiam as incertezas do futuro…”
Lançou em graça, o rei, o
último e espiritoso dito, e soltou jovial e ruidosa gargalhada, que ecoou pelos
largos e longos corredores do majestoso palácio.
Correram os anos pacificamente…
com eles, o tempo apagou, quase por completo da memória do rei, o diálogo que
tanto o divertira.
Ciro II, rei da Pérsia, tomou
conhecimento da imensa fortuna de Creso e pensou invadir a Lídia.
Receoso, Creso reuniu as
melhores tropas do reino e alcançando largas alianças, com monarcas amigos,
esperou-o nas margens do Hális. Facilmente foi derrotado, sendo preso e
severamente humilhado em Sardes.
Ciro II saqueou o palácio e
levou o tesouro que Creso tanto se orgulhava.
Os generais persas, com
assentimento de Ciro, pensaram matar o rei. Despojaram-no dos ricos mantos
reais. Entregaram-no ao escárnio da soldadesca e condenaram-no a morrer na
fogueira.
Nessa situação aflitíssima,
sentindo altas e doiradas línguas de fogo a lamberem-lhe a macia pele, bradava
desesperado, cheio de dor: “ Oh Sólon! …Oh Sólon! …Sólon! …Sólon! …
Narram historiadores, que Ciro
apiedou-se da sorte do infeliz rei, livrando-o da morte cruel.
Diga, agora, o leitor amigo, se
acredita – depois do que leu, – se o dinheiro traz felicidade.
Se ainda pensa que sim,
interrogue milionários no declinar da vida ou vítimas de graves enfermidades, e
ouvirá de suas bocas, que não.
A felicidade é como disse
Campos Monteiro, em “ Ares da Minha Serra”: “ É contentar-se a gente com o que
tem e ganhar com honra e sossego o pão de cada dia.”
REPLICAR
Por Pedro Du Bois (Balneário Camboriú, SC)
Replicante: assunto
rediscutido
até a exaustão
da idéia.
Tolerância afastada
na
pressa de ir embora.
Ressabiado saber da contestação
da hora. Contração do argumento
em falsas premissas.
Primeira vez que falamos
sobre
o assunto. O repicar
dos sinos.
SOU MATUTO SIM
Por Marcos L. Souza (Anápolis, GO)
Claro
que gosto do mato
Fui
criado em espaço
Ainda
durmo na palhoça
O meu carro é uma carroça
No
meu rancho é só fartura
Pois
trabalho sem lamuria
Não
me envergonho de nada
Nem da minha mão calejada
Carrego
pra onde for
Um
canivete e um couro que fiz
Nunca
pra fazer maldade
Só pra lembrar a minha raiz
Tenho
orgulho de ser catira
Tenho
orgulho de ser da roça
Não
me canso dessa lida
Não me vendo por aposta
Quero
viver assim
Até
que chegue o fim
E
até lá eu vou dizer
Que sou matuto até morrer.
Sobre o autor: Marcos L. Matos é poeta, escritor, membro da Academia de Letras do Brasil, Seccional Anápolis, GO.
INFINITO
Por Pedro Du Bois ( Balneário Camboriú, SC)
Penso o infinito
e bato a face
contra a porta. Distâncias
castigam por me saber perto.
Portas invadem domínios
cortados em salas e quartos.
O infinito dispensa o fato
de não acontecer ao acaso.
A SENHORA MARIA
Por Humberto Pinho da Silva (Vila Nova de Gaia, Portugal)
Quando a conheci teria talvez
uns doze anos. Andava modestamente vestida. Era magra e de estatura meã. Tinha
o rosto moreno, cor de terra, faces sulcadas de rugas, e olhos castanhos,
encovados, tristes, baços.
Arrastava desbotadas chinelas
vermelhas, de corda, pelas ruas de Santa Marinha (Gaia), com saco de
serapilheira ao ombro, a recolher papel, que vendia ao farrapeiro, que havia na
rua de General Torres, perto da fábrica de louça da Torrinha.
Era caseira de minha mãe.
Pagava pela casa, que valia várias dezenas, se não centenas, apenas vinte
escudos!
Minha mãe gostava muito dela.
Certa vez disse-lhe a medo, não fosse melindra-la: que podia residir na casa de
graça.
Agradeceu, mas declarou
emocionada:
- Posso pagar o aluguer…Enquanto
tiver saúde, com a ajuda de Deus, hei-de sempre cumprir as minhas obrigações.
Todos os meses, logo no início,
lá vinha a senhora Maria, com a nota verde de vinte escudos, para “ cumprir a
sua obrigação”
Um dia minha mãe caiu
gravemente doente. Após meses de calvário, que a levou à cegueira e a dores
lancinantes, viria a falecer numa manhã fria, mas solarenga, de Novembro.
O quarto encheu-se de coroas e
palmas, de vistosas e caras flores. Cada uma trazia cartão com duas palavras
escritas à mão: “Sentidos Pesamos”
Quando meu pai, de olhos
humedecidos, ainda bastante pesaroso, foi recolher os cartões, que estavam
sobre a salva de prata, encontrou, entre eles, um, que apenas dizia: “Da
Senhora Maria”.
As lágrimas escorreram-lhe dos
olhos. A pobre mulher, que nessa ocasião era velhinha, e ainda mais pobre do
que sempre fora, do pouco que tinha - quiçá do que amealhara para adquirir
medicamentos, - não se esqueceu de ofertar palma, simples, mas bem
demonstrativa da sua gratidão.
Sentimento - tão apreciado, -
mas que anda tão esquecido, nesta sociedade consumista e egoísta, em que
vivemos.
A senhora Maria, como a pobre
viúva do templo, deu mais que muitos empresários e importantes doutores, que
estiveram presentes no cortejo fúnebre.
É que estes deram o que lhes
sobejava, ela o que lhe fazia falta para a sua sobrevivência.
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