segunda-feira, 1 de agosto de 2022

O NASCIMENTO DE UM LIVRO ARTESANAL

 Por Leandro Bertoldo Silva (Padre Paraíso, MG)

SÓ VÊEM O QUE QUER QUE VEJAM

Por Humberto Pinho da Silva (Porto, Portugal)

 

É sabido que o povo não tem parecer. Não passa de mero repetidor do que ouve.

Acredita sem investigar. Crê na mass-media, e pensa consoante ela quer que pense.

Era assim no passado, e é ainda no presente.

Com bom grado aceita qualquer parecer ou ideia, desde que seja repetida com frequência e venha ao encontro de seus desejos e instintos.

Basta que lhe digam: lá fora, as elites pensam assim, para as massas acéfalas, acreditem piamente.

Em geral não vêem o que observam, mas somente o que querem que veja; pensam o que as figuras públicas querem que pensem. Pensam que pensam, mas não pensam.

Em: " Notas Contemporâneas", Eça refere-se a conhecido pintor parisiense, que lhe disse: - "A multidão vê falso" e continuou: - "Vê: em Portugal sobretudo pela aceitação passiva das opiniões impostas, pelo apagamento das faculdades criticas, por preguiça de exame – o publico vê como lhe dizem que é. Se amanhã o Diário de Noticias ou outro órgão estimado, declara que o Hotel Aliança, ao Chiado, é uma maravilhosa catedral gótica, e insiste isto, na local e no folhetim – e numa semana, o publico virá fazer no Largo do Loreto semicírculos estáticos, e verá, positivamente verá as ogivas, as rosáceas, as torres, as maravilhosas esculturas do Hotel Aliança. "

O parecer do vulgo é inconstante: pensa, vê e ouve, o que os fazedores de opinião, querem que pensem, vejam e ouçam.

As elites levam o povo, que é favorável a certa causa, ser amanhã – levado por demagogos, ter opinião contrária.

Não foi Cristo condenado, apesar do povo ser-lhe favorável, a ponto de O proclamarem Messias, e a autoridade romana dizer: que não encontrou motivo para O condenar?!

Bastou sacerdotes hipócritas falarem ao povo, para este mudar de opinião.

Disseram: o povo quer... e quis mesmo...

 

 

 

ESCANINHO DA MEMÓRIA

Por Gilbson Alencar (Brasília, DF)


Não tem o poder da beleza

Não tem o poder do dinheiro

Talentos: poucos

A alegria inocente do menino

transformada, pelo tempo

e pela rudeza humana,

em insegurança

Porradas do acaso, descaso

Segredos confessos

revelados no laboratório

da dor...

Armadilha para o velho,

Fogueira e explosão

O álcool não foi em vão

Queimava por desatenção

O osso quebrado na porta

Crença, descrença

Diálogo com o medo

Nascimento, nome e batismo

A morte do padre

Tijolada na face

A morte da morte

Renascer e morrer

na mesma existência

Pensar e não entender

Respirar involuntário

Ressonância da alma

Lobotomia, anemia

O ferro ardia na veia

O fantasma da bruxa

no quarto dos fundos

da memória...

 (12/07/2022)


ERA FELIZ, E NÃO SABIA!

 Por Dias Campos (São Paulo, SP)


            Cleber morava sozinho em uma quitinete no centro da cidade. E se quisessem definir em que se resumia a sua vida nesses últimos dez meses, acertariam se escolhessem a palavra rotina.

O que mais o entediava era ter que lavar a própria louça. – menos mal que tinha o que lavar.

É fato que essa mesmice vinha sendo quebrada há alguns dias pela visita das conhecidas e teimosas formiguinhas de cozinha.

Em um vaivém disciplinado, esses insetos atravessavam toda a extensão da pia, alcançavam uma lixeira de plástico, escalavam-na confiantes, entregavam-se à comilança, e retornavam para o orifício de onde saíram, felizes e bem nutridas.

No entanto, essas incursões, porque regulares, também já começavam a cansar. E o ramerrão voltou.

Certa noite, quando Cleber lavava, com pressa, o último copo de requeijão – a novela estava prestes a começar –, um pouco de espuma desgarrou-se da esponja e foi cair sobre a fila de formigas, matando algumas e interrompendo o fluxo. É claro que houve um baita tumulto entre as comensais, incluindo as que ainda não sabiam do acontecido, visto que prosseguiam com a marcha, encostavam suas antenas nas bolhas de detergente, e retornavam de ré, esfregando-as instintivamente no tampo, numa tentativa desesperada de se limparem. Por força disso, aglomerações começaram a se formar em ambos os lados da montanha branca.

Cleber sorriu...

Não que essa diversão fosse entretê-lo por muito tempo. Sabia que dali a alguns dias voltaria ao feijão-com-arroz. Mas se o acaso resolvera intervir, que aproveitasse ao máximo!

Daí que bastava começar a lavar os pratos para que o sarcástico prazer ressurgisse. E ele pingava sobre as vítimas as borbulhas letais.

Às vezes, Cleber não se contentava com um único ataque. E gotejava a morte em pontos diferentes das carreiras, distribuindo o pânico entre as sobreviventes e deliciando-se com o corre-corre.

Outras vezes, ele sequer esperava muito tempo para pôr fim àquela correria. Enchia de água o copo que acabara de ensaboar e jogava o conteúdo na parede, de modo que o líquido precipitava-se sobre as colunas feito enxurrada, levando para o ralo um grande número de cadáveres.

Esse divertimento perduraria por um tempo razoável. E Cleber até se espantaria por não se haver enjoado mais cedo.

Mas quando o deleite acabou, um hiato ficava. Era preciso, pois, preenchê-lo o mais rápido possível, haja vista que, pelo que pressentia, os nós do quotidiano retornariam ainda mais apertados!

Foi quando Cleber ouviu a gata da vizinha...

Por não ter sido castrada, o cio desse estupor volta e meia o incomodava; sobretudo quando ela teimava em miar madrugada adentro. E como Cleber tinha sono leve, a libido desafinada impunha aos seus pobres ouvidos uma tortura sem fim.

Ora, se acabar com simples formigas tinha sido tão eficaz no combate à sua monotonia, imagine-se o bem que experimentaria se eliminasse aquele ronronar ambulante?

Neste instante, a campainha soou no andar de cima. Isso, por si só, pouco ou nada o incomodaria, não fosse o fato de que o morador daquela unidade possuía dois poodles, que, como é notório, desandam a latir, aguda e irrefreavelmente, toda vez que alguém aperta o malfadado botão.

O sorriso de Cleber aumentava... Primeiro, ele acabaria com a caçadora de ratos. E os efeitos desse sumiço proporcionariam um bom tempo sem tédio. Após, quando o aborrecimento voltasse, ele desapareceria com os sacos de pulgas. E o consequente alvoroço garantiria um período maior de distração.

E se depois desse extermínio ele voltasse a ficar enfastiado, quem sabe não seria o caso de estender aquela prática para toda a vizinhança, para todo o bairro, para toda a cidade? Afinal, quanto mais comoção causasse, menos entediante seria a sua vida.

Cleber começou a maquinar o gaticídio. Assim como ele, sua vizinha saía para trabalhar um pouco antes da aurora despontar e só retornava tarde da noite. Ao que supunha, ela deixava água e comida suficientes para que o felino aguentasse o dia todo. Mas e se uma “alma caridosa” oferecesse ao bichano algo muito mais apetitoso do que aquela velha ração a que estava acostumado? De certo seria a sua última refeição! O que precisaria fazer, portanto, seria comprar algum tipo de guloseima, temperá-la com um pouco de veneno, torcer para que o apetite da condenada fosse muito maior do que o seu olfato, e introduzir o presente de grego através do vão da porta, que, por óbvio, só era tapado por uma cobrinha de pano quando a locatária estava em casa.

Mas, e se a sortuda já tivesse comido o suficiente? e se ela fosse tão acostumada àquela dieta que não admitisse nenhuma novidade? e, pior, se ela cheirasse o petisco, mas dele se afastasse porque percebeu a toxina?

Bem, concluía Cleber, mesmo que a isca não a atraísse, o burburinho seria instalado, e isso já lhe seria benéfico.

Pois que saísse, comprasse o melhor dos quitutes, e aguardasse a segunda-feira, quando, então, colocaria em prática o seu plano.

Mas bastou Cleber abrir a porta para que estacasse diante do cano de um revólver calibre 38!

Em atitude de puro reflexo, ele ainda tentou fechá-la!...

Mas o sujeito era corpulento, e não teve dificuldades em empurrá-lo para trás.

O estranho entrou, mandou que sentasse, advertiu-o de que ficasse em silêncio, e assobiou.

Em seguida, sua filha, uma jovem de dezesseis anos, entrava bastante encabulada. E não vinha só, pois em cada braço havia um bebê, gêmeos univitelinos a que dera luz há pouco mais de um mês.

Cleber reconheceu-a no ato! E relembrando o que fizeram, deduziu quem era o pai daqueles anjinhos cabeludos.

Trancada a porta, e o “gentil” senhor foi muito persuasivo em sua explanação – pouco lhe importava que casassem, contanto que morassem sob o mesmo teto, a fim de que o sedutor assumisse as suas responsabilidades, provendo o sustento da família e a educação dos filhos.

O rapaz não teve escapatória; até porque, o convincente avô foi bem claro ao afirmar que visitaria filha e netos semanalmente, e armado.

Nem se precisaria dizer que a vida de Cleber deixava de ser enfadonha, rotineira... E a ficha caiu no exato momento em que os bebês abriram o berreiro – um por causa da fome, e o outro porque a fralda ficou cheia.

O ESTRANHO CASO DE ELIZABETH QUIMINE

Por Marcelo de Oliveira Souza, IWA (Salvador, BA)

 

A interessante História de Elizabeth Quimine, deixa-nos de “orelhas em pé”, mesmo diante a incredulidade de muita gente, que tem como nosso “paraíso”  o único lugar no universo como “celeiro da vida”. 

Essa mulher de repente aparece num dos  recantos  do nordeste, comprando inclusive uma ilha somente para ela, onde ela passou a viver por lá,  sendo até  é normal, pois muitos estrangeiros fazem isso, entretanto com o tempo, as atitudes dessa personagem, se tornou cada vez mais suspeita na visão dos habitantes com comportamento anormais, já  de cara as pessoas percebiam que ela tinha comportamentos estranhos, até a sua aparência, não era comum, tinham pessoas que diziam que ela andava meio estranha, não conseguia a desenvoltura de uma pessoa dita normal. 

Como nessas cidades do interior, vila de pescadores, o tempo parece que corre mais devagar, e nesse tempo moroso, foi perfeito para que alguns possam externar as suas mais intrigantes teorias. Até pesavam que a forma desajeitada de andar, poderia dar-se por algum tipo de acidente, mas sabiam que alguma coisa estava errada, pois ela era uma mulher muito inteligente, formada em física, engenharia, matemática, porém para coisa mais simples ela se atrapalhava, essas coisas que só o discernimento humano poderia perceber ao nosso redor, como um simples cumprimento. 

Certo dia os pescadores estavam conversando, quando um deles disse que adorou a chegada da “Rainha Elizabeth” porque ela estava comprando toda sua produção de peixe, era peixe para não acabar mais, o pior que outros pescadores disseram a mesma coisa, somando por volta de 200 a 400 quilos de peixe que ela teoricamente estava consumindo por semana, chamando a atenção sobre esse intrigante assunto. 

A partir daí a suspeitas cresceram sobre ela, o pior que depois de um tempo, apareceram sobre a ilha dessa pessoa, objetos voadores não identificados, os OVNIS, inclusive a nossa querida estranha, ficava na praia da ilha, trocando objetos cilíndricos, com uma boa quantidade de homens desconhecidos, que nem passavam pela vila. 

Com o tempo, a casuística foi aumentando, já não dando mais para ficar somente observando, eles passaram para os militares o assunto. 

O comandante decidiu abrir uma investigação, suspeitando até de terrorismo ou contrabando de armas, sendo presa pelas autoridades, por suspeita de contrabando, mas foi liberada logo depois por falta de provas. 

Mas o militar não se deu por vencido, pediu um mandado judicial para poder ir na ilha da estranha, sendo a primeira vez que desde que ela se mudou para ilha, alguém foi ao local e para surpresa de todos, não era algo que eles estavam esperando, pois não tinha nada lá, apenas um barraco sem portas e janelas, não tinha geladeira, tampouco chuveiro, não tinha nada, nem os restos dos peixes. 

Algumas semanas depois do ocorrido, eles conseguiram achar a mulher zanzando pela ilha, levando-a novamente para investigação. 

Durante o percurso ela disse que queria ir ao banheiro, eles a levaram para um bar próximo, viram que não tinha como fugir dali e liberaram para o “xixi”. Como estava demorando muito, os militares arrombaram o bar e não tinha ninguém, deixando todos sem saber como ela fugiu, porque não tinha nem janela. 

Essa pessoa segundo pesquisas, apareceu em outros lugares, mesmo assim, ninguém aparentemente sabe dizer o que aconteceu, eu tenho minhas teorias e vocês? 

 

A FORÇA DO ESCRITOR

 Por Marcelo de Oliveira Souza, IWA (Salvador, BA)

 

Sem destino, perdido,

Pobre, desvalido.

Nunca olhado...

Muito menos, notado,

Preso em suas angústias

Em suas ideias...

 

Ele sonhava com tudo

Mas não possuía nada

Na força da palavra

Escrita,

Começou a se encontrar.

 

Escreveu, rimou

Cresceu, imaginou

Seu sonho sedimentou

Onde sua estrela começou brilhar.

 

Contou, uniu, se engajou

Casou-se com a rima

Rimou no casamento,

As palavras deram-lhe o pão.

 

Um sonho construído

Fez-se a emancipação

Agora, amado

Antes, armado

com a dor ...

Ganhou vida

Alegria e muito amor,

Tornando-se um verdadeiro

E s c r i t o r.

ORAÇÃO DOMINICAL

Por Marcelo de Oliveira Souza, IWA (Salvador, BA)

 

Senhor fazei-nos não temer

A tempestade, o vendaval

Na misericórdia divina

A luz ilumina

Não temendo, nenhum mal.

Sejamos conscientes

Nossa energia, individual

É também força da nossa mente,

Nosso anjo, indulgente

Acompanha-nos, até o final

Desse dia que irradia,

Vitórias e glórias,

Ajudando a todos, todas

Na missão divina da semana,

Nossa energia emana

Diante da Glória de Deus,

Deixaremos a segurança e tranquilidade do nosso lar.

Sabendo que a nossa vitória, encontramos lá,

Nessa missão Divina

Que a gente aprende e ensina,

Compartilhando a vitória,

Que acena, a todos que possam nos acompanhar!

DIA DOS NAMORADOS

 Por Marcelo de Oliveira Souza, IWA (Salvador, BA)

 

Nestes dias difíceis, atrapalhados

de extorsões, dores, endividados,

Não conseguimos os nossos caminhos sonhados.

 

Como seremos felizes em tempos tumultuados?

Só existem poucas coisas, que não somos usurpados

Sem elas estamos completamente desamparados.

 

Cairemos numa só tristeza, desesperados...

Temos que aliviar a mente de sonhos pesados,

Lembrem-se do lindo sonho por tantos almejados.

 

Um amor pra sempre e dois corpos apaixonados,

A vida é linda com casais abençoados

Por isso sou muito feliz, somos amados!

 

Agora procure sua metade, por todos os lados

Não perca tempo, não fiquem atordoados!

Tenha fé, livre-se dos caminhos complicados

E um feliz Dia dos Namorados.                                                    

 

Nestes dias difíceis, atrapalhados

de extorsões, dores, endividados,

Não conseguimos os nossos caminhos sonhados.

 

Como seremos felizes em tempos tumultuados?

Só existem poucas coisas, que não somos usurpados

Sem elas estamos completamente desamparados.

 

Cairemos numa só tristeza, desesperados...

Temos que aliviar a mente de sonhos pesados,

Lembrem-se do lindo sonho por tantos almejados.

 

Um amor pra sempre e dois corpos apaixonados,

A vida é linda com casais abençoados

Por isso sou muito feliz, somos amados!

 

Agora procure sua metade, por todos os lados

Não perca tempo, não fiquem atordoados!

Tenha fé, livre-se dos caminhos complicados

E um feliz Dia dos Namorados.

VIVENDO DENTRO DA ESTRUTURA DA BOLHA DE SABÃO

Por Clarisse Cristal (Baleário Camboriú, SC)

 

       Eu sempre pensei que o maior desafio na vida dos filhos é sobreviver aos seus pais, eu sempre tive este péssimo hábito, tentar sobreviver aos meus pais. Estas duas criaturas, às avessas, o côncavo e o convexo, a casa e rua e o dia e a noite, sim são clichês e eu não me envergonho disto.

      Vamos ao primeiro vértice, o meu jovem pai, entediado economista, indo para a meia idade e inventou de fazermos aventuras gastronômicas. Não seria um problema muito grande, já que a cidade em que vivemos é pequena e bem servida de várias vias gastronômicas. Coisas de uma cidade que é um balneário turístico e uma cidade que se resume em duas avenidas movimentadas.

        Então estamos bem servidos, do que vai de simples quiosques à beira mar, passando por barracas de cachorro-quente e indo parar em caros restaurantes com gastronomia internacional. O que seria uma diversão em família, virou um grande pesadelo.

      Mas antes vamos ao outro vértice, a minha mãe, dona de casa de profissão, já estava na meia idade, e também entediada. Ocupada com futilidades variadas, que iam de cursos de desenho, fotografias, cerâmica e por aí a fora, eram cursos que não passavam da segunda ou terceira aula. Também tem as academias, as aulas de meditação, salões de beleza e compras e mais compras. As compras da minha mãe iam de barracas no meio da rua, de vendedores ambulantes, caras lojas de decoração indo parar em bazares variados. A minha mãe nunca ia aos apinhados shoppings, a malta simplesmente era evitada.

     Voltando as aventuras gastronômicas, esse foi o ponto de discórdia entre o casal, o homem negro, sóbrio, culto, tecnocrata e racional a quem chamo de pai e a minha querida mãe, mulher branca e loura, fútil, avessa a realidade e multidões. O meu pai queria sair da cidade e se aventurar nas pequenas cidades do entorno. Restaurantes à beira da estrada, perdidos estabelecimentos em desconhecidas cidades pequenas, que ninguém não sabia sequer que existiam.

     Louco, maluco, imbecil era a minha mãe aos gritos conversando com o meu pai. Nessa hora que eu bem queria viver dentro de uma bolha de sabão, para ver tudo fora de foco, para depois me espatifar no chão porque a bolha estourou. Foi justamente na primeira aventura, a nossa digressão aventureira, rumo ao quase desconhecido. Para surpresa de zero pessoa, o meu velho tinha planejado para onde iríamos, os custos com o traslado, ida e volta e escolhido os restaurantes, sim dois restaurantes.

     Da nossa ida até a cidade ao lado, a cidade portuária, ainda bem que tenho um bom amigo, o Greg Sanders, vamos chamá-lo assim pois o meu bom amigo de curso de inglês já passa vergonha demais com o nome de batismo e mais vergonha ainda com o nome de gótico que ele mesmo escolheu. Pois bem o Greg me emprestou uma velha tecnologia, um tal de walkman, sei lá onde ele encontrou o treco, mas eu pude colocar os fones no ouvido e a tal fita K7 no aparelho antigo pra ouvir música. Não vou aqui decorrer como funciona o treco ou mesmo descrevê-lo, pois bem fones nas orelhas e The cure foi a escolha óbvia para ouvir no fatídico passeio.

      O aparelho antigo me salvou de ouvir as discussões dos meus pais, naqueles vinte minutos de viagem. Uma vez encapsulada na minha bolha de sabão nada mais importava, nem a partida, a viagem e o destino. Mas tivemos uma partida, uma trajetória e uma chegada, disso o walkman, e a fita K7 e o The cure não me salvaram e nem poderiam, pois poucas coisas me salvam dos meus pais.

     Sim, enfrentamos uma rodovia nada congestionada e chegamos rápido no que seria um atacadão, uma mistura de supermercado com atacado, um tal de atacarejo, mais um nome ridículo, na minha lista de nomes horríveis. E eu pensei no que estava me esperando naquele lugar com olores de sabão, sabão em pó e seus derivados. Evitei olhar para a minha mãe e perdi a oportunidade de vê-la feliz da vida. Uma oportunidade para ela, só vi depois no olhar e o sorriso leve daquela mulher.

        Sim, o meu velho pai nos levou para almoçar em um restaurante japonês, em um local nada convencional. E lá estava ele, o dono e gerente do espaço, o lugar com direito a leques orientais pendurados na parede, o senhor idoso que misturava peças de roupas orientais e ocidentais. Pelo sorriso do homem oriental logo vi que ele não falava o nosso idioma, um possível refugiado da terra do sol nascente. Possivelmente ele se casou com uma nipo-brasileira e vi na minha mente uma longa prole de nipo-filhos e filhas brazucas.

      Mas tudo que começa ruim, tem uma grande possibilidade de terminar em desastre. E assim foi, um bandejão, um self-service, e em um misto de cultura japonesa com a cultura brasileira, para diversão da minha mãe e horror do meu pai. Explico, a minha mãe filha da elite praiana, para ela era pura diversão estar em um ambiente proletário e o meu pai filho da periferia reviu os anos ruins dos velhos tempos. Mas o meu pai, é o meu pai e deu a volta por cima e disse: — Nada é tão ruim que não posso melhorar, daqui a pouco vamos ao outro restaurante!

    Pois bem, depois de misturar feijoada com sashimi e saquê com cerveja em meio a barulho de caixas batendo no chão, um gerente raivoso ralhando com seus subordinados, crianças correndo e suas mães correndo atrás. Meu pai depois de uma dose de saquê e a minha mãe depois de uns goles de cerveja já eram outras pessoas, muitos felizes por sinal.

     Para não me alongar muito a minha digressão, que já está longa e pedante, a ida a outro restaurante japonês não muito longe do primeiro, foi uma experiência um pouco melhor. Debandando do atacarejo, percorremos poucos metros e lá estava outro restaurante japonês, confesso que o bairro proletário com seu comércio variado seduziu a minha mãe, mas isto fica para depois. Ao adentrarmos, saltou os olhos a decoração tipicamente japonesa do lugar. Dos quadros de famosas gueixas e atrizes do teatro japonês de um lado e na outra ponta na parede um enorme quadro pintado a tinta a óleo de uma gueixa samurai. 

      Notamos que o restaurante estava vazio, e demos de cara com uma adolescente, uma versão minha, ela despojada nas mãos seu telefone móvel, mais conhecido como telefone celular, ela jogada no assento de uma mesa, em uma análise fria minha, ela era a filha dos donos do restaurante. A jovem se levantou, ela um tanto contrariada, falou que o restaurante abriria dali a minutos. Decidimos ficar no deck do restaurante, para esperar o lugar servir o almoço, e assim foi, nós três mudos, calados e em silêncio tentando sobreviver a nós mesmos. Adentramos no restaurante, a dona do lugar nos atendeu com um belo sorriso e pedidos de desculpas, ela uma austera mulher negra. Assim nós, terminamos a primeira e grande aventura gastronômica pelo desconhecido regados a peixes crus e saladas de não sei o que.   

 

Clarisse Cristal, bibliotecária, poetisa e cronista em Balneário de Camboriú, Santa Catarina.      

 

 

O EQUILÍBRIO EQUIDISTANTE ENTRE NÓS DOIS

Por Samuel da Costa (Itajaí, SC)

 

Pergunte-me tudo

 

Eu não vou me esquivar de nada

 

Só não me pergunte

 

De ontem à noite

 

***

 

Pergunte-me

 

Tudo o que quiseres para mim

 

Só não me pergunte o que eu fiz

 

Ontem à noite

 

Quando eu tentei em vão

 

Esquecer-te por completo

 

***

 

Sobre o ontem à noite

 

Refugiei-me dentro de mim

 

Eu não queria te ver novamente

 

Nem ouvir a tua eufêmica voz

 

Suspensa no ar

 

Eu não queria rever a cena dantesca

 

De nós dois felizes dançando

 

À meia luz

 

No meu palácio das memórias perdidas

 

Mais uma vez

 

***

 

Ontem à noite eu fugi

 

Do nós dois

 

Eu não queria ser uma etérea imagem

 

Presa em uma moldura digital

 

Nos teus nevoentos estribilhos

 

***

 

Ontem à noite

 

Embalada por suaves

 

E sonolentos sons amenos

 

De melancólicas e lentas melodias

 

Impossíveis e improváveis

 

Aos celestes sabores dos ventos solares

 

Eu tentei fugir do nós dois

 

Texto de Samuel da Costa é poeta, cronista e funcionário público em Itajaí, Santa Catarina.

Contato: samueldeitajai@yahoo.com.br

DA NECESSIDADE DO AMOR POÉTICO

Por Clarisse da Costa (Biguaçu, SC)

 

De início escrever para mim foi mais uma necessidade do que uma paixão pela arte, eu queria me encontrar nesse mundo e entender muitas coisas dentro de mim, e no meu entorno, principalmente o preconceito. Depois isso veio na minha vida como uma paixão avassaladora. Eu quis tanto para mim que se tornou um amor imensurável. Mas claro, nesse meio literário nada acontece sem uma razão ou motivo, sempre tem algo por trás de tudo isso. No meu caso eu li um livro chamado Saudades da Vila e me identifiquei com a história que queria ter sido a autora desta obra, foi então que a necessidade de escrever veio e junto aquela paixão que se transformou.

A minha veia poética traz o lado humano e toda a verdade da realidade em que vivemos, os caminhos e descaminhos da vida. Entrar no interior humano e trazer para o mundo externo é uma explosão de sensações que me faz pensar e que traz uma reflexão aos meus leitores. Mas antes de eu caminhar por esses caminhos, trilhei rabiscos em cadernos baratos comprados em supermercados. As paixonites, os tropeços, os sonhos, as desilusões, os romances, enfim, uma riqueza literária de quem ousou sonhar alto aos 15 anos de idade na década de 90.

Eu posso dizer que ainda vou caminhar muito mais nesse universo, levei tempo para chegar e não pretendo sair. Quando se chega em um lugar bom a tendência é querer ficar. Encontrei no mundo literário forças para continuar vivendo e lutar por muitas coisas. Esse mundo às vezes é cruel e ter uma mulher num lugar que antes era somente ocupado por homens é lindo! Eu chego para mostrar que nós mulheres podemos tudo.

Às vezes me surpreendo comigo, com cada coisa que escrevo. Eu chego a viajar para outros mundos e o incrível disso tudo é que os assuntos não acabam. O tema principal é o amor, já tentei parar de escrever sobre, mas é algo penitente. O irônico é que nunca tive um amor correspondido, chego à brincar ao dizer que Santo Antônio deve estar furioso comigo, mas isso é uma conversa para um outro conto, vou deixar o suspense no ar. Por ora o que posso dizer é que eu sou Clarisse da Costa, escritora catarinense, escrever é a minha vida, a conexão com a minha alma.

 

Texto de Clarisse da Costa é cronista e poetisa em Biguaçu, Santa Catarina.

 Contato: clarissedacosta81@gmail.com

 

 

CLARISSE CRISTAL NA REALIDADE LIQUEFEITA

Por Samuel da Costa (Itajaí, SC)

Os outros são um detalhe alheio,

A nós mesmos,

As nossas próprias existências liquefeitas...

 

Parada diante do estúdio de tatuagens, Clarisse Cristal tomou fôlego por segundos, e por fim decidiu entrar no recinto. Medos, dúvidas e muitos receios agora eram coisas de um passado remoto, que se desvanecia no ar, com o clarão da luz do dia. O eviterno temor de sentir as dores e as subsequentes marcas indeléveis no corpo e na alma, já não existiam mais.

— Tu vais ficar aí? Parada por muito tempo guria? Espantando a minha querida e fiel clientela! — A voz fluiu melodiosa pelo ar, apesar do tom grave, das palavras proferidas, que saíram do interior do estúdio, atingiram em cheio a bibliotecária.

Clarisse Cristal, adentrou e sentiu uma estranha sensação de nostalgia, a percorrer-lhe o corpo por inteiro, ao ser tragada pela escuridão da antessala do estúdio de tatuagens. Ela esqueceu totalmente do celular, de último modelo, que a mãe lhe deu de presente no último aniversário, há um tempo, não muito distante. O aparelho moderno, jazia eternamente em mil nano-pedaços, no meio de uma rua movimentada qualquer. A culpa, de fato, não foi da jovem bibliotecária, pois o aparelho vibrou e depois tocou alto, tocou alto e depois mais alto ainda, assim que ela saiu da livraria e editora, em que trabalhava. Clarisse Cristal, logo imaginou a cena toda se desenrolando, Anna Victória ligando, em prantos para mamãezinha querida dela, em seguida uma conversa breve, chorosa, ríspida e bem rápida. E esta última ligando para a mãe de Clarisse, que liga furiosa para a filhotinha rebelde e malcriada. A moça então põe fim ao melodrama bufo, espatifando o moderno aparelho no meio da rua apoplética, com muita força, sem sequer atendê-lo. O círculo tragicômico por fim estava mais que quebrado, quando o aparelho encontrou o seu destino final.

O estúdio de tatuagens era amplo e moderno, com vários espaços, separados por biombos decorativos orientais, eram diversos estúdios menores dentro de um grande estúdio. Clarisse Cristal logo percebeu ao fundo, no ambiente maior, uma grande lousa digital na lateral esquerda do amplo estúdio, vários cavaletes, de muitos tamanhos espalhados aqui e ali. Bancadas de vidro temperado, dispondo de notebooks de última geração, pen-drives variados, cartões de memória, tabletes todos de vários modelos e tamanhos, máquinas fotográficas digitais e analógicas de vários preços, modelos e marcas. Vários estojos de lápis aquarelável supracolor, muitas latas de sprays de tintas, também de várias cores, tamanhos, marcas e preços. Por fim vários quadros inacabados, em vários movimentos artísticos e de escolas de belas artes de várias épocas mundo afora. Era uma bagunça muito bem-organizada, ali funcionava uma estranha mistura de escola de belas artes com estúdio de tatuagens, deduziu Clarisse.

— Então! O que te traz, ao meu humilde comércio? — Foi a dona do lugar surgindo do nada, ela fez a pergunta de maneira afável, como se fosse uma bem treinada vendedora de loja varejo de um distante bairro popular.

Clarisse deu uma boa olhada na moça, já tinha visto pessoas assim em revistas, filmes, reportagens na TV, em livros ou mesmo vagando perdidamente pelas ruas. A pessoa era uma figura andrógina e estava afrontosamente de pé bem diante dela. Alta, pele amendoada, com os olhos castanhos brilhantes. Longos cabelos lisos e negros reluzentes, usava uma camisa física preta sem estampa. Esmalte cintilante negro despontavam nas unhas curtas e bem-feitas, exclusivas calça larga e tênis personalizado de esqueitista profissional e na casa dos vinte anos de idade. Mas, a voz melodiosa e cheia de vida, a pele sedosa e o sorriso delicado denunciavam que era uma mulher em definitivo.

— Quero fazer uns riscos e furar as minhas orelhas também, minha querida e mais nada! Um tanto óbvio! Tu aceitas cartão? — Clarisse riu sozinha, com a própria tentativa patética de ser engraçada e espontânea. — O que são os outros? Nada mais um mero detalhe, alheio a nós mesmos, as nossas existências liquefeitas! — Clarisse Cristal, leu com um tom de voz alta e de forma imponente, a frase que estava pintada na parede do lado direito, cada palavra estava escrita com cores diferente e com fontes manuscritas diferentes. — Coisa de marqueteiro medíocre, metido a poeta frustrado é o que me parece! Qual é o teu nome afinal de contas?

— Podes me chamar de Cris...

— Já sei, sua humilde criada, pronta para lhe servir!

— Mais ou menos isto, começa a falar logo menina, seja mais específica. O que queres de facto? O que tu pensas em fazer, neste corpinho lindo de fada alquebrada que Deus te deu?

— Quero fazer uma tatuagem tribal de dragão, no meu braço direito e por um piercing na orelha e outro no umbigo!

Cris deu uma risada teatral e longa, Clarisse também seguiu a tatuadora. E foi assim por quase um minuto. Cris foi até a porta da loja e colocou o aviso de fechado, foi até um telefone, instalado no balcão de atendimento e foi fazer uma chamada rápida. Cris desligou o telefone celular e o tablet, virou para Clarisse Cristal e apontou para um amplo biombo bambu, era o ateliê particular da tatuadora. Clarisse sorriu, estava encantada com o fato de ter enfim um momento só seu, um momento recoberto de mistério e caótico, bem longe da segurança rotineira da torre de marfim.

 

Samuel da Costa é contista e funcionário público em Itajaí, Santa Catarina.

Contato: samueldeitajai@yahoo.com.br

SOBRE O LIVRO "NAGÔ DAS NEGRAS"

Por Clarisse da Costa (Biguaçu, SC)

 

Não foi nada fácil escrever este livro, encarar o silêncio de muitas mulheres sofridas, fazer com que elas me contassem suas histórias e que tivessem confiança em mim. O livro vem para dar voz a tantas mulheres negras. Ele passa pelo período escravocrata e vai até os dias atuais.

Escrevendo este livro eu pude perceber várias particularidades que todas nós mulheres negras temos, o preconceito por causa do cabelo, o preconceito por causa da cor da pele, a difícil aceitação por nós mesmas e a nossa família, a alta afirmação diante da sociedade, o salário bem abaixo do homem, a aceitação do corpo e difícil luta contra a sociedade machista.

A nossa história passa pela relação do ser criança, do ser filha, do ser mulher, do ser mãe. Depois a nossa relação com o mercado de trabalho.

Mas por que o título Nagô das Negras?

Primeiro que a palavra Nagô tem o sentido de caminho e toda essa ideia de caminho traz a percepção do quanto a mulher negra andou e tanto tempo que ela levou para chegar até aqui conquistando espaços.

Com tudo isso a mulher negra passa pelo processo da aceitação e depois pelo processo de como lidar com o racismo, seja racial ou estrutural.

 

Clarisse da Costa é cronista e poetisa em Biguaçu, Santa Catarina.

Contato: clarissedacosta81@gmail.com

 

 

TALVEZ/MAYBE

 Por Fabiane Braga Lima (SP) e

Clarisse Cristal (SC)

 

 

Poetisa irrequieta e adorada

Talvez deveríamos trocar correspondências

Não as de hoje em dia

Inodoras, insípidas

E lacônicas

E sim as velhas correspondências

Lânguidas e lentas

Compostas à meia luz

De candeeiros e lamparinas

Ou mesmo ditadas pelo matraquear

Da mecanografia

Ou molhada no pico da pena

E finalizada no mata-borrão

***

Talvez deveríamos trocar

Correspondências

Não as de hoje em dia

Pois seriam mesmo velhas

Então, vamos simplificar

Este texto

Que tal!?

Palavras onde ninguém

Mais ninguém

Precisasse consultar o dicionário

***

Sim concordo

Mas sou apegada

Em belas-letras mortas

Ao som inaudível

De noturnas sinfonias lânguida e lenta

Arrastada

Sim, vamos trocar impressões

Em paraísos artificiais

Na distância mais que segura

***

Ditadas com amor

Ou desamores

Como gênios da literatura

Onde o clássico nunca morre

Que tal!?

O movimento simbolista

E esquecer o nosso falso

Surreal

***

Doravante sejamos

Nós duas mulheres livres

Doravante ousamos brilhar

O brilho fúlgido dos astros mortos

***

Sim, seria o certo

Não o duvidoso

Mas o natural...!

 

 

Texto de Fabiane Braga Lime, poetisa e contista em Rio claro, São Paulo.

Contato: samueldeitajai@yahoo.com.br

Texto de Clarisse Cristal, poetisa e bibliotecária em Balneário Camboriú, Santa Catarina.

QUE SEJAMOS LUZ!

Por Clarisse da Costa (Biguaçu, SC)

 

Às vezes precisamos romper

Algumas coisas nessa vida,

Talvez fechar alguns ciclos

Que não nos fazem bem.

Andar em direção ao vento

E dançar como se não houvesse amanhã.

Encarar o espelho

Mesmo que o cabelo esteja despenteado

E dar gargalhadas de si.

É sempre bom começar com alegria.

Precisamos de novos começos

Para que tudo fique estável,

Mas a estabilidade é uma das coisas

Que não é perfeita nesta vida,

Mal sabemos ser estáveis.

Só espero que tenhamos

A capacidade de sermos luz

Para quebramos toda

E qualquer escuridão.

 

Clarisse da Costa é cronista e poetisa em Biguaçu, Santa Catarina.

Contato: clarissedacosta81@gmail.com