Quando
meus avós paternos faleceram, meu pai tinha oito anos. Foi nomeado Conselho de
Família, e coube à avó materna a missão de tutora.
Como
órfão indefeso, parte do modesto património, foi lapidado, não pela tutora, que
era uma santa mulher, mas por alguns membros do Conselho de Família, que
aproveitaram sua ingenuidade.
Mas
isso, são, como se usa dizer, águas passadas.
Do
pequeno património que meu pai recebeu, havia velha casa de alforge, do século
XlX, de ar sisudo e solene, cujas largas e grossas tábuas do soalho,
encontravam-se luradas de caruncho, e com fundos sulcos de esfregas, a carqueja
e piaçaba.
Após
o casamento, estabelecida a vida, meu pai iniciou o embelezamento do velhíssimo
prédio.
O
dinheiro era escasso; não permitia obras profundas.
Os
gastos soalhos, foram cobertos a viochene, e receberam generosa camada de cera.
Nas partes degradadas, pequenos tapetes taparam as mazelas.
As
paredes de estuque, enegrecido pelo fumo de candeeiros a petróleo, foram
forradas a papel. As salas nobres, a tons escuros; os quartos, a cores alegres.
As
grosseiras portas de castanho, levaram esmalte branco, que tapou indesejadas
imperfeições; e as inestéticas almofadas, das mesmas, substituídas por
vidraças, alegradas a papel vitral.
Os
velhos móveis foram cuidadosamente encerados e colocados harmoniosamente. As
paredes guarnecidas de aguarelas e óleos, quase todos da sua autoria, já que
cursara Belas-Artes. Completava a decoração, pratos de faiança e estatuetas
oferecidas por artistas, que meu pai, como jornalista, ajudou a divulgar-lhes a
obra.
Terminado
o modesto arranjo, passou de simples trabalhador a abastado proprietário.
Os
que o visitavam, gabavam-lhe a bela casa e saiam convencidíssimos que recebera
herança ou lhe saíra a lotaria.
Até
familiares, que conheciam seus proventos, estranhavam tanto “luxo”, e
murmuravam, ente si, que estava rico, para ter casa assim.
Engraçado,
se tem graça, é que empresários de sucesso e gestores abastados, comparando
suas moradias, despidas de carpetes, de paredes nuas e móveis maltratados,
invejavam-lhe o gosto; interrogando-se de onde provinha tais rendimentos.
Daqui
se conclui, que ter bom gosto e lar cuidado, para muitos, é sinónimo de
abundância e dinheiro.
Esse
conceito, tão entranhado está, mormente em quem nunca viveu em ambientes de bom
gosto, que torna-se difícil mudarem de opinião.
Para
eles, casa cuidada é sinónimo de riqueza.
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