Nos últimos anos do século
passado, escrevi contareco, que alguns leitores consideraram verídico, porque
localizei-o em Vila Nova de Gaia, mais precisamente no Mosteiro da serra do
Pilar.
Como o considero de proveito
espiritual, vou reconta-lo, revestido de outros trajos:
Residia no ano da graça de
1676, no Mosteiro de Santo Agostinho da Serra, frade, que passava o dia em
santa contemplação.
O Prior, Dom Jerónimo, bem lhe
recomendava que fosse até à cerca ou deambulasse pela quinta, mas o pobre monge
mais parecia emparedada de S. Nicolau, do que filho de santo Agostinho.
Acertou de vir o imaginário
Domingos da Costa armar o retábulo da igreja, que fora traça de Felipe Tércio,
e o prior achou por bem, que a tarefa quotidiana de levar a refeição ao
artista, fosse do cenobita.
Constrangido, por obediência,
aceitou.
Andava o frade no passeio que o
incumbiram, quando topa em pequeno arbusto, alegre chilreada de passarinho, que
fabricava aconchegante ninho.
Observou o frade que o local
era de fácil acesso a felinos, e tentou brandamente assustá-lo; mas renitente,
o pardalito, não compreendeu a boa intenção do monge.
Na manhã seguinte, indo
examinar os preparos do altar, ao perpassar pelo ninho, verificou, com
angústia, que o passarinho tinha sido cruelmente morto.
Havia acontecido a tragédia que
tanto receara.
Ao recolher-se em oração,
meditando na funesta tragédia que presenciara, reflectiu que, por vezes, por
piedade, causamos graves prejuízos aos que amamos.
Deus, em certas ocasiões,
castiga-nos drasticamente, todavia a razão de tanta severidade é para nosso
bem.
Se o frade tivesse destruído o
ninho violentamente, o pardalito teria fugido e iria construí-lo em local mais
seguro.
É que Deus, como bem diz o
povo: escreve direito por linhas tortas…
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