Por Humberto Pinho da Silva (Vila Nova de Gaia, Portugal)
Nos anos sessenta apareceu por
nossa casa, universitária francesa, que viera ao Porto ao abrigo de programa de
intercâmbio de estudantes.
Era jovem de pouco mais de
dezoito anos, moderna, desempoeirada, que tinha atitudes e costumes a que não
estávamos habituados.
Um deles era beijar os homens.
Prima de meu pai, que a recebeu em sua casa, incomodava-se com esse “feio”
hábito de beijocar os rapazes da família.
Com severidade a repreendia e
terminava dizendo-lhe:
- “ Parece mal! …”
- “ Parece mal?! … Porquê?! Que
mal há em beijar um homem?! …”
E como avisasse que em Portugal
não era costume, principalmente rapazes que não fossem de família, a francesa
reclamava desolada:
- “ Na minha terra todos se
beijam e ninguém leva a mal! …”
Hoje as moças beijam jovens da
sua idade ou mais velhos. É normal – beijam colegas de trabalho, de escola,
namorados…e ninguém repara.
Mas nessa recuada época, em
Portugal, não era costume, e o que não era costume, para minha boa prima,
parecia mal.
Conheço senhora que durante anos
recusou usar meias elásticas, porque parecia mal.
Outra, já idosa, que apesar de
saber que sapatos de tacão alto são perigosos para sua saúde, não deixa de os
trazer, porque o raso não faz toalhete…
Homem que tinha vertigens, a
ponto de recear andar sozinho na rua, não usava bengala, porque era coisa de
velhos…
Desde que a consciência não acuse
nem se ofenda ou se escandalize o semelhante, acho que cada um deve usar o que
goste ou precisa, indiferente à moda ou ao “parece mal”.
A moda e o “parece mal”, na maioria
das vezes, são convenções, que se alteram consoante o tempo e o lugar.
Dizia D. Francisco Manuel de
Melo, que tinha na sua livraria um livro de Alonso Carraça, criticando as
guedelhas, e outro de Pedro Mexia, que censurava os homens tosquiados, e conclui
– a razão é o uso; e termina: “São coisas que não sendo más nem boas, o uso as
faz boas ou não.”
Ande cada um conforme precisa e
haja do jeito que mais lhe agrade, indiferente à critica ou ao “parece mal”.
Minha querida prima toda se
arrepelava pelo facto da francesa beijar os homens, coisa que hoje todos fazem
e ninguém vê nisso malícia ou ousadia.
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